História da Consolidação da Psicologia Enquanto Ciência.

Universidade de Pernambuco (UPE).

Cadeira de História da Psicologia.

Raul Magalhães Brasil.

Introdução.

O filósofo do iluminismo Immanuel Kant(1724-1804) buscou diferenciar quais aspectos e áreas do conhecimento ficavam a critério da metafísica, e quais ficavam a critério das ciências. Nesse processo de diferenciação, Kant postulou que a psicologia não poderia ser considerada ciência, e que os estudos sobre a mente e o espírito pertenciam somente ao campo da metafísica e da filosofia como um todo. O filósofo alemão demonstrou que, para ser considerada ciência ao lado de outras como as naturais, a psicologia deveria atender a três principais requisitos, sendo estes: 1) possuir um elemento objetivo de pesquisa; 2) separar sujeito e objeto durante o processo de análise; 3) ter uma matematização mais avançada que a geometria da linha reta. Esses critérios postos por Kant foram derrubados de maneira não-sistemática, por pesquisadores das mais diversas áreas do conhecimento num processo que perdurou durante os séculos XIX e XX. Em ensaios anteriores foi-se abordado como as filosofias da idade antiga até a idade moderna influenciaram os estudos sobre a mente e o espírito, agora demonstrar-se-á como as ciências da fisiologia, da física e os métodos da medicina tiveram um papel fundamental no que concerne à consolidação da psicologia enquanto uma ciência.

I. O Primeiro Postulado.

Johannes Peter Müller(1801-1858) foi de extrema importância para derrubar o primeiro postulado de Kant e para dar o pontapé inicial aos estudos de neurofisiologia e neurobiologia que contribuíram para a consolidação da psicologia enquanto ciência. Sua principal contribuição para a psicologia se dá em 1826, em detrimento de sua teoria das energias neurais específicas, onde formula que existiria uma “energia nervosa” específica para cada nervo nas vias aferentes do corpo, chegando à conclusão de que a percepção e as sensações seria um reflexo da estimulação direta desses fluidos. Desse modo, Müller transforma a sensação e a percepção em elementos objetivos de estudo, derrubando o primeiro postulado de Kant.

II. O Segundo Postulado.

O cientista Hermann von Helmholtz(1821-1894) foi um médico, físico e matemático que devotou a sua vida à ciência. Em 1911 foi considerado pela Enciclopédia Britannica como um dos homens mais importantes do século XIX. Foi aprendiz de Johannes Muller e contribuiu para o seu trabalho. Assim como seu professor, Helmholtz estuda as sensações provocadas pelas vias aferentes do sistema nervoso periférico e formula a teoria das inferências inconscientes, onde propõe que as sensações do corpo seriam também influenciadas pelas vivências do indivíduo.

Helmholtz derruba o segundo postulado proposto por Kant com o método de análise das sessões, onde o sujeito analisado é instigado a reconhecer a gênese de suas sensações. Esse método se dá através de um treinamento, que limita o quantitativo de pessoas que poderiam se submeter ao procedimento para que não houvesse confusão entre o objetivo e as experiências passadas e, desse modo, fazia-se necessário que o sujeito do experimento fosse também um fisiólogo. Destarte, Helmholtz consegue fazer com que sujeito e objeto sejam dissociados durante a análise.

III. O Terceiro Postulado.

Gustav Theodor Fechner(1801-1887) foi um físico e matemático brilhante em sua época, mas foi a partir de complicações com a cegueira que despertou seu interesse pela filosofia, pela psicologia e pela religião. Ele foi influenciado pela filosofia do idealismo alemão e pelas filosofias orientais, parecia guardar especial apreço pela produção filosófica do idealista alemão Schelling. Para Fechner, o físico e o psíquico não seriam realidades opostas, mas aspectos de uma mesma realidade essencial, ou seja, fenômenos mentais correspondem a fenômenos orgânicos(estímulos), algo denominado Paralelismo Psicofísico. Foi procurando comprovar sua teoria que Fechner formulou em seu livro Elementos de psicofísica, publicado em 1860, uma lei matemática que estabelecia a relação entre a quantidade de excitação e a intensidade da sensação. Tal lei se exprime por S = k log R onde S representa a sensação, k é uma constante numérica e R representa o limiar de percepção do estímulo. Essa lei derrubou, finalmente, o terceiro postulado de Kant, que dizia que para a psicologia ser considerada uma ciência precisaria ter uma matematização mais avançada que a geometria da linha reta.

Outro pesquisador importante no que concerne à matematização da psicologia foi Ernst Heinrich Weber(1795 – 1878). O médico alemão se interessava principalmente pela fisiologia dos órgãos sensoriais, aprofundando-se principalmente nas pesquisas acerca das sensações cutâneas e musculares. Entre as suas contribuições para a consolidação da psicologia enquanto ciência podemos citar a descoberta do limiar de dois pontos de discriminação da pele e também a diferença apenas perceptível detectada pelos músculos. Essa segunda contribuição, em especial, foi de extrema importância para a formulação da supracitada primeira lei quantitativa da psicologia, conhecida como a lei Fechner-Weber.

IV. O Primeiro Laboratório de Psicologia.

A contribuição dos cientistas e pesquisadores citados anteriormente, reforço, foi determinante para formular a psicologia enquanto uma ciência como as ciências naturais. No entanto, nenhum deles tinha, de fato, a intenção e o interesse de fundar uma nova ciência, de separar a psicologia do tronco das filosofias e da metafísica. Foi o médico, fisiólogo e filósofo alemão Wilhelm Maximilian Wundt(1832-1920), discípulo de Helmholtz quem fez essa guinada decisiva no campo das ciências e fez as contribuições definitivas para que a psicologia fosse finalmente reconhecida como uma ciência independente da filosofia. Entre as contribuições de Wundt podemos citar, principalmente, a fundação do primeiro laboratório de psicologia no Instituto Experimental de Psicologia da Universidade de Leipzig, na Alemanha em 1879, data que marca a gênese e o nascimento da psicologia como o mais novo domínio das ciências. Wundt é historicamente considerado o primeiro psicólogo de todos, sendo um dos pioneiros no que ficou conhecido como a psicologia científico-experimental e dando as contribuições iniciais para o que mais tarde seria a primeira corrente da psicologia: o estruturalismo.

Referências.

JACÓ-VILELA, A. M., FERREIRA, A. A. L., PORTUGAL F. T. (Org). História da psicologia: rumos e percursos. Rio de Janeiro. NAU EDITORA. 2005.

SCHULTZ, Duane P.; SCHULTZ, Sydney Ellen. História da psicologia moderna. 2005.