Lá vêm os contragostos (publicado originalmente em 14/12/2005)

Basta chegar o fim do ano e eles começam a invadir os cinemas. Eles, os filmes infantis de baixíssima qualidade e reconhecimento. Algumas colunas atrás escrevi neste espaço sobre minha não aceitação às fitas para menores de dez anos. E hoje retomo minha opinião. Tudo por uma simples e banal razão: as tramas não têm atores “carnais”, apenas traços que são responsáveis por transmitir emoção aos espectadores. Então, quando chega essa época de Natal, esses longas vêm com tudo. Ocupam mais de 99% dos cinemas do país e nós, ansiosos por assistir a algo que tenha um lugar na cabeça, somos obrigados a ver insetos que choram, peixes que resmungam e paredes que andam. Além disso, há outra erva daninha em todos os fins de ano: as fitas da Xuxa e de Renato Aragão. Ano passado, fomos brindados com mais duas pérolas: Eliana, a apresentadora da Record, e Sandy & Júnior. Montaram péssimas histórias, como era de se esperar, e foram premiados com o público beirando o raso.

Ao mesmo tempo temos “Jardineiro Fiel” (2005) em cartaz (atualmente, nem sei mais se está) e sendo infinitamente galardoados, temos sentado nos bancos de espera mais desenhos e chamadas “fitas B”, os quais chegarão brevemente. “O Galinho Chicken Little” (2005) já está entre nós, ciscando para lá e para cá. O quarto filme da série “Harry Potter” também invadiu as telonas, sem graça nenhuma. “Doze é Demais 2”, que estréia depois de amanhã com o insuportável Steven Martin, é mais um na lista de dispensáveis. Xuxa e Aragão, que citei a pouco, prometem as novas aventuras a nós, pobres adoradores de cinema com expectativas de sinceridade, digamos assim. “As Crônicas de Nárnia: o Leão, a Feiticeira e o Guarda Roupa”, que abrirá cortinas na sexta-feira, pode até empolgar, mas nada que se diferencie do mini mago Potter. Aliás, os roteiros são bem parecidos. Na entrevista que fiz com o crítico de cinema Rubens Ewald Filho, ele próprio citava as tecnologias como nocivas à sétima arte.

Lembro que dos meus cinco aos dez anos assistia aos filmes dos Trapalhões. Vi dezenas. Mas Aragão, o Didi, era o menos engraçado. Sempre. Mauro Gonçalves, o Zacarias, dominava a trama de forma inquestionável. Antônio Carlos, o Mussum, era outro cuja simpatia e veia cômica saltavam aos olhos quando entrava em cena, estando sóbrio ou não. Mas a dupla morreu, Dedé (Manfried Santana) se separou de Didi e tudo caiu num imenso abismo de inteligência. Nesse tempo de Natal, assim sendo, agüentaremos as tais “novas aventuras” dele e dela a contragosto, parafraseando o livro de Marcelo Mirisola “Joana a Contragosto”. Porém, engolir isso não é fácil. Faz um bom tempo que não vejo as fitas de Aragão e Xuxa. Bom tempo mesmo. Recuso-me a entrar na sala de cinema e colocar imediatamente um chapéu de pateta. Nas comédias de Eliana – “Eliana e o Segredo dos Golfinhos” e Sandy & Júnior – “Acquária” (que eu tive o desprazer de ver quando ainda nutria esperanças que se foram pelo ralo da mediocridade) isso ocorreu. Vesti o capuz de pateta no caso da dupla musical.

Enfim, levando-se em consideração certas tendências, o fim de 2005 tende a ser igualzinho aos dos anos anteriores. Promoções natalinas, várias crianças jogando pipoca umas nas outras nas salas de cinema, barulhos provenientes dos filmes estupidamente para os menores de dez anos... Tudo isso, claro, devido às férias escolares. Para traduzir mais claramente, é muita coisa ruim que aterrisa no Brasil e fora dele nos meses de dezembro e janeiro. Inclui as películas nacionais na história porque são as que mais temos acesso. São as comédias horrorosas que o público em geral mais conhece. E esqueci de mencionar “Coisas de Mulher” (2005), produzido pelo SBT e protagonizado por Adriane Galisteu. É demais! Não sou Karl Marx, mas desejo fazer um manifesto contra esses filmes. Ver comédia é bom, mas o bom senso tem limite. Então, o público cinéfilo do mundo, uni-vos! Estou e ficarei do lado de vocês para que não se aceite mais nada a contragosto. E tampouco goela abaixo. Por isso, preparem-se: lá vêm eles...

Rodrigo Romero
Enviado por Rodrigo Romero em 17/07/2009
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