O Armagedon a que estamos condenados (publicado originalmente em 7/10/2004)

“Anunciaram e garantiram que o mundo ia se acabar / Por causa disso a minha gente lá de casa começou a rezar...” Esse trecho da canção “E o Mundo Não se Acabou”, de Assis Valente, já causou calafrios em milhares de pessoas. Será que de fato algum dia o planeta Terra se espatifará? Meteoros assassinos viriam para cá e destruiriam todos e tudo. Teorias conspiratórias, como a de Nostradamus, viraram de cabeça para baixo qualquer forma de pensamento deletério. O “ano 2000” chegou e nada ocorreu, como era esperado. O “Bug do milênio” não passou de piada de mau gosto, principalmente para quem lidava com computador. Desgraças à parte, deambulamos sempre em frente. Atrás destas cortinas de previsões chulas rasgadas, estão os filmes cujos temas tratam disso. O mais famoso deles, indubitavelmente, é “Armagedon” (1998). Envolvendo mistério, ameaças provocadas por um imenso objeto que cairia nos Estados Unidos e extinguiria a nossa Era, a película resultou em explosão, mas de sucesso e bilheteria no mundo, isso com pouco mais de duas horas e vinte minutos de duração.

Dirigido por Michael Bay, a fita entrelaçou atores veteranos com outros novatos. Ben Affleck, por exemplo, havia se desligado do roteiro premiado de “Gênio Indomável” (1997), que elaborou ao lado de Matt Damon, ficou com o papel de A.J. Frost, aspirante a astronauta. Namorava Liv Tyler, a Grace Stamper. Liv estreara no cinema quatro anos antes de “Armagedon” no suspense “Testemunha do Silêncio” (1994), que rodou quando passava dos 16 para os 17 anos. Por cima dessa dupla, Bruce Willis estava lá para somar. O ex-protagonista da série televisiva “A Gata e o Rato” (que este ano faz duas décadas de exibida), nascido na Alemanha, não economizou em braços para carregar tanto Tyler quando Affleck no colo profissional. Bruce interpretou Harry Stamper, pai da personagem de Liv e duro inimigo de A.J., por quem sentia ciúmes doentios por causa da filha. Porém, essas briguinhas e desentendimentos entre eles minguam quando se noticiam possíveis problemas de “fim dos tempos”. Para colaborar com a humanidade, genro e sogro embarcam na mesma nave para, assim, nos salvar.

Nostradamus, médico francês, base para este tipo de história, consagrou-se ao lançar, no século 16, publicações sobre pesquisas farmacológicas e astrológicas. Aos 52 anos, em 1555, suas profecias se alastraram, até hoje são reeditadas. Sempre se encontra quem ache nelas alusões a acontecimentos contemporâneos, vide as reportagens sensacionalistas para os atentados de 11 de setembro de 2001 e a guerra do Iraque. Há ainda aqueles estudiosos que dizem ter certeza da visão futurista do falecido escritor. Nostradamus, ressaltam alguns, teria enxergado a existência de Adolf Hitler e de Osama Bin Laden: os dois “anti-Cristos”. Mas tudo isso resulta em furos n’água catastróficos e constrangedores. Nada foi provado. “Armagedon” manuseou o medo de maneira fictícia e despertou nos espectadores torpor, sensação de que deveras nós nos reduziremos a pó quando determinado botão for apertado. E quem botará o dedo nele? Não sabemos. Hoje diríamos George W. Bush. Ontem, Sadam Russein. Se recuássemos mais um pouco, Mao Tsé-Tung, o próprio Hitler etc. Nunca se sabe o dia de amanhã.

Michael Bay deu seqüência a esses tipos de tragédias em 2001, quando fez os norte-americanos recordarem os ataques japoneses a Pearl Harbor a sete de dezembro de 1941 com o filme homônimo. Trouxe consigo novamente a atuação de Ben Affleck, agora ao lado dos experientes Alec Baldwin e Cuba Gooding Junior. As três horas da fita espelharam hecatombe surpreendente que foram expostos os Estados Unidos. Os aviões orientais fizeram governo do Tio Sam entrar na 2ª Guerra Mundial. Na película existem, claro, os relacionamentos por trás. Affleck vive um dos soldados dado como mortos durante os bombardeios. Sua namorada, a jovem enfermeira Evelyn Johnson (na pele da atriz Kate Beckinsale), então, inicia romance com outro ex-combatente, Danny Walker (o ator Josh Hartnett). Evidentemente, Rafe McCawley (Ben) está vivo e volta para reaver sua amada. Em meio a este ti-ti-ti estão cenas e sons arredondados, que ganharam Oscar na festa de 2002. Bay, de 39 anos, é também ator e fez papéis secundários tanto em “Armagedon” quanto em “Pearl Harbor”. Só esporadicamente.

E de volta ao fim do planeta, diversos cientistas prevêem aumentos bruscos de temperatura por causa da alta poluição. Efetivamente, o calor é de assustar. Infinitas geleiras descongelaram, inundam locais. Incêndios nas matas fazem morrer espécies de plantas preciosos. Como solucionar esta torta e maligna equação? O “pulmão do mundo”, a Floresta Amazônica, respira atualmente com ajuda de aparelhos. Está por um fio. Seria este o nosso Armagedon? Ou seja, estaríamos amaldiçoados com as quenturas em volta e desapareceríamos transformados em cinzas? Não sou, nem quero ser panfletário de causa nenhuma. Nem tampouco pessimista nato como Diogo Mainardi, colunista da revista Veja. Alertar: esse é o verbo correto. Se no filme de 1998 era o imenso meteoro o causador da confusão de grande massa popular, hoje essa ficção se mostra alterada. Estamos debaixo do mesmo teto e, mais do que nunca, dividimos a mesma casa. Para pormos de lado surpresas como a de Pearl Harbor temos de nos suavizar ao máximo. São de pequenas coisas que evoluímos. A parte de cada um: a obrigação.

Ao retornar à música de Valente, há este pedaço: “Acreditei nessa conversa mole / Pensei que o mundo ia se acabar / E fui tratando de me despedir / E sem demora fui tratando de aproveitar...”. E de repente, vem aquela pergunta mais que repetida: O que você faria se o mundo acabasse amanhã? A mini-novela de 35 capítulos “O Fim do Mundo”, levada ao ar pela Rede Globo em 1999, abordou tal assunto. O Armagedon aqui não seria diferente. Nas cenas finais, um sedicioso terremoto dizimou a população sem a mínima dó. O tema da atração era cantada por Paulinho Moska e comungava muito com “E o Mundo Não se Acabou”: “O que você faria / Se só te restasse esse dia? / Abria a porta do hospício / Trancava a da delegacia...” dizia o refrão. O grupo Aerosmith, detentor da trilha sonora de “Armagedon”, também se animou ao gravar o clipe de “I don’t want to miss a thing” (Eu não queria perder uma coisa”, principal entretenimento além-filme. Sons que abafam os problemas. Só sei que estamos condenados a esse Armagedon. Não sabemos o que ocorrerá, mas estamos sim condenados.

Rodrigo Romero
Enviado por Rodrigo Romero em 03/06/2009
Código do texto: T1630924
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