Sobre a relação possivelmente complexa entre racionalidade e genialidade

1. Conflito entre ponderação e genialidade

Genialidade e racionalidade são ingredientes importantes para a construção e o avanço do conhecimento e, portanto, da ciência. No entanto, tendem a atuar de maneiras completamente opostas. A racionalidade como um guia para evitar saltos especulativos, se firmando nas hipóteses menos extraordinárias, especialmente quando se está buscando investigar sobre um tópico de interesse. Portanto, a racionalidade atua basicamente como um ímpeto que nos puxa para o realismo do que é factual, possível ou provável. E, para isso, nos incute o pensamento de não irmos muito longe de onde estamos. Já a genialidade segue uma linha de atuação bem diferente pois, como expressão máxima da criatividade e da originalidade, nos incita a especular de maneira mais solta, como uma abordagem mais ampla e arriscada, de tentativa e erro. Em resumo, a primeira nos faz mais comedidos, enquanto a outra nos faz mais ousados. Ambas, com as suas respectivas vantagens e desvantagens. Então, é possível concluir que o cientista genial é um indivíduo que consegue atingir um equilíbrio perfeito entre a ponderação ou razão e a genialidade, específico aos tópicos em que se aprofunda, já que, se ele se tornar ponderado demais, inibe sua capacidade de pensar além do bom senso estabelecido ou das hipóteses mais simples, e se ele for demasiado original em seu pensamento, aumenta o risco de perder sua capacidade de ponderá-lo, de discernir entre as hipóteses mais e menos logicamente plausíveis, especialmente as que soam interessantes em um primeiro olhar, mas deixam de fazê-lo a partir de um aprofundamento.

Então, essa lógica também se aplica a todo indivíduo humano que não está diretamente associado à prática científica. Mas ainda é importante diferenciar racionalidade, ou bom senso aplicado, de conformidade ou senso comum, se a primeira se refere à busca pela verdade objetiva e imparcial e a segunda pela adoção de crenças estabelecidas e compartilhadas por uma maioria, dos que pertencem aos grupos sociais de identificação ou associação.

2. A alta capacidade racional é um tipo heterodoxo de genialidade, praticamente uma genialidade da anti genialidade

Um indivíduo que atinge os níveis mais altos de racionalidade é um indivíduo intelectualmente excepcional, por se destacar da média típica de uma população humana, que, diga-se de passagem, pende à irracionalidade e não à razão. E, por causa dessa excepcionalidade, pode ser categorizado como um tipo genial, de excelência. Mas não um tipo necessariamente característico da genialidade, de profundidade de compreensão ou expressão e de originalidade de pensamento. Até pelo contrário, como um tipo que, em determinadas instâncias comparativas com a genialidade a nega em prol de uma excelência na percepção de fatos ou verdades e de se firmar neles, que, em teoria, é muito mais simples do que inventar, distorcer ou avançar muito profundamente sobre a compreensão da ou de uma realidade. Eu até já comentei sobre essa tendência de conflito que também parece existir entre racionalidade e inteligência, primariamente definida como capacidade de aprendizado, e analisada por testes cognitivos: de QI e desempenho acadêmico, especialmente, em que os mais inteligentes, nesse sentido, podem se sentir mais atraídos pela tentação de inventar ou distorcer fatos do que de apenas reconhecê-los e aceitá-los, ainda mais se forem fatos considerados pessoal e/ou ideologicamente inconvenientes. Por isso, a alta capacidade racional seria, ao mesmo tempo, uma excepcionalidade, por ser uma expressão rara da mente humana, mas também uma espécie de antítese relativa da genialidade, por ser um processo aparentemente mais simples, de percepção prioritária de fatos ou verdades objetivas, se o que a torna mais difícil não seria apenas uma questão de cognição ou percepção, mas também de capacidade psicológica, de autocontrole, aprendendo a evitar ou conter auto projeções durante processos de raciocínio, que tendem a priorizar expectativas e crenças pessoais sobre uma possibilidade de percepção mais imparcial.