Comparação (publicado originalmente em 29/6/2005)

Não gostei de “Batman Begins” (2005). Aliás, fui para o cinema com pressuposto de que não o apreciaria. E, de fato, minha expectativa estava certa. O filme trata o Homem-Morcego como se ele fosse um semideus, ou um Cristo virado do avesso. Na verdade, o autêntico herói mascarado não chega a isso. É meramente um órfão de pai e mãe que, inconformado com o assassinato deles (o qual assistiu), mexe seus palitinhos para virar um combatente do crime e da corrupção. Claro, se fosse assim, todos nós seríamos Batman, pois a violência anda solta por aí, deslavadamente. Mas a diferença primordial de Bruce Wayne em relação a nós, povo em geral, é a conta bancária, ou os muitos zeros à direita de qualquer número. Christopher Nolan, diretor da fita deste ano, quis algo mais. E recontou a trajetória de Wayne desde a infância, já com o mordomo Alfred a seu lado. E, tal como Tim Burton (comandante do longa-metragem de 1989, com Michael Keaton, Jack Palance,

Jack Nicholson e Kim Basinger no elenco), Nolan criou além dos quadrinhos. Inventou a mocinha, supostamente amiga de Bruce desde os seis anos, e jogou o milionário na cadeia por uns tempos. O tempo passa e ele se revolta ainda mais.

Para mim, comparar o Batman de 2005 com o de 16 anos atrás é covardia. Burton teve muito mais ousadia e atrevimento que o colega Christopher. Bancou Jack Nicholson como Coringa (o ator relutou a topar, e só aceitou após garantir boa porcentagem nos lucros da bilheteria) e fez de Keaton um Batman mais “humano” e menos “mágico”, como é Christian Bale que some e aparece como um truque de David Copperfield, num piscar de olhos. Outro aspecto a analisar, além do protagonista, é o par do personagem-título. Este ano, a encarregada disto é Katie Holmes, ex-participante do seriado “Dawson’s Creek” (1998-1999). Ela reviu sua fama recentemente ao começar o namoro com Tom Cruise (de “A Guerra dos Mundos”, que tem tudo para ser o filme do ano, a ver aqui, nas próximas colunas). A julgar pela rosto angelical, a atriz aparenta ter, no máximo, 18 anos (contra os 26 da vida real). Pouco perto de Kim Basinger, à época das filmagens com 35 anos, parafraseando Mário Lago, “mulher de verdade”, que fazia-se impor frente ao papel principal de Michael. E, no quesito “beleza”, sem comentários: 10 a 0 para Basinger, de “9 ½ Semanas de Amor” (1986). Ela deu à película ares de decoração afirmativa. Séria e sensual.

O Batman de Christopher Nolan é menos herói e mais carniceiro, justiceiro. Amedronta, ao invés de demonstrar segurança. Sabe-se que o Homem Morcego, desde que foi criado por Bob Kane em 1939, é um ser enigmático: triste, infeliz, sádico, desolador, mau caráter, impopular. São seus arquiinimigos, como geralmente ocorre nas HQs, chamarizes para os principais pontos dos roteiros. O espectador prefere, por exemplo, o Coringa de Nicholson, ou o Batman de Bale? A resposta salta a vista. Ou então: o Pingüim de Burgess Meredith, da década de 1960, ou o Espantalho feito pelo cru Cillian Murphy? Não se discute aqui a potência profissional dos filmes deste ano e de 1989. Mas não se pode deixar de admitir que o de Burton é melhor que de Nolan. Às claras, as duas últimas fitas que antecederam o roteiro de 2005 (“Batman III”, de 1995, e “Batman IV”, de 1997) são piores. E ainda li em alguns lugares sobre a escalação de Bale para interpretar o paladino mascarado: ele só podia ser comparado a Val Kilmer no filme de dez anos atrás. Lego e grande engano. Michael Keaton, junto com Adam West (do seriado de 1966 e 1967) são os eternos Batmans. Ambos ficarão marcados para sempre como o defensor dos oprimidos de Gotham City.

Em meus delírios, devia haver lei na qual os personagens já interpretados uma vez só voltariam às telas no mínimo 50 anos depois. Senão, como acontece atualmente, não se sabe quem é o Batman “verdadeiro”: Keaton, Kilmer, West, Bale ou George Clooney (de 1997). E, falando em personagens, discorreremos sobre o Coringa. Cesar Romero deu vida a ele no programa dos anos 1960, quando o mote principal era o humor. Jack Nicholson o reviveu mais de três décadas depois, e não foi indicado ao Oscar por puro preconceito da Academia. E pensar que neste momento a produtora discute quem poderá reinterpretá-lo... Romero e Nicholson caíram como luvas para os papéis. É o mesmo com o Superman. Quem, em sua vã consciência, imagina outro Homem de Aço senão Christopher Reeve? Pois é. O “Superman Returns” tem estréia prevista para junho de 2006, com Brandon Routh fazendo Clark Kent / Super-Homem e Kevin Spacey como Lex Luthor. Spacey, aquele mesmo de “Beleza Americana” (1999). Tudo arruinado para o herói da capa vermelha. Outro longa que irei ao cinema com má vontade. Estão desvalorizando esses personagens, os mais queridos, principalmente, entre as crianças. De ponta-cabeça está o morcego. E o filme mais recente dele também.

Rodrigo Romero
Enviado por Rodrigo Romero em 03/07/2009
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