Espetáculo (publicado originalmente em 1º/6/2005)

Prossigo meus relatos e testemunhos sobre musicais. Não me canso de vê-los, revê-los, outra vez assisti-los. E, de todos eles, “Mary Poppins” (1964) é, em mim, o causador, parafraseando o rei Roberto Carlos, de “muitas emoções”. Feito pelos estúdios Walt Disney, é entretenimento para todas as idades, cobrindo espaços de seis a 100 anos. Todos ficam muito encantados. Julie Andrews estava praticamente crua para o papel. Aos 28 anos, havia trabalhado apenas em um programa de TV e com dublagens. Nunca no cinema. Mas Disney vira Julie numa peça teatral – “Camelot” – em 1963. Sua paixão foi arrebatadora por ela. Porém, um entrave impedia a atriz de filmar: ela estava grávida. Sem problemas. Walt a esperou, pacientemente. E, depois da criança nascida, as filmagens começaram. Andrews arrancou talento dos deuses da sétima arte. Nos números musicais coreografados, ao lado do ator Dick van Dycke, fez transbordar carisma, simpatia e beleza. Suavidade bem diferente do que foi a negociação entre Walt Disney e Pamela Lyndon Travers, escritora australiana autora do livro “Mary Poppins”. Ela resistiu, durante três décadas (dos anos 1930 aos 1960), em vender os direitos para adaptação cinematográfica.

Nova armação do destino. Se Travers tivesse cedido em 1940, por exemplo, não teríamos Julie Andrews como protagonista. Às vezes, vejam só, aguardar como Jó vale a pena. E parece que apenas faltava isso para Disney ir embora. Pouco mais de dois anos após a estréia mundial da fita – a 27 de agosto de 1964 – o criador do parque de diversões mais famoso do planeta morreu (15 de dezembro de 1966). Além de driblar o mau humor de Pamela, a produção, assim como o elenco, se resguardava diante da opinião do público e crítica. Os ingredientes saltavam aos olhos: raras vezes atores tinham contracenado com desenhos animados, a atriz principal era novata em películas, o figurinista também carregava nada de experiência (Tony Walton, então marido de Andrews). Tudo isso, a confirmação foi nula. O estrondoso sucesso correu os cinco continentes. As canções dos irmãos Robert e Richard Sherman ficaram coladas na memória dos espectadores. Cantarolamos “Colher de Açúcar”, “Chim Chamine”, “Dois Centavos” e, principalmente, a inacreditável “Supercalifragilisticexpialidocius”, quilométrica palavra inventada pelos Sherman para animar uma música. História espetacular e cheia de alegria e entusiasmo no tom preciso.

No roteiro, casal de irmãos travessos (Jane e Michael) espantam suas babás empregadas pois querem uma vida com muitas brincadeiras e diversões. E eis que o desejo deles é atendido quando Mary Poppins surge do céu com seu inseparável guarda-chuva e a valise com bastante truque. A nova governanta faz Jane e Michael entrar num mundo particular, de fantasia, onde tudo é permitido. Assim, eles competem em acirrada corrida de cavalos de carrossel, tomam chá no teto de um tio risonho, sobem numa escada de fumaça etc. George Banks, o pai, é preocupado com seu emprego no banco. A mãe, Winifred, está voltada em conseguir o voto para as mulheres (em tempo: o enredo se passa na Inglaterra de 1910). Então, Mary cuida dos pimpolhos levados. “Quase perfeita em tudo”, a babá transforma o lar antes sisudo num ambiente aconchegante e feliz. Ladeada por Bert (Dycke), amigo inseparável de Poppins, o quarteto apronta em aventuras inimagináveis. Os pequenos (interpretados por Karen Dotrice, hoje com 49 anos, e Matthew Garber, que morreu aos 21 anos de pancreatite) ficam, tal qual o público, estupefatos com mágicas de Mary Poppins e Bert, o divertido e improvisador limpador de chaminés.

O filme ganhou cinco Oscars: atriz (para Julie Andrews), montagem/edição, edição de som, música (Chim Chamine) e efeitos especiais. Concorreu também nos quesitos filme, direção (Robert Stevenson), roteiro adaptado e fotografia. Andrews, que desfilaria seu garbo no ano seguinte com “A Noviça Rebelde”, desbancou Audrey Hepburn por “Minha Querida Dama” (1964), cujo papel Julie havia sido convidada para fazer, mas não pôde devido a desistência da produção do longa-metragem. Atualmente com 69 anos, ela participa de projetos de televisão e filmes (o último foi “O Diário da Princesa II”, de 2004). Van Dycke completará oito décadas em 13 de dezembro. Esteve por muito tempo com seu próprio show televisivo. Roda, para 2006, o filme Curious George. Karen fez mais sete trabalhos depois de “Mary Poppins”, o derradeiro deles em 1978. David Tomlinson (o senhor Banks) faleceu em 2000 aos 83 anos. Glynis Johns (a senhora Banks) está com 81 anos de idade e 67 de carreira. Detalhe: Glynis, quando convidada para filmar, pensou que faria Mary. Após o engano, só aceitou entrar na dança depois de ouvir a canção “Irmã Sufragista”, feita especialmente para a política personagem dela.

Em suma: não percam “Mary Poppins”. É um superespetáculo.

Rodrigo Romero
Enviado por Rodrigo Romero em 02/07/2009
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