Interpretação de Sonhos - Técnicas e Etapas
INTRODUÇÃO
Devido a extensão do tema “Interpretação de Sonhos” o conteúdo foi separado em alguns artigos. Os três anteriores trataram: o primeiro de seu significado; o segundo de sua importância e dos benefícios trazidos pela interpretação; e o terceiro sobre a abordagem junguiana à interpretação dos Sonhos Este tratará exclusivamente das técnicas e etapas da interpretação de Sonhos.
A abordagem junguiana sobre interpretação dos Sonhos, objeto de artigo anterior, basicamente pode ser caracterizada por: Se o Sonho é um produto espontâneo da Psique inconsciente, um produto psíquico como outro qualquer, então não há porque, se supor que sua natureza e finalidade sejam diferentes dos outros conteúdos da Psique. Portanto, os Sonhos devem ser tratados analiticamente como qualquer outro produto psíquico. Devem ser abordados, além do ponto de vista causal, principalmente pelo ponto de vista da finalidade, ou seja, além de porquê sonhei com isso? Para que tive esse Sonho?
Antes de desenvolver-se sobre as técnicas e etapas da interpretação de sonhos”, apesar de não ser suficiente, vamos rever alguns conceitos julgados necessários e relevantes abordados nos artigos anteriores.
CONCEITOS RELEVANTES
Psicologia e Psique
Psicologia é o estudo da Psique, que se refere a tudo o que é formado pelos fenômenos inerentes à mente humana. Sentimentos, pensamentos e percepções se desenvolvem na Psique, que permitem que o ser humano se relacione e se adapte, por meio de processos.
Divisão Básica e Estruturação da Psique
Basicamente, divide-se a Psique em: Consciente e Inconsciente.
Consciência Pessoal (Consciência) – corresponde à percepção consciente ordinária;
Inconsciente Pessoal – exclusivo de psique individual, mas não consciente;
Inconsciente Coletivo, ou Psique Objetiva – possui estrutura aparentemente universal na humanidade.
Dentro dessa divisão básica existem: Estruturas Gerais e Estruturas Especializadas.
Estruturas Gerais
Imagens Arquetípicas
É o conteúdo básico de o Inconsciente Coletivo, ou Psique Objetiva. São imagens profundas e fundamentais que se formam pela ação dos Arquétipos, sobre a experiência que vai se acumulando na Psique Individual.
São “imagens primordiais”. São peculiares à espécie e se, alguma vez, foram “criadas”, sua criação coincide, no mínimo, com o início da espécie.
Complexo
Grupamentos de imagens afins, do conteúdo do Inconsciente Individual, que se conservam juntas por um tom emocional comum. O agrupamento se dá em torno de certo tema gerador desse tom emocional. Por exemplo, se o tema for mãe, complexo materno.
Dispõe de grau relativamente alto de autonomia. Isto é, está muito pouco sujeito às disposições da consciência e, por isso, comporta-se na esfera do Consciente como um “corpus alienum” cheio de vida.
Estruturas Gerais de Identidade
Ego
Conforme se referiu Jung, é um Complexo, mas diferente dos outros complexos, porque se impõe como centro da consciência e atrai para si os demais conteúdos conscientes, visa também, mais do que outro complexo, a totalidade.
É o centro do campo do Consciente, a parte da Psique onde nossa consciência reside, o nosso sentido de identidade e existência. Seleciona e organiza nossos pensamentos, sentimentos, sentidos, e intuição, e regula o acesso à memória.
Sombra
É o arquétipo receptáculo dos aspectos que foram suprimidos no desenvolvimento da Persona, e mais que isto, parte de seu conteúdo nem chegou a passar pelo crivo do consciente.
A Sombra foi dinamicamente dissociada da identidade do Ego dominante no decorrer do desenvolvimento inicial. Daí seu possível retorno, para reclamar parcela de vida consciente.
Estruturas especializadas de Relacionamento
Persona
É a função de relacionamento com o mundo exterior. Muito importante, na medida em que dependemos dela para os relacionamentos diários com grupos sociais.
Com o desenvolvimento da consciência, o ser humano, que é gregário por natureza, necessita desenvolver algumas características básicas, para a adaptação social. O arquétipo desta adaptação é a Persona.
Sizígia
É grupamento pareado de Animus/Anima. O arquétipo da Anima, constitui o lado feminino na Psique do homem, e o arquétipo do Animus constitui o lado masculino na Psique da mulher.
O Animus e a Anima, se devidamente reconhecidos e integrados ao Ego, contribuirão para a maturidade do psiquismo.
Anima e Animus são responsáveis pelas qualidades das relações com pessoas do sexo oposto. Enquanto inconscientes, o contato com estes arquétipos é feito em forma de projeções.
Inconsciente
O Inconsciente existe “a priori”. É preexistente ao Consciente e traz muitos conteúdos herdados dos ancestrais.
Não sabemos o que é realmente o Inconsciente, mas conhecemos suas manifestações: sonhos; visões; padrões de comportamento; afetos; mitos; contos de fadas; e as consideradas doenças psíquicas.
Inconsciente Pessoal, ou individual
Vizinho ao Consciente, constituído pelos elementos da história de nossa vida pessoal: conteúdos reprimidos; percepções subliminares; conteúdos de memória desnecessários; e complexos.
Inconsciente Coletivo, ou Psique Objetiva
É a camada do Inconsciente onde todos os humanos são iguais. Diferente do Inconsciente Individual, que depende das experiências de cada indivíduo, o Coletivo é a camada mais profunda da Psique e constitui-se dos materiais que foram herdados da humanidade: padrões de vida, símbolos, imagens que fazem parte de nossa natureza psíquica – os Arquétipos.
Si-mesmo, ou Self
É o centro de toda a personalidade. Dele emana todo o potencial energético de que a Psique dispõe. É o ordenador dos processos psíquicos.
É o principal Arquétipo do Inconsciente Coletivo, o arquétipo da ordem, da organização e da unificação; atrai a si e harmoniza os demais arquétipos. Confere à personalidade um sentido de unidade.
Individuação
É a busca da unicidade. É a Psique indo ao encontro de seu centro. É a volta do Ego as suas origens.
No Inconsciente existe espécie de instinto profundo de totalidade, de personalidade única em nós; instinto que atua sobre o homem e o impele a procurar a totalidade e a perfeição – Desejo de Individuação.
O Processo de Individuação
Processo de vida real em que tentamos consciente e deliberadamente compreender e desenvolver as potencialidades individuais inatas de nossa Psique. É através dele que a pessoa vai se conhecendo, retirando suas máscaras, abandonando as projeções lançadas anteriormente no mundo externo e integrando-as a si mesmo. É um processo árduo e direcionado a novo centro psíquico, o Self, ou Si-Mesmo.
Arquétipo e Símbolos
São importantes conceitos junguianos e estão intimamente ligados. Os símbolos são as manifestações exteriores dos arquétipos. Os arquétipos só podem-se expressar através dos símbolos, em razão de se encontrarem velados profundamente no Inconsciente Coletivo
Sonhos
Cada Sonho, originado no Inconsciente, cumprindo seu propósito a serviço do Processo de Individuação, se constitui de experiência pessoal, na qual, por meio de linguagem simbólica nos é revelada parcela de conhecimento, que nos torna mais conscientes e desenvolvidos.
Sem riscos de erros e exageros, afirma-se que os Sonhos, se incorporadas suas mensagens simbólicas, podem funcionar como espécie de psicoterapeuta que, em atividade natural e espontânea, tenta conduzir a pessoa para o Processo de Individuação.
Interpretação de Sonhos
É espécie de atividade tradutora da linguagem simbólica em que os Sonhos se expressam. Quando sonhamos, aquele pensamento, ou sentimento que expressaríamos com palavras e que nosso Ego Vígil está bem familiarizado, passa a ser expressos por meio de símbolos.
As mensagens simbólicas dos Sonhos trazem sempre o conflito entre sua tendência de ampliar o Ego de visão limitada da realidade.
Interpretar Sonhos é traduzir essa linguagem simbólica, é entender as metáforas enviadas pelo Inconsciente. Pela afirmativa de Jung: são os Complexos responsáveis, os promovedores dos Sonhos, então em última análise, interpretar Sonhos é tomar conhecimento dos Complexos.
Bom lembrar que Jung afirmava ser extremamente raro que um Sonho isolado possa ser interpretado com razoável eficácia. Entretanto, quando são analisadas séries oníricas, são fornecidas as pistas para corrigir eventuais erros cometidos em interpretações de Sonhos anteriores.
EGO VÍGIL E EGO ONÍRICO
Devido ao Ego, quando estamos em vigília, ter características distintas do Ego, quando estamos sonhando, usam-se as expressões Ego Vígil e Ego Onírico, para caracterizar essa diferença.
O Ego Vígil é o responsável por tudo que é feito em nome da Psique e, inclusive, está sujeito a prestar contas à sociedade.
As ações, que resultam em mudanças estruturais no mundo onírico, podem afetar o mundo do Ego Vígil. Essa herança de ações oníricas de mudanças estruturais pode ser vivenciada em alterações nos estados emocionais do Ego Vígil: alívio da depressão, declínio ou aumento da ansiedade, sentimento de decisão certa...
Em geral, a atividade onírica, que ocorre sem a participação do Ego Onírico, ou com o Ego Onírico passivo, como um mero observador, tende a estar também inconsciente na vida vígil do Sonhador.
A atividade do Ego Onírico, no mundo dos sonhos, é extensão do mesmo Processo de Individuação, que constitui a mais profunda tarefa do mundo vígil. Assim, a relação do Ego Onírico com o Ego Vígil é vista, portanto, como uma interação profundamente útil para a evolução e realização individual.
Esse diálogo entre o Ego Vígil e o Sonho mediado pelo Ego Onírico, é parte do mais amplo diálogo entre o Ego e o Si-mesmo.
TIPOS DE SIGNIFICADOS PARA SONHOS
- O Sonho representa a reação inconsciente frente a uma situação consciente.
Tipo de Sonho que traz reação inconsciente compensatória ou complementar a uma situação consciente ocorrida. Por exemplo: alguém que está furioso com um amigo, mas percebe que a fúria se dissipa com rapidez, poderá sonhar que investe furiosamente contra o amigo. Compensa fúria que havia sido reprimida.
Tipo de Sonho que dirige o Sonhador a entendimento mais abrangente das atitudes e ações.
- O Sonho representa situação fruto de conflito entre consciência e Inconsciente.
Nesse caso, não existe uma situação consciente que pode, em maior ou menor grau, ser responsabilizada pelo mesmo, e sim, lidamos aqui com certa espontaneidade do Inconsciente.
O Inconsciente, de forma espontânea, acrescenta, a uma determinada situação consciente, uma outra situação, a qual difere de tal modo da situação consciente, que se forma um conflito entre ambas. O Sonho, como autorrepresentação da Psique, numa compensação mais profunda, pode colocar uma estrutura do Ego em funcionamento, face a face, com uma necessidade de adaptação mais rigorosa ao Processo de Individuação.
Ilustra esse segundo tipo, o Sonho de Sonhador que se encontrava muito bem adaptado socialmente, na comunidade, na família e no trabalho onde uma voz impressionante dizia: “Não estás levando tua verdadeira vida” Voz que ecoou durante muitos anos e influenciou mudanças a horizontes desconhecidos na época do Sonho.
- O Sonho representa a tendência do Inconsciente para modificar uma atitude consciente.
Nesse caso, a posição modificadora assumida pelo Inconsciente é mais forte do que a posição consciente: o sonho representa um declive que se origina no Inconsciente e vai em direção à consciência.
O Sonho pode ser visto como tentativa para alterar diretamente a estrutura de Complexos, para a identidade em níveis mais conscientes. Exemplifica os casos em que nos Sonhos o Ego Onírico parece ser desafiado com várias tarefas, cuja realização poderá alterar a estrutura do Ego Vígil. Dentro da estrutura desses Sonhos, os eventos são vivenciados pelo Ego Onírico como interações com situações do mundo vígil, que podem refletir diretamente Complexos, envolvidos na estrutura e no funcionamento cotidiano do Ego Vígil.
- O Sonho representa processos inconscientes que não evidenciam uma relação com a situação consciente.
Jung assim os caracterizou: Sonhos dessa espécie são muito peculiares e, devido ao seu caráter estranho, não podem ser interpretados facilmente. O sonhador se admira tanto por sonhar algo assim, pois nem mesmo uma relação condicional pode ser estabelecida.
Trata-se de um produto espontâneo do Inconsciente. São sonhos imponentes. Sonhos que os primitivos designam de “sonhos grandes”. São de natureza oracular, “somnia a deo missa” (sonhos enviados por Deus). São experimentados como uma iluminação.
NATUREZA DAS IMAGENS DOS SONHOS
Devido aos Sonhos provirem de diferentes camadas da Psique e de a necessidade de isso ser levada em conta quando das interpretações, podemos dizer que as imagens dos Sonhos são basicamente de duas naturezas: Objetiva; e Subjetiva. Imagens Oníricas Objetivas e Imagens Oníricas Subjetivas.
Imagem Onírica Objetiva
É aquela que corresponde à realidade. É explícita e não traz qualquer dificuldade para interpretação dentro do contexto do Sonhador. São imagens referentes ao cotidiano. Ilustrações:
Estudante de escola com ensino e avaliação exigentes está em provas. Passou o dia inteiro estudando determinada matéria e não conseguiu entender determinado assunto. Vai dormir e sonha com o material estudado e consegue entender a pendência;
Mulher trabalhando fora com dois filhos sempre muito ocupada, antes de dormir, vai separar entre outros a chave do carro e não a encontra. Durante o sono, sonha com a chave dentro de pote junto à geladeira;
Brigou com os pais e sonha com a briga;
Está ansioso para fazer alguma coisa e sonha não ter conseguido ou ter chegado atrasado...
Leu um livro, assistiu a um, filme, ou a um show e sonha com o entretenimento; e
É um praticante apaixonado por determinado esporte e fica impossibilitado de praticá-lo por algum motivo, ou compromisso não esperado e sonha praticando o esporte.
Imagem Onírica Subjetiva
É aquela do Sonho com a finalidade de simbolizar e referirem-se a própria Psique, ou realidades intrapsíquicas do Sonhador.
É aquela que não corresponde à realidade. É velada, mesmo que a imagem pertença à realidade do Sonhador, ela traz implícito um significado. As ilustrações são as mais diversas e variáveis. Existem glossário de sonhos. Os exemplos a seguir foram extraídos do Glossário de Sonhos do livro “Por que sonhei com isso? De Lauri Quinn Lowenberg:
Avião - Um caminho escolhido pode estar decolando e alcançando novas alturas, colocando-o mais perto das metas determinadas. Geralmente aponta para a vida profissional, mas poderia determinar qualquer coisa a ser mantida “em alta”, como finanças, relacionamento, autoestima... Se a imagem de avião é em queda, talvez signifique o medo existente na vida, ou em seu interior, ou perda financeira sofrida;
Voar – Capacidade de se libertar dos males terrestres e de coisas deprimentes e que nos fazem sentir pesados. Também a capacidade de atingir novas alturas e alcançar nível de vida mais elevado. Pode significar um abraço de parabéns de seu subconsciente por ter feito um bom trabalho, ou celebração de algum ocorrido que alegra seu espírito.
Além dessas imagens que poderíamos dizer fazerem parte de nossa realidade - podemos nunca ter viajado de avião, nós não voamos, entretanto o avião existe e os pássaros voam – existem outras excepcionais, ou fictícias: figuras superiores ao humano, lugares nunca vistos que, geralmente, transcendem a experiência do Sonhador. Pertencem ao nível do Inconsciente Coletivo e estão associadas a imagens arquetípicas.
Essas imagens subjetivas ocorrem em momentos críticos de nossas vidas e a pessoas que estejam envolvidas no seu próprio Processo de Individuação.
TÉCNICA DE ASSOCIAÇÃO DE IMAGENS ONÍRICAS PARA INTERPRETAÇÃO DE SONHOS
Consiste em exprimir pensamentos e sentimentos que surgem às imagens de Sonhos. Um bom começo para interpretar Sonhos estimulando essas associações com perguntas a respeito das imagens surgidas nos Sonhos. Basicamente sobre o que o Sonho despertou emocionalmente e racionalmente.
Essas associações revelam a natureza do Complexo, quando de seu desenvolvimento em torno de núcleo arquetípico. Na prática, pessoas, lugares, ou eventos conhecidos têm grandes probabilidades de conter um significado objetivo. Entretanto, especialmente, quando as imagens oníricas vêm acompanhadas de pronunciado tom emocional, podem referir-se a realidades intrapsíquicas do Sonhador.
Imaginação Ativa
Técnica criada por Jung, na qual o conteúdo inconsciente é encorajado “vir à tona”, ao mesmo tempo que o Ego mantém seu papel de mediador dos opostos constelados na Psique. Concebida pela necessidade de os pacientes de Jung construírem sentidos para as fantasias, que surgiam junto ao relato dos conteúdos oníricos.
Consiste no processo de desdobramento de uma imagem onírica ou uma associação do Sonhador, que as desenvolve, deixando a fantasia trabalhar livremente. O processo se daria por determinadas condições psíquicas inconscientes que, utilizando-se do material consciente disponível, atuariam como reguladoras e como estimuladoras da atividade criadora da fantasia. Tornou-se então tanto técnica de análise como técnica complementar e de grande valia à Interpretação de Sonhos.
Ampliação (Amplificação)
Técnica consolidada a partir do método “Imaginação Ativa”, que Jung considerava o mais eficaz para alteração de Complexos.
É técnica de associação que envolve, em linhas gerais, “o uso de paralelismos pessoais, míticos, históricos e culturais a fim de esclarecer e ampliar o conteúdo metafórico do simbolismo onírico.
A ideia é que se parta de um fio condutor comum ao tema trazido para que ele se enriqueça, criando-se, assim, um “tecido psicológico” mais amplo no qual se possa melhor contextualizar e visualizar a imagem trazida.
O material escolhido para a amplificação deve ser algo que faça parte do mundo em que o paciente vive, ou seja, algo de sua cultura, que o mesmo reconheça, que faça sentido.
A Ampliação de imagem onírica é progressiva, pois se faz primeiramente encontrando as associações pessoais. Em seguida as imagens culturais e transpessoais e, por último, a ampliação arquetípica.
Frequentemente, as ampliações culturais são conscientemente conhecidas pelo Sonhador e podemos considera-las, com segurança, parte potencial do Complexo, subtendido na imagem onírica.
O terceiro nível de ampliação, o Arquetípico acrescido à interpretação dos Sonhos, pela psicologia junguiana. As Imagens Arquetípicas são por demais conhecidas e alguns analistas as acham dispensáveis na maioria das interpretações de Sonhos, principalmente quando a interpretação é feita pelo próprio Sonhador.
TÉCNICA CIRCO-AMBULAÇÃO
Consiste em girar ao redor da imagem onírica, em especial as Imagens Oníricas Subjetivas.
Olhar essa Imagem Onírica sob os mais diversificados ângulos, ter as mais variadas perspectivas sobre a mesma e desdobrá-la nos mais variados significados.
Essa técnica livra o interpretador de Sonhos de matar o símbolo. Se de antemão já sabe o que imagem significa (por exemplo, se uma mulher sensual no Sonho já significar Anima logo de cara, ou uma figura negra e suspeita for Sombra), matamos a possibilidade desse símbolo “falar” o que gostaria.
ETAPAS DA INTERPRETAÇÃO DOS SONHOS
São três as etapas da interpretação dos Sonhos, na abordagem junguiana: Compreensão Clara dos Detalhes do Sonho; Reunião Progressiva De Associações E Ampliações; e Colocação Do Sonho Ampliado No Contexto Do Sonhador.
Compreensão Clara Dos Detalhes Do Sonho
Consiste em o Sonhador recordar e registrar os Sonhos nos seus detalhes, para minimizar o risco com o reducionismo.
Reducionismo que pode ocorrer: devido a projeção da própria (do Sonhador ou analista) teoria sobre o Sonho; por complementação das imagens (pelo analista ou pelo Sonhador) conforme sua maior crença; e reducionismo arquetípico pois, como todos os Complexos são construídos a partir de um núcleo arquetípico, é sempre possível super ampliar um motivo onírico no sentido de um significado arquetípico.
As perguntas necessárias à plena elucidação de Sonhos são semelhantes às usadas para o esclarecimento de qualquer situação. Além disso, é importante também registrar as emoções sentidas e provocadas pelas imagens oníricas.
Sonhar com trabalho é uma descrição de Sonho muito reduzida. Detalhar é preciso: trabalho costumeiro; trabalho nunca antes realizado; objetivo do trabalho; era em escritório, em casa a céu aberto, subterrâneo...
Sonhar com cobra é descrição de Sonho muito reduzida: como é a cobra que apareceu no Sonho? Ela é grande ou pequena? Está morta, ou viva? Se viva desliza como réptil, ou tem poderes como falar, voar...? Qual a ação dela no Sonho: de ameaça, ou ataque, ou inofensiva?
Quais sentimentos surgiram: medo? Nojo? Simpatia/ fascínio?...
Reunião de Associações e Ampliação Progressiva
A imagem do sonho pode ser aceita e refere-se objetivamente à vida real (Imagem Onírica Objetiva), ou subjetivamente (Imagem Onírica Subjetiva), pra simbolizar parte da própria psique do Sonhador? As imagens podem referir-se a realidades intrapsíquicas do Sonhador.
A Ampliação de Imagem Onírica é progressiva, pois se faz primeiramente encontrando as associações pessoais. Em seguida as imagens culturais e transpessoais e, por último, a ampliação arquetípica.
A Ampliação de imagens pessoais: onde apareceu a imagem durante a vida; o que se pensa sobre a imagem; o que sente a seu respeito...
Essas associações revelam a natureza do Complexo, quando de seu desenvolvimento e em torno de qual núcleo arquetípico.
A ampliação das imagens culturais e transpessoais: a cor vermelha de semáforo indica “pare”; a cor branca, como a cor nupcial, ou da paz; imagem presidencial representando o centro do governo de um país...
O terceiro nível de ampliação, o Arquetípico acrescido à interpretação dos Sonhos, no caso como o da interpretação ser feita pelo próprio Sonhador é considerada dispensável.
Colocação Do Sonho Ampliado No Contexto Do Sonhador
O Sonho deve ser interpretado no contexto da vida e do Processo de Individuação do Sonhador.
O Ego tem sempre visão limitada da realidade, ao passo que o Sonho manifesta uma tendência para ampliação do Ego.
Situar o Sonho no contexto da vida do Sonhador, não favorece qualquer leitura fácil do Sonho como pista para ação futura. Do mesmo modo aceitar o Sonho como confirmação da atual posição consciente do Sonhador, geralmente, não fornece a informação compensatória que o Sonho contém.
Em geral, a atividade onírica, que ocorre sem a participação do Ego Onírico, ou com o Ego Onírico passivo, como um mero observador, tende a estar também inconsciente na vida vígil do sonhador.
ILUSTRAÇÃO DE SONHO E DE REDUÇÃO DE AMBIGUIDADES DE IMAGENS ONÍRICAS
Pretende-se, além de ilustração da interpretação de Sonhos: exemplificar como se reduz a ambiguidade de imagens oníricas relacionando-as numa série de Sonhos; mostrar como diferentes imagens podem representar o mesmo Complexo subjacente; e mostrar como a dinâmica do Ego Onírico em seu trabalho pode servir de mensageiro facilitador do Processo de Individuação do Sonhador.
É possível relacionar uma imagem de um Sonho atual com imagens semelhantes de Sonhos passados. Geralmente, imagens afins, mas diferentes, são consideradas visões distintas do mesmo Complexo e fornecem pistas adicionais para o significado.
Ilustra-se com exemplo extraído do Livro “Jung e a Interpretação de Sonhos” de James A. Hall.
Contexto De Quando A Paciente Iniciou O Atendimento Com Dr. James A. Hall
Mulher com acentuados distúrbios no começo da vida familiar. Quando criança ela havia sido a principal fonte de apoio emocional para o pai alcoólico. Se não tentasse cuidar dele, sentia-se culpada
Sua mãe era eficiente profissional liberal, que alimentava “elevados” padrões de realização para a menina, mas lhe dava escassa aprovação.
Recorreu à psicoterapia por problemas em seu casamento. Decidiu pelo divórcio, mas depois teve relação sexual com antigo terapeuta, com quem acabou se casando, para acabar experimentando uma recorrência da insensibilidade sexual, que sentira em seu primeiro casamento.
As tentativas de relações sexuais deixaram-na, com frequência, furiosa. Recorreu, então ao tratamento com psicoterapia de grupo e análise individual junguianas.
Informações Da Atual Psicoterapia (Individual e de Grupo)
Mostrou-se solicita e intelectualmente arguta, embora problemas persistentes relacionados com fatores emocionais exigissem várias hospitalizações.
Primeiro Sonho Da Série
Um incidente muito revelador aconteceu numa das primeiras sessões de terapia de grupo: como habitualmente estava sendo muito solicita e perspicaz em suas intervenções, mas quando um membro do sexo masculino se recusou a ajuda-la, explodiu num súbito acesso de cólera, revelando pela primeira vez sua ira (relacionada com sua depressão).
Por essa época sonhou: “uma cadela com dois filhotes crescidos pendentes de suas tetas está se arrastando rua abaixo. Um dos filhotes desprende-se e é atropelado por um carro. O filhote explode como uma bomba.
A impressionante imagem de um cachorrinho explodindo tornou-se símbolo para seu problema de dependência e para a cólera inconsciente que lhe estava associada. Muitas situações da vida vígil puderam ser relacionadas com sua identificação inconsciente, ou com a pessoa desgastada por ter de cuidar de outros (a mãe auto sacrificada), ou com a ira explosiva que se desenvolveu em virtude de sua própria dependência (o cachorrinho explosivo) – em ambos os casos, porque as necessidades de dependência nunca foram plenamente satisfeitas e porque a impediram de realizar sua própria maturidade e independência adulta.
Segundo Sonho Da Série
Após seu segundo divórcio, continuou em análise, mas, por algum tempo, evitou qualquer relacionamento pessoal com homens.
Durante esse período sonhou o seguinte: “eu estava numa câmara egípcia, como numa pirâmide. Numa área elevada, um altar ou um catafalco (estrado alto sobre o qual se coloca o alaúde ou a representação de um morto que se quer prestar honras), uma princesa egípcia estava em trabalho de parto, prestes a dar à luz. Na base desse altar eu estava sendo violada por (uma figura paterna), que me sujeitava numa posição sempre que tentava escapar. Eu ansiava para que a mulher desse a luz, na esperança de que o marido da princesa surgisse, visse o estupro e me salvasse.
Esse Sonho deixava claro que o Complexo paterno estava muito mais ativo em sua psicologia do que sua relação conflitada com a mãe. Mostrou também a possibilidade de nova vida (o nascimento incipiente), sugerindo uma oportunidade não iniciada pelo Ego, mas que poderia redundar no resgate da paciente do padrão inconsciente, simbolizado no sonho pelo incesto com o pai.
Significativamente, pouco depois desse Sonho, estabeleceu relações sexuais com o homem, cuja esposa havia aparecido no Sonho como a princesa egípcia – uma projeção bastante óbvia do salvador interno da Sonhadora num homem real.
Terceiro Sonho da Série
Após um breve período de felicidade, esse relacionamento terminou e ficou seriamente deprimida, o que sabia não estar por completo relacionado com a situação triangular externa.
Algum tempo depois ela sonhou: “Eu estava dando um presente a minha mãe e ela reagiu como sempre fazia na realidade...Não gostava nunca de qualquer coisa que lhe desse. Nunca pude agradar-lhe. Depois percebia a razão de não se mostrar satisfeita: estava morta! No quarto estava o médico de novela que costumava assistir na TV, pela época de meu primeiro casamento quando meus filhos estavam pequenos. Na história era um médico muito bom e prestativo.
Embora esse Sonho parecesse indicar uma nova consciência associada à “morte” do Complexo Materno, houve poucas mudanças imediatas em sua depressão. Ela lutava com a ideia de mudar para outra cidade, a fim de se livrar do homem que ainda perturbava seus pensamentos.
Quarto Sonho da Série
Nesse momento, sonhou o que provaria ser uma situação crucial em sua neurose.
Na manhã seguinte ao Sonho, descreveu-se como “hipomaníaca”, feliz (o mais importante) sem o desconforto psicossomáticos que usualmente a afligia (sintomas).
Eis o seu Sonho: “Estou num quarto com minha mãe (que estava morta no Sonho anterior e, também, de fato.) Estou implorando a um homem que tenha relações sexuais comigo. Ele se mostra relutante, mas caba por concordar porque diz ele: “É a última vez”. A cena muda e vejo uma poça de sangue com alguma coisa nela, que é um bebê morto, ou um cachorro morto. É uma visão horrível, mas, de certo modo, está certo, porque teria morrido de qualquer maneira.
Ela ter pedido sexo ao homem mostrou o desejo previamente não reconhecido, oculto, sob o que tinha vivenciado apenas como estupro. Sua associação com “bebê, ou cachorro” foi em relação ao Sonho anterior do cachorrinho que explode. A sensação de que o Complexo Paterno subjacente em seus problemas neuróticos estava se dissolvendo, refletiu-se nas palavras do homem do Sonho: “É a última vez”.
O desaparecimento abrupto de seus difíceis sintomas psicossomáticos reforçou a indicação do Sonho como indicativo de uma real mudança no padrão de complexos, o, padrão de relações do objeto que parecia ser o esquema de suas duas identidades neuróticas básicas – como a pessoa que cuida de outras, ou (como aqui) a que se sente dependente de outras.
A presença de sua mãe sugere também o envolvimento do Complexo Materno, mas esse problema não é o foco ativo do Sonho, como tão pouco era o foco no Sonho da princesa egípcia. Percebe-se que a morte do “bebê ou cachorro” está ligada a “última vez”, como seria o caso se fosse um cachorro, associado ao cachorrinho explosivo que representava seu problema de dependência.
A incerteza sobre “bebê ou cachorro”. Se bebê poderia indicar a morte de possibilidades humanas reais; se cachorro poderia sugerir o sacrifício de um instinto animal que poderia reaparecer mais tarde em forma humana, foi evidentemente resolvida por um Sonho que ocorreu na noite seguinte.
Quinto Sonho da Série
Sonhei a noite toda com duas coisas, que ficaram entrando e saindo de minha consciência durante a noite inteira. Uma era uma barata morta esborrachada que tinha patas em toda a volta do corpo. (um desenho do que tinha visto se associava a um desenho infantil do disco do Sol com raios). Ao lado da barata estava um rato morto que tinha sido cuidadosamente embrulhado num pequeno lençol. O rato tinha grandes olhos azuis penetrantes, quase como uma pessoa.
A forma da barata lembrou-lhe também um “cachorrinho de pano” relacionado a sua adolescência, quando ocorreu grande parte da relação tensa com seu pai. Recordava-se de ter em sua cama um cachorrinho de pano, com o “pelo” distribuído radialmente como as patas da barata.
Essas associações, somadas as outras imagens no Sonho sugeriam que, no Sonho anterior, se tratava de um cachorro morto, não de um bebê. Senão vejamos: se a Psique da Sonhadora é afetada pelos mesmos Complexos Constelados em ambos os Sonhos, o que se mostrou como morto num Sonho deve ser mostrado como morto num outro. No segundo Sonho são claramente não humanas.
Essa série de Sonhos ilustra um certo número de importantes Pontos na Interpretação dos Sonhos.
Em primeiro lugar: sequência de imagens relacionadas permitem aperfeiçoar prognóstico na análise e alguma compreensão das imagens que, sem isso, continuariam ambíguas. (redução de ambiguidade das imagens oníricas)
Em segundo lugar: as imagens numa série de Sonhos são semelhantes, mas não idênticas (o “cachorro”, o “bebê, ou o cachorro”, a “barata esborrachada”, “o rato morto”), mostrando que as diferentes imagens podem representar o mesmo Complexo subjacente.
Em terceiro lugar: a mudança na natureza, ou teor dos Sonhos coincide com o aumento da atividade do Ego Onírico. Parece que a resolução das estruturas oníricas consteladas se segue, com frequência, a uma ação do Ego Onírico, mesmo que simplesmente uma mudança de atitude.
Finalmente, em quarto lugar: essa série de Sonhos ilustra como o Ego Onírico pode se envolver cada vez mais nas estruturas dos Complexos neuróticos descritos nos Sonhos. Senão vejamos: no Sonho do “cachorrinho que explode” o Ego Onírico é, apenas, um observador passivo; no Sonho da princesa egípcia o Ego Onírico deseja atuar, mas não pode; no Sonho de súplica para que um homem tenha com ela relação sexual, o Ego Onírico está finalmente ativo.
FONTES
LIVROS:
Por que sonhei com isso? – Lauri Quinn Loewenberg;
Os sonhos e a cura da alma - John A. Sandford; e
Jung e a interpretação dos sonhos - James A. Hall.
SITES:
psicologiamsn.com; e
sobresp.com.br
ENDEREÇOS RELACIONADOS
FUNDAMENTOS DA PSICOLOGIA JUNGUIANA (Psicologia; Psique; e Estruturas Gerais)
http://www.recantodasletras.com.br/artigos/6764031
FUNDAMENTOS DA PSICOLOGIA JUNGUIANA – ESTRUTURAS ESPECIALIZADAS
http://www.recantodasletras.com.br/artigos/6770289
FUNDAMENTOS DA PSICOLOGIA JUNGUIANA – INCONSCIENTE, SI MESMO E INDIVIDUAÇÃO
http://www.recantodasletras.com.br/artigos/6776019
O QUE SÃO OS SONHOS
http://www.recantodasletras.com.br/artigos/6781902
COMPLEXO – SIGNIFICADO, CARACTERÍSTICAS E MANIFESTAÇÕES
https://www.recantodasletras.com.br/artigos/7701882
COMPLEXO – TRANSFORMAÇÃO
https://www.recantodasletras.com.br/artigos/7707397
ARQUÉTIPOS – SIGNIFICADO, ORIGEM, CARACTERÍSTICAS E IMPORTÂNCIA
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