Complexo – Significado, Características e Manifestações

INTRODUÇÃO

Nosso esforço para entender sobre a psicologia analítica de Jung tem como objetivo a compreensão e a interpretação dos sonhos.

Em publicações anteriores, quando abordamos os fundamentos da psicologia junguiana, tratamos de Complexo, dentro das estruturas gerais da psique.

Entretanto, ao perceber que muito dos sonhos eram mensagens para nos tornar conscientes de complexos e caminharmos no processo de Individuação, então decidi pesquisar, estudar e organizar texto mais abrangente sobre esse conteúdo de nossa psique.

Como num único artigo o tornaria muito extenso, dividimo-lo em dois: este está voltado para sua origem, significado, características, manifestações e, num outro, a relação entre o Ego e os complexos, ou seja, a possibilidade de transformação.

TESTE DE ASSOCIÇÃO DE PALAVRAS E OS COMPLEXOS

Consistia em solicitar ao paciente que respondesse com o que lhe viesse à mente, a certas palavras-estímulo, que lhe eram apresentadas.

A lista era constituída de palavras simples, de caráter neutro, sem significado emocional presumido, e de palavras mais fortes que eram capazes de mobilizar conteúdos afetivos.

O tempo que o paciente levava para responder era cronometrado, pois Jung, a principio, estava preocupado em medir o tempo de reação, entre a palavra-estímulo e a resposta.

A expectativa de Jung era que as respostas às palavras neutras tivessem o mesmo padrão de velocidade, isto é, mais rápido, e que as palavras mais fortes apresentassem padrão mais demorado. Não foi isso que aconteceu.

Jung entendeu que o desvio do esperado acontecia, principalmente, quando a palavra-estímulo provocava reações afetivas, ao tocar conteúdos emocionalmente perturbadores. A esse fenômeno denominou de Constelação.

Desta forma, a associação com palavras fortes levanta conteúdos, quase sempre

inconscientes, com carga emocional. Esses conteúdos tornam difícil a utilização dos mecanismos da vontade e a própria memória pode ser afetada.

O fenômeno Constelação, indicador de complexos, resultava de as palavras, que tocam em processos psíquicos complicados, produzirem, constelarem reações. Os pensamentos, quando associados às emoções deixavam de ser racionais e lineares. Eles produziam certas reações emocionais e tinham a tendência de se agruparem em torno de núcleos com significados semelhantes.

A esses núcleos com significados semelhantes e dotados de energia psíquica, Jung denominou de Complexos Ideo-afetivos.

Jung, ao aplicar o Teste da Associação de Palavras e comparar os resultados de pacientes psicóticos e pessoas saudáveis, conseguiu demonstrar cientificamente não apenas a existência do Inconsciente como a existência de complexos.

SIGNIFICADO

Complexo Ideo-afetivo é grupamento de representações mentais, mantidas juntas por emoção. Os complexos se organizam a partir de experiências emocionais significativas do indivíduo.

Os complexos ideo-afetivos, como são chamados, são a origem e o centro da vida psíquica.

Nesse ponto de vista, para Jung, o próprio Ego, o centro do Consciente, seria um Complexo, o complexo egóico.

Embora o Ego seja o mais consciente e por isto o mais livre dos complexos, essa liberdade pode ser solapada, quando outro Complexo adquire muita energia psíquica, relativizando o aspecto emancipado do eu. Isto acontece quando um Complexo é constelado.

CARACTERISTICAS

Autonomia

O que promove a movimentação do Complexo é a energia nele constelada. Quanto maior a energia psíquica aglutinada num Complexo e quanto mais inconsciente, maior é a sua autonomia.

Quanto menos consciente estivermos de um Complexo, maior é o seu

caráter independente, autônomo e perturbador, e, enquanto se mantiver assim, sempre retornará de maneira imprevisível, principalmente se for investido de uma forte carga energética.

Um Complexo pode ser deflagrado quando ideias, lembranças e fantasias

atingem conteúdos inconscientes e se tornam autônomos, porque tem mais carga energética que o Ego, complexo egóico.

O Complexo não é necessariamente negativo. Necessitamos dos complexos. Eles fazem parte do funcionamento geral da psique, o centro da psique consciente é o complexo egóico, o Ego.

Os complexos não são necessariamente apenas negativos. O Complexo tem dois lados: um é o lado dos problemas que pede uma solução, porque causa perturbação e, o outro seria o lado da fantasia criativa.

O que determina a morbidez ou a criatividade do Complexo é seu grau de autonomia. Quanto mais autônomo e dissociado do Consciente mais destrutivo o Complexo, podendo chegar a estados psicóticos, resultantes de quando o Ego desaparece e o Consciente é invadido pelos complexos autônomos, personificados como espíritos malignos, vozes ou visões.

Dinamismo

O dinamismo dos complexos não está atrelado apenas às experiências pessoais do individuo, como traumas e choques emocionais, ocorridos na infância, ou acontecimentos conflitantes atuais.

Para Jung, além de predisposição e fragilidade individual frente a determinados conflitos, todos os complexos tinham duas esferas: casca; e núcleo.

Casca do Complexo, esfera mais rasa que girava em torno da personalidade propriamente dita e mais visível, através das reações e sintomas.

Núcleo do Complexo, esfera mais profunda e de mais difícil acesso, que girava em torno de um núcleo arquetípico.

Personificação

Os complexos são frequentemente personificados; personagens em sonhos podem ser entendidos como nossos próprios complexos personificados.

Morbidez

Complexos podem agir sobre o Ego, interferindo no funcionamento adequado do Consciente, perturbando a adaptação criativa do sujeito. Podem dominar de tal forma o Complexo Egóico que o indivíduo se sente identificado com seus conteúdos, originados de raízes inconscientes e, de imediato, sempre indefinidas.

Os complexos interferem na capacidade cognitiva, nos relacionamentos, no trabalho, na visão que temos de nós, dos outros e do mundo. Ele tira a liberdade de ação e a pessoa fica a mercê dos impulsos que não consegue controlar, pois são autônomos e carregados de energia psíquica.

Dada a sua natureza inconsciente, os complexos dão a impressão de não

pertencerem ao Ego e, quanto mais intensa a energia psíquica constelada, mais são capazes de dominar o eu e, por isso, Jung falou que não é o sujeito que possui um Complexo, mas é o Complexo que possui o sujeito.

Criatividade

Ao contrário de morbidez, o Complexo, interagindo dialeticamente com o Ego, leva à criação inspirada, quando o fluxo adaptativo cotidiano do processo consciente é interrompido pela criação de uma ideia nova, uma criação literária, artística ou científica.

O homem criativo necessita ter um contato constante com seus complexos, para que o processo criativo tome lugar. Na criatividade os complexos tiram do complexo egóico sua tirania sobre o Consciente.

O exagero dessa tirania é considerado doença psíquica tanto por Jung como pela psicanalista Joyce McDougall, que chamou de normopatia, a consciência excessivamente normal, adaptada, dissociada da criatividade dos complexos. Já Jung adjetivou de normopata indivíduo identificado com sua Persona, à máscara da adaptação social.

MANIFESTAÇÕES E SEUS MECANISMOS

Quando um Complexo é ativado, a pessoa realmente reage de modo

emocionalmente exagerado, porque não está reagindo apenas à situação do momento, mas a todas as experiências semelhantes que foram marcantes no decorrer da sua vida.

Quando um Complexo é ativado, o individuo se percebe sem liberdade para agir

porque se sente invadido por emoções carregadas de energia psíquica, muito superior à energia do seu eu consciente.

São diversas as formas de manifestação do Complexo: sintomas, atos falhos, lapsos de memória, lembranças, sonhos, fantasias, possessões...

Dessas influências negativas, destrutivas dos complexos sobre o Ego, podem resultar em doenças psíquicas: neuroses dissociativas, despersonalizações e estados afetivos anormais.

Sintomas

São defesas do Ego para evitar mudanças que são necessárias para o desenvolvimento, mas que são sentidas pelo Ego como ameaçadoras. Parecem mais com uma encarnação dos complexos, eles são experimentados na carne, no corpo.

Fantasias

Imagens personificadas das emoções. Os complexos tem a capacidade de criar fantasias. No sono a fantasia aparece como sonho, mas também, quando estamos acordados, produzimos fantasias relacionadas a conteúdos inconscientes.

Os complexos podem se manifestar através de imagens das personagens que aparecem nos sonhos e são também as vozes na nossa cabeça, as figuras visionárias que aparecem nos momentos de estresse...

Os complexos se manifestam também no comer demais, beber demais, consumir demais, estar ansioso demais, irritado demais, inferiorizado demais, fóbico demais, rígido demais, arrogante demais e toda sorte de emoções que são perceptíveis nas posturas, sensações corporais e doenças psicossomáticas.

Os mais relevantes mecanismos psicológicos dessa diversidade de formas de manifestações dos complexos são: compulsão; inflação e projeção.

Compulsão

Presente quando nossas atitudes são automáticas e sem reflexão. Nesta situação não há diferença entre o “eu” e o impulso, tampouco questionamentos sobre os motivos pelos quais estamos nos movendo, ou para onde estamos indo. Há, apenas, resposta automática a um impulso.

Inflação

Estado de confiança absoluta. Descreve sentimento de poder, o qual é inflado por força desconhecida, que não é nossa, nem do nosso julgamento, ou escolha e nos faz sentir infalíveis e autoconfiantes.

Projeção

Esse mecanismo ocorre quando os conteúdos do inconsciente chegam até o Consciente e não condizem com a imagem idealizada que temos de nós. Como não podemos aceita-los como nossos, o Complexo inconsciente se projeta em algo externo a nós.

A projeção pode ser considerada a primeira etapa da consciência. O Inconsciente de alguma maneira foi fisgado por algo que corresponde ao campo energético do Complexo e projetou-se no exterior, numa coisa ou pessoa, gerando maior possibilidade de desenvolvimento.

OBSEVAÇÕES FINAIS

Ficou claro que os complexos são o centro de nossa vida psíquica e que sua natureza inconsciente interfere em nossas vidas, chegando ao ponto de “o Complexo possuir o sujeito”.

Como disse Jung : do Complexo “depende o bem-estar ou a infelicidade de nossa vida pessoal”; e "a via que nos leva ao Inconsciente não são os sonhos, como afirmava Freud, mas os Complexos, pois são estes os responsáveis pelos sonhos e pelos sintomas".

Daí a importância de os transformarmos por meio de espécie de interação dialética com o Ego, por espécie de processo alquímico dos complexos.

Num próximo artigo, trataremos como se dá esse processo de transformação dentro desse contexto junguiano.

Óbvio que o entendimento seria facilitado, com leitura anterior dos artigos destinados aos fundamentos da psicologia junguiana.

FONTES:

LIVROS:

Jung e a Interpretação dos Sonhos - James A. Hall e

Sonhos e a Cura da Alma - John A. Sandford

Trabalho

Especialização em Psicologia Analítica pela Universidade Católica do Paraná - ELAIDE LABONDE

Artigos

A teoria dos complexos de C. G. Jung aplicados ao estudo da cultura –

Walter Boechat

ENDEREÇOS RELACIONADOS

FUNDAMENTOS DA PSICOLOGIA JUNGUIANA (Psicologia; Psique; e Estruturas Gerais)

http://www.recantodasletras.com.br/artigos/6764031

FUNDAMENTOS DA PSICOLOGIA JUNGUIANA – ESTRUTURAS ESPECIALIZADAS

http://www.recantodasletras.com.br/artigos/6770289

FUNDAMENTOS DA PSICOLOGIA JUNGUIANA – INCONSCIENTE, SI MESMO E INDIVIDUAÇÃO

http://www.recantodasletras.com.br/artigos/6776019

O QUE SÃO OS SONHOS

http://www.recantodasletras.com.br/artigos/6781902

J Coelho
Enviado por J Coelho em 23/01/2023
Reeditado em 25/01/2023
Código do texto: T7701882
Classificação de conteúdo: seguro