Caso real (publicado originalmente em 7/12/2005)

Por abordar um caso real, “O Exorcismo de Emily Rose”, que estreou sexta-feira passada no Brasil, tem, de lambuja, seus pontos de vantagem. Trata-se da tragédia ocorrida com a jovem Annelise Michel em 1976, na Alemanha. Ela morreu durante uma sessão de exorcismo e o padre teve de responder processo na justiça. O diretor Scott Derrickson aproveitou a deixa e montou uma fita que poderia concorrer ao prêmio “filme com feições gritantes”, se esse troféu existisse. Com Jennifer Carpenter no papel principal, o longa se desenrola a partir do depoimento de gente que conheceu Emily, a adolescente de 19 anos, católica fervorosa, que ganhou bolsa para estudar numa importante universidade norte-americana. Em um de seus primeiros fins de semana como estudante, ela sente coisas estranhas, quase morre sufocada. A partir daí, tem visões macabras, atitudes estranhas. Após duvidar do que a incomodava, Emily tem a certeza: sabe quem está em seu corpo: o ‘coisa ruim’.

Neste momento entra em cena o padre Richard Moore (Tom Wilkinson, de “Entre Quatro Paredes” – 2001). Emily revela a ele seus temores e pede ao pároco um ritual de exorcismo. Com a aceitação dele, começa o sofrimento. É aí, óbvio, que o drama ganha vivacidade e emoção. As seqüências com Carpenter impressionam pela realidade em alto nível. Erin Bruner (a indefectível Laura Linney, de “O Show de Truman” – 1998), advogada agnóstica contratada para defender o padre, dá o contraponto às crenças de Moore. Ao duvidar de tudo, ela instiga não só o senhor de batina como os espectadores. Quando começam a surgir coincidências entre a vida de Erin e a de Emily, é a moça das leis quem teme pelo pior. “Forças más estão querendo você”, repete o padre à defensora. Ela reluta. Acha um relicário com suas iniciais. Algo esquisito no ar. Enquanto isso, Emily se retorce no chão (a atriz é praticante de ioga e usou técnicas disso), come insetos e berra.

Em “O Exorcismo de Emily Rose”, a corda do filme, ou seja, o julgamento de Richard Moore, fica em segundo plano. Nos raros momentos em que a jovem estudante aparece, nos faz sofrer. A família não sabe mais o que fazer. A irmã fica depressiva em ver sua companheira no estado em que está. Ao redor, não há esperanças. No ponto alto do longa, o padre lê a carta de Emily, escrita horas antes de se deixar levar pelas forças malignas (existem seis demônios em seu corpo). Qual será a história que Moore quer tanto contar no tribunal? E o veredicto do júri? O pároco deve ser condenado? Em meio a essas perguntas, Wilkinson desfia sua capacidade de levar lágrimas aos olhos alheios. Vemos ali, sentado naquela cela, de uniforme de presidiário, a pessoa que transformou a vida de uma menina. Emily depositou toda sua confiança na crença que tinha e levou a pior. Ou levou a melhor? Vai saber... E se acontecesse com alguém da sua família? O que você faria?

Assisti ao filme na sexta-feira mesmo. Saí da sala com a sensação de que ninguém em sã consciência está livre. Tudo pode acontecer, com qualquer um. Parte dessa minha sensação pode ser creditada a Jennifer Carpenter e seu rosto comprido, que compõem a linha de horror da fita. Aos 26 anos, havia atuado apenas em filmes menos conhecidos – quatro no total, entre 2003 e 2005. Foi indicada para ser protagonista por Laura, que trabalhara com ela numa peça de teatro. A segunda parte desse terror sentido às vísceras está numa característica semelhante a “O Bebê de Rosemary” (1968): ‘esconder’ o vilão maior – no caso de ambos os roteiros, o demônio. Todo mundo morre de medo por um ser que não surge na telona, não tem falas e não recebe cachê. Ainda tem referencias escancaradas a “O Exorcista” (1973). E, como afirmei no início, por fim, o tal do “baseado em fatos reais”. Isso ocorreu realmente! Até os tantos mais incrédulos ficam boquiabertos. O pavor estampado nos rostos dos personagens se reflete nos nossos.

Rodrigo Romero
Enviado por Rodrigo Romero em 17/07/2009
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