O montante hipotético-conjetural
Autor: Álvaro Vinícius de Souza Silva
Data: 02/10/2015
No meu artigo “O inabitual como susto: o cético pantomima”, mostro com razoável crítica que, por um apego irrefragável ao método numa dada especialidade, a natureza da experimentação teórica poderá criar obstáculos para situações empíricas que estabeleçam divergências significativas ou consideráveis às previsões básicas de uma dada teoria. Uma tensão epistêmica (tension in episteme), nessa situação, instabilizaria o núcleo de ordenação lógica, a coesão interna que unifica as concepções formais e o método (method). Essa coesão opera a flexão conceitual à vista de um linguagem ou código de interpretação. É por isso que elucidei a diferença entre o raio de atuação teórica da Lei Galileana e as possibilidades experimentais que surgem na descrição física pelo cálculo diferencial no contexto da teoria newtoniana. Destaquei, portanto, as principais consequências entre essas duas abordagens.
Em uma suposição prosaica, haveria a razoável afirmação de que o teste de toda teoria decorreria do exame dos fatos aos quais ela se dirige em seu sistema de relações causais. Poderia, assim, entender os fatos como as "mônadas da observação". Seria, então, uma espécie de realismo sensorial tendente a alguma convicção referencial, pasteurizado em uma dada fórmula de síntese conjetural. Segue-se daí que o problema não aparece essencialmente quando se destina atenção aos fatos, mas no modo com o qual se infere as relações entre os fatos. Isso é deveras óbvio, apesar de trazer uma oportunidade investigativa para recolocar tal problema num patamar fundamental. Com efeito, no verdadeiro espírito de experimentação científica, aponta-se para um processo dialético entre as noções causais provisórias e a matéria factual da qual se extrai a correspondência positiva. Em cada etapa desse processo, organizam-se as confirmações empíricas que são adquiridas pela perspectiva indutiva. Como se trata de um encadeamento de sucessivas incorporações e reorganizações teóricas, isto é, num acúmulo de explicação (ex plicare) cada vez mais delineado pelos aspectos formais, defino esse processo de montante hipotético-conjetural, por meio do qual ocorreria um "saldo" de previsões satisfatórias na elaboração da teoria que, quando já atende aos requisitos de uma dada experiência, ganha um "salto qualitativo" capaz de gerar uma aparência final. Se atualmente o engessamento metodológico do "cético pantomima" bloqueia distintos paradigmas no âmbito acadêmico, esse problema estaria intimamente relacionado à unilateralidade desse montante hipotético-conjetural, o qual já se afastou totalmente da precisão dialética entre o exame dos fatos e os princípios lógicos inicialmente tomados.
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