Mais do mesmo (publicado originalmente em 28/4/2004)

“Kill Bill - Volume I” foi o quarto longa-metragem de Quentin Tarantino. Mas, se vocês assistiram os outros três filmes dele, não se descabelem em casa para pegar um lugar na platéia porque a história é praticamente a mesma dos demais: é recheada de briga, sangue, vingança e tipos amalucados. O enredo central gira em torno da personagem da atriz Uma Thurman (também sempre escalada pelo diretor americano), considerada “Marlene Dietrich moderna” por ele. É uma espécie de caso fetichista dele para com ela. Essa veneração chegou ao ponto de Quentin fazer a Miramax Estúdios (que produziu) esperar a gravidez de Uma para iniciar as gravações. Assim, o trabalho atrasou 12 meses. Isso causou um rombo considerável nos cofres da produtora, a qual resolveu mesmo aguardar o resultado final. Viu mais do mesmo, ou seja, um filme de Quentin Tarantino.

A história é frugal ao extremo: Uma interpreta Mamba Negra, ex-integrante de um grupo de matadoras que utilizam nomes de cobras perigosas como apelidos (Mamba Negra é a mais mortal das serpentes). Após ser traída pelos demais membros dessa “seita” e perder noivo e filho (ambos mortos), ela resolve se vingar. Não poupa ninguém à sua frente. Um ponto de qualidade da fita é a habilidade com que a atriz, de 1.83 metro de altura, tem com armas brancas, principalmente com espada. Além disso, os saltos dados por ela são excelentes para uma moça de quase 34 anos e grávida até dias antes das filmagens. Não era para menos: depois da “pequena” demora ocasionada pela espera do bebê, Uma “teve” de provar aos responsáveis da Miramax que era a escolha certa para o papel e treinou sem moleza. Cerca de 50 dias após o parto, ela emagreceu praticamente 20 quilos. Um regime relâmpago e com resultado ótimo.

Thurmam ainda aprendeu japonês em curso ultra-intensivo e ensaiou golpes de artes marciais chinesas, sem falar nos dribles impressionantes com espada. A película faz referências aos faroestes italianos, uma paixão escancarada de Tarantino, filmes de lutas marciais (tem uma estrela japonesa da década de 1970 no elenco), samurais e aventuras policiais vividas por atores negros nos Estados Unidos. A pantera Lucy Liu e Daryl Hannah participam de “Kill Bill”. Ao concluírem, tanto Quentin como Harvey Weinstein (homem forte da Miramax) decidiram repartir a obra em duas seqüências, pois eles não queriam cortar cena alguma. Portanto, se ficasse em uma só atração, esta duraria mais de quatro horas. Dessa forma, “Kill Bill – Volume Dois” foi editado e entrou em cartaz na terra do tio Sam há poucos dias. A Miramax já pensa em organizar tudo para a rodagem do número três.

Esse festival de pontapés recebeu a primeira continuação no currículo do diretor. Aos 41 anos, Quentin debutou nas telonas em “Cães de Aluguel” (1992), suspense cheio de tensão que recebeu elogios e é considerado clássico “cult”. Em 1994, aí sim, veio o sucesso com “Pulp Fiction”. Especialista em resgatar profissionais jogados injustamente no ostracismo, Quentin deu a mão boa para John Travolta estourar novamente, mesmo este estando gordo e quarentão. Sempre explorando o submundo do crime, “Pulp Fiction” ganhou Palma de Ouro no Festival de Cannes, na França, e Oscar de melhor roteiro. A ascensão de Tarantino foi meteórica. A partir desse ponto, passou a idolatrar (Uma Thurmam não é única) a esculhambação de tudo e todos. É roteirista de alto garbo e tem sob sua responsabilidade “True Romance” (1993) e “Assassinos por Natureza” (1994), dirigido pelo consagrado Oliver Stone.

Seria o próprio Quentin quem estaria no comando geral dessas duas películas, mas ele não conseguiu recursos e colocou de lado. Antes de virar astro, esse escritor de dedos quentes trabalhou muito tempo em uma locadora de vídeos. Conta que adquiriu seus conhecimentos em cinema daí. E leva isso a sério. Um de seus exageros deu em quase “morte” por overdose de Uma Thurmam enquanto filmava “Pulp Fiction”, pois ele desejava cenas reais em seus longas. Claro, tudo de brincadeira. “Ele gosta de me ver sofrendo”, relatou a atriz ao canal E!. Em “Kill Bill”, devido a takes de banhos de sangue, o diretor as montou em preto em branco para não chocar demais os espectadores sensíveis. Não adianta. “A Paixão de Cristo” (2004), por exemplo, não chega aos pés deste filme nos quesitos violência e sangue. É um autêntico bolo recheado de balas, golpes, socos e vôos que recordam “Matrix” (1999).

O uniforme vestido por Uma para ilustrar a briga final contra bandidos da Yakuza (máfia japonesa) virou febre-mania nos Estados Unidos. Trata-se de calça e blusa amarelas com listras pretas nas laterais. Esse traje, porém, não é novidade. Tarantino copiou-o de Bruce Lee em “O Jogo da Morte”, de 1973. É idêntico. As responsáveis por isso foram as figurinistas Kumiko Ogawa e Catherine Marie Thomas. Nada mal para quem saiu dos balcões de uma locadora: alta quantia para filmar, belas atrizes, regalias... O suor não é deixado de lado e a garra tem o brinde das altas bilheterias. Isso movimenta o cinema. Apesar de sem exceção as histórias serem sobre assuntos iguais e conterem as características já citadas aqui, os ecrãs ficam felizes quando um nome do porte de Quentin Tarantino volta à tona com bagagens como essa. E, por mais que se comente dele, Quentin Tarantino é esforçado. Somente isso. Mais nada.

Rodrigo Romero
Enviado por Rodrigo Romero em 15/05/2009
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