A máquina e o homem: Quem usa quem?
Há quase cinquenta anos, Lewis Mumford, em seu livro "O Mito da Máquina", previu um futuro sombrio para a humanidade, onde os seres humanos se tornariam passivos e sem objetivos, condicionados pela máquina, programados e controlados para o interesse de organizações despersonalizadas e coletivas. No século XXI, o uso indiscriminado dos dispositivos móveis, demonstra a constatação empírica dessa previsão pouco otimista a cerca do futuro da humanidade. Observa-se que as formas atuais de lidar com esses novos dispositivos levam a um estado de passividade e improdutividade e a um consumismo inconsequente e despropositado.
A máxima do filósofo alemão Arthur Schopenhauer, afirma que o homem oscila continuamente entre a dor e o tédio. Por essa ótica, não surpreende que, a priori, o uso dos aparatos tecnológicos por grande parte da sociedade, tenha procurado o aplacamento da dor ou tédio na busca incessante pela distração e prazer. Sendo esse anestesiamento o foco principal de interesse dos usuários, os novos aparatos tecnológicos perdem grande parte das suas potencialidades, resumindo-se a meros substitutos portáteis de uma televisão ou de um playstation. A adesão de milhares de pessoas ao recente aplicativo para celular "Pokemom Go", demonstra como o usuário em busca de prazer e distração, acaba deixando de usar a ferramenta, para ser usado por ela. Outrossim, os objetivos, geralmente individualistas, que pautam o uso das novas ferramentas, acarretam ainda, numa total falta de comprometimento do usuário com as consequências reais desse uso para saúde coletiva. A troca de celular em perfeito estado de uso por um novo praticamente idêntico gera lixo e gasto de recursos desnecessários. Mas o usuário, motivado pela busca do prazer no status, quer ostentar seu novo modelo doa a quem doer. Invariavelmente, os recursos não são eternos e cedo ou tarde, a conta vai chegar.
O filósofo tcheco Vilém Flusser, afirma que quanto mais complexas se tornam as ferramentas, mais abstratas são suas funções. Sob este viés, a complexidade dos novos aparatos tecnológicos cria necessidade de seus usuários determinarem parâmetros para sua utilização que visem, muito além da distração, abraçar a total potencialidade das novas tecnologias, oficializando-as como ferramentas de transformação social; de interação produtiva; de acesso às novas e diferentes ideias e perspectivas; de criação de novos modelos de vida mais sustentáveis. E esses parâmetros devem também considerar as motivações da compra, substituição e/ou descarte desses aparatos, priorizando o bem estar permanente da coletividade e não, apenas, o bem estar momentâneo do individuo.
Finalmente, faz-se necessário que o usuário mude seu foco e propósito no que tange ao uso das novas tecnologias de informação. Tal mudança ocorrerá em longo prazo e em escala progressiva.
Para impulsiona-la, pode-se investir em campanhas publicitárias de cunho orientativo, que ajudem o usuário a lidar com essas recém-chegadas ferramentas com maior consciência e produtividade. Pode-se, também, investir na criação de plataformas virtuais interativas voltadas para educação, que estimulem o pensamento crítico e a elaboração de projetos. Aos usuários que demonstrem contribuições significativas, podem-se oferecer recompensas como, por exemplo, livros virtuais ou bilhetes de acesso gratuito à eventos culturais como teatro, cinema ou concertos. Assim, estimula-se também a vivência e interação no mundo real, onde de fato podem-se apreender quais são as necessidades mais urgentes da sociedade e assim elaborar perspectivas e futuras soluções.