Estratégias para a implantação da silvicultura em propriedades familiares
A política de incentivos fiscais visando à expansão da base florestal na década de 1960, para produção de celulose e energia, apoiava-se em um modelo de reflorestamento que desconsiderava pequenos e médios agricultores. Por isso gerou uma reação de movimentos sociais ligados aos pequenos agricultores familiares e à defesa do meio ambiente.
Tais pressões contribuíram para que algumas empresas incluíssem em seus modos de produção de madeira a prática do fomento florestal. O fomento para produção de madeira para celulose foi, portanto, o embrião dos programas de fomento florestal no Brasil. Ele tem sido aperfeiçoado e, hoje, não se restringe ao setor privado, havendo experiências promovidas pelo setor público IEF - Instituto Estadual de Florestas em Minas Gerais, e por parcerias público-privadas (IEF e Asiflor - Associação das Siderúrgicas para o Fomento Florestal).
Também não se restringe a eucaliptos e pinus, incluindo, atualmente, produtos como seringueira, acácia-negra, pupunha, cedro australiano, dentre outros. O fomento tem ultrapassado o limite da produção econômica e acrescentado em alguns contratos a preocupação com a responsabilidade ambiental – nesse sentido, há empresas florestais associadas a universidades (Universidade Federal de Viçosa; Universidade de São Paulo - USP/Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiróz - Esalq/Laboratório de Ecologia e Restauração Florestal - Lerf), a organizações não governamentais da área ambiental, como a Apremavi - Associação de Preservação do Meio Ambiente e da Vida, e a certificadoras (Imaflora, Sysflor e FSC), visando aumentar as áreas de mata nativa nas propriedades fomentadas e à conscientização dos pequenos proprietários rurais sobre a importância da prática no desenvolvimento sustentável e da conservação do meio ambiente.
O processo inovador do fomento florestal nos permite apontar uma estratégia de futuro, que valoriza o planejamento estratégico (PE), como ferramenta básica, a assistência técnica (Ater), como imprescindível ao sucesso dos empreendimentos fomentados, e a certificação (CE), como garantia de produtos gerados de forma ambiental e socialmente adequada (estratégia Peaterce).
O PE deverá considerar os principais produtos agropecuários e florestais da economia da área foco (comunidade, municípios, consórcios municipais ou Estado) e a pressão de demanda sobre os mesmos. Assim, poderá assegurar a seleção de produtos portadores de sucesso. A inclusão de produtos agropecuários, além dos florestais, se justifica pela necessidade da definição de culturas e atividades pastoris importantes para associação ao componente florestal no estabelecimento de sistemas agroflorestais (SAFs).
Independentemente do tipo de fomento florestal, a Ater é ferramenta importantíssima, uma vez que grande parte dos agricultores ainda conhece pouco das etapas do processo de produção florestal (madeireira e não madeireira) do manejo à comercialização. É, também, importante para auxiliar os produtores fomentados, na adequação operacional da silvicultura de larga escala para a silvicultura de pequena escala.
Os seus agentes devem, portanto, possuir experiência não somente em plantio florestal, mas também em adequação ambiental e legal de propriedades rurais, planejamento de propriedade, manejo de floresta nativa, sistemas integrados e comercialização. Por sua importância, a Ater deverá ser considerada imprescindível e deverá ir além do produto principal fomentado.
É necessário que contemple a elaboração de um plano de utilização das terras (PUT) da propriedade, com base nos princípios de melhor uso das mesmas. Assim, garante-se que a plantação florestal comercial (PFC) não ocupará terras mais adequadas para a produção de alimentos, e, sim, áreas já desmatadas que estejam ociosas, degradadas ou pouco produtivas. Além disso, uma boa Ater assegura que a exploração das florestas nativas em ARL seja feita de forma sustentável.
É importante, também, que, de alguma maneira, ela possa ser garantida ao longo do processo e não somente no primeiro ou nos dois primeiros anos de implantação dos projetos. O PUT deverá ser elaborado pelo produtor, pelo agente de Ater e pelos representantes da atividade de fomento florestal (público, privado ou público-privado), tendo como princípio básico que a PFC é apenas um item da cesta de opções agropecuárias e florestais disponível para a propriedade e não o único.
No caso de fomento a produtos não madeireiros, ele deverá englobar a ARL - Área de Reserva Legal, incluindo, quando necessário, orientações sobre ações de enriquecimento da mesma. Ele também deve valorizar o conceito de uso múltiplo das florestas nativas (ARL) e introduzidas (PFC). Também deve considerar casos especiais em que áreas nobres da propriedade possam ser utilizadas com consórcios agroflorestais de natureza silviagrícola.
Na microvisão, é preciso entender que, para o pequeno e mesmo para o médio produtor, ao contrário dos grandes empresários, a plantação florestal deixa de ser apenas um componente de custo e passa a ser algo cujo valor deve ser maximizado. Assim, ao invés das rotações curtas, deverão ser privilegiados os plantios em monocultivo de uso múltiplo (rotações mais longas) e os sistemas agroflorestais.
De forma ainda mais específica, quando se trata de plantio em pequenas propriedades rurais, deverá ser considerado o uso de clones com maior estabilidade fenotípica e a colocação dos plantios, sempre que possível, no limite da faixa legal protetora das APPs e ARLs utilizando-os como faixa tampão. A certificação, por sua vez, é fundamental, e, graças ao esforço de algumas empresas de base florestal e certificadoras, hoje já se dispõe de um padrão para pequenos empreendimentos de PFC: o Padrão Slimf - Padrão de Certificação FSC para o Manejo Florestal em Pequena Escala e de Baixa Intensidade para Florestas Plantadas. Também existem sistemas de certificação para pequenos projetos de manejo florestal.
Utilizando-se da estratégia Peaterce, certamente os programas de fomento florestal poderão contribuir para o território de sua abrangência ao promoverem ganhos ambientais (redução da pressão sobre os remanescentes nativos; aproveitamento vocacional das áreas disponíveis; redução do efeito estufa; conservação do solo; e redução dos impactos provocados pelo monocultivo extensivo), ganhos sociais (viabilização das pequenas propriedades; geração de emprego e renda; estímulo ao associativismo; e a distribuição de renda com maior equidade) e ganhos econômicos (estímulo ao agronegócio; promoção do desenvolvimento econômico regional com reflexos no IDH; compartilhamento de custos e riscos; aumento de arrecadação tributária dos municípios de sua área de atuação; e estímulo à criação de novas empresas prestadoras de serviço), encaminhando a silvicultura empresarial na direção da sustentabilidade.
Essa estratégia poderá ser o instrumento para a criação de um mercado mais amplo de produtos florestais madeireiros e não madeireiros no Brasil, com ênfase não somente na grande empresa florestal produtora de madeira para celulose e energia, mas também através de consórcios municipais que poderão construir sistemas cooperativos e arranjos produtivos locais.