Via Mangue: uma bela obra de engenharia
Via Mangue: uma bela obra de engenharia
Alexandre Santos*
Em fenômeno nem sempre percebido, as obras de engenharia possuem uma beleza especial e, por isso, mesmo quando se inserem na paisagem do cotidiano e ganham invisibilidade - em fenômeno, de certa forma, injusto àqueles que as conceberam e construíram - permanecem vivas, como se tivessem algum tipo de alma.
Este encanto decorre da beleza, interna e externa, que trazem consigo.
De fato, embora alguns só atinem os fundamentos científicos e tecnológicos que as prendem ao mundo hermético da lógica, as obras de engenharia apresentam formas especiais de beleza, cumprindo padrões estéticos que associam o belo, não apenas à plástica, mas, também, a outros atributos.
A primeira das belezas percebidas nas obras de engenharia (especialmente pelo grande público) é consequência direta dos projetos arquitetônicos e diz respeito ao padrão estético que vincula o Belo àquilo que agrada aos sentidos. Outra dessas belezas, talvez a mais valorizada pelos usuários, está associada aos objetivos que a obra de engenharia cumpre, dizendo, assim, respeito a padrões estéticos que definem o Belo com base na funcionalidade e utilidade das coisas. Nesse caso, quase sempre, a obra de engenharia é alvo da crítica daqueles que dela não se beneficiam diretamente ou que evocam custos de oportunidade para depreciá-la frente a empreendimentos alternativos. De qualquer modo, em muitos casos, independentemente da apresentação plástica, do nível de complexidade ou do objetivo pretendido, a obra de engenharia pode ter beleza associada à excelência técnica, à inovação e ao avanço tecnológico que eventualmente encerrem, estando, portanto, relacionadas a um padrão estético que vincula o Belo àquilo que aproxima o presente do futuro.
Nesta perspectiva, em diferentes graus das diversas expressões do Belo, o Planeta está pontilhado de belíssimas obras de engenharia - umas são bonitas, outras são úteis, outras são futuristas, outras são ousadas e inovadoras e outras são combinações mais largas ou mais estreitas de todas estas características.
Pois bem. Hoje, no Recife, há uma belíssima obra de engenharia. Trata-se da chamada 'Via Mangue', uma via expressa que contribui para a redução dos graves problemas de mobilidade enfrentado pelo trânsito gerado na zona sul da cidade, formada por um conjunto de obras com diferentes níveis de inovação e sofisticação tecnológica articuladas segundo um projeto maior para fazer a transposição da região estuarina do Rio Jordão e Canal do Setúbal pela margem leste, ligando Boa Viagem à Cabanga.
São muitas as técnicas usadas na construção da Via Mangue. Em cerca de cinco quilômetros de comprimento, contabilizando o uso de 80 mil metros de estacas metálicas, 25 mil metros de estacas pré-moldadas, 7.300 toneladas de aço e 56 mil m3 de concreto, a Via Mangue passa por viadutos, via elevada, pontes, alças e obras d'arte alargadas - construções que, isolada ou conjuntamente, são belíssimas obras de engenharia, não só por serem bonitas, mas, também, por serem úteis e modernas. Algumas obras que integram a Via Mangue, como os quatro viadutos de transposição aérea da Avenida Antônio Falcão e a via elevada que atravessa 2.000 metros do chamado Parque dos Manguesais, por exemplo, empregam vigas pré-moldadas ajustadas com uso de treliças lançadeiras. Outras, como o alargamento do viaduto Capitão Temudo, moldam as vigas 'in loco'. Outras, ainda, como as duas pontes sobre braço da Lagoa do Encanta Moça, adotam balanços sucessivos a partir de superestrutura moldada no local. O alargamento da Ponte Paulo Guerra e a construção dos trechos retos da alça que prossegue a Via Mangue, por sua vez, usam o sistema de caixão perdido e a ponte estaiada no trecho curvo da alça da ponte Paulo Guerra será fincada em caixão perdido construído sobre estacas metálicas.
A variedade das obras, sistemas e métodos construtivos concentrada em tão poucos quilômetros de rodovia faz parte da beleza da Via Mangue. Aliás, embora o jargão profissional dos engenheiros não traduza o avanço e a inovação embutida na terminologia técnica, as construções - como os viadutos, a via elevada, os alargamentos de obras d'arte já existentes e a ponte estaiada da Via Mangue - decorrentes das tecnologias bem sucedidas terminam por ostentar a áurea futurista que faz a sua beleza.
A Via Mangue não é apenas uma obra belíssima. É uma obra belíssima construída por empresa e técnicos formados em Pernambuco, com engenharia de ponta praticada em Pernambuco a altura de qualquer outra verificada nos centros mais avançados por todo o Planeta, sendo motivo de orgulho dos engenheiros e do povo pernambucano.
(*) Alexandre Santos é presidente do Clube de Engenharia de Pernambuco