Tecnologias, um artigo informal
* A escritora Tânia Orsi Vargas fez um questionamento na rede social Facebook. Aqui está a minha participação.
Todo cuidado é pouco ao se tocar nessa contenda de livro e tecnologias mais modernas. Todo! Minha vida, desde bem pequenina, girou e ainda gira em torno de livros e cadernos; quadro negro e quadro verde; lápis, borracha e lapiseira, etc. Sou professora e filha de professora. Preciso dizer mais? Desde a minha mais tenra idade amo livros, revistas, papeis. Tanto ganhei, quanto dei, utilizei e ainda ganho, recebo e utilizo livros e tudo o mais que relacionei, além de outros materiais.
Vivi uma época de rejeição ao computador e ao mundo digital... que pena! Sim, que pena para mim. Que lástima! Perdi tanto tempo e construção de conhecimento, acalentei preconceitos infundados e, pior, muito pior, falei mal de algo sobre o que nada sabia, nada havia experimentado. Que vergonha sinto de ter me comportado assim.
Leio tantas coisas sobre esse tema e também lamento pela pequenez de argumentos falsificados sobre as tecnologias modernas. Estou cansada de ler e ouvir frases que falam repetidamente sobre todas as qualidades do livro de papel (e essas qualidades são verdadeiras). O que não é verdadeiro e nem lógico é essa atitude antipática contra o novo mundo tecnológico. Explico.
Vivi uma época em que livros estavam ao alcance de uma minoria e eu fazia parte dela. Entretanto, eu não entendia como algo feito de papel pudesse custar os olhos da cara e os da alma. Eu não entendia porque eu tinha livros e outros queriam tanto e não podiam ter. Alcancei também o momento da COLTED quando livros, dicionários e outros materiais didáticos se tornaram mais acessíveis. Pois logo a turma do contra afirmava que esses materiais não eram tão bons quanto os comprados em livrarias caras. Fui coordenadora do Programa do Livro Didático e vi novamente as pessoas dizerem que livro bom era o livro da escola da rede particular. Trabalhei com o Programa Salas de Leitura e só faltaram dizer que os autores daqueles livros não eram aqueles anunciados nas capas dos livros. Tantas outras ignorâncias vi ao longo de toda a minha vida. E pude compreender que o negócio mesmo era impedir que uma parcela significativa da população brasileira não dispusesse de meios para aprender a ler, escrever, vencer na vida pessoal e nem na profissional. Essa gente deveria servir apenas para a escravidão. Era assim o mundo que vi e ainda vejo.
As pessoas não querem receber dinheiro fora da data marcada, não querem perder tempo em filas de bancos, não querem andar de carroças ou charretes, não querem se abanar com leques, não querem soprar no fundo de um ferro de engomar, não querem viajar para um estado vizinho de trem ou de ônibus. Não querem mais comprar um Fusca. Nem sequer pensar em lavar roupas nas lavanderias rústicas, feitas com tijolos e cimento. Tantas outras coisas as pessoas não querem mais.
Observo pais de famílias ricas adquirindo tablets, smartphones e outros objetos da moderna tecnologia para os seus filhos e, mais, fazem questão de se exibir e de dizer que a criança já nasceu programada, antenada. Observo que essas mesmas famílias não gostam que o governo distribua laptops aos alunos de escolas públicas, alegando que a rede não suporta, que o aluno não aprende, que isto e que aquilo. Mas, nas escolas particulares, reina a tecnologia de ponta. Sabem por quê? Porque tanto as escolas quanto os pais sabem que o mundo moderno fala a linguagem digital, que sem ela o indivíduo está perdido numa selva fechada. Sabem os pais da classe média remediada que seus filhos não poderão trabalhar sem que saibam usar um computador e todas as ferramentas de que esse objeto maravilhoso dispõe.
Por falar nisto, soube nesta semana de uma faculdade em que os professores estão exigindo que os acadêmicos façam seus trabalhos escrevendo no papel, do próprio punho. Poxa vida! Isto é pior do que o retorno ao obscurantismo. Será que esses professores universitários querem agora ser alfabetizadores à moda antiga? O que será isto?????????? Estamos em uma época e temos que viver de acordo com ela. Dou o exemplo que li em uma reportagem que afirma que mais de quarenta estados da América do Norte não têm mais as aulas de caligrafia e que os alunos são alfabetizados digitalmente. Isto é uma maravilha!
Estas considerações que teço não se põem contra o livro de papel, de forma alguma! É impossível entender, por exemplo, quais razões movem professores titulados a exigirem o livro de papel quando esse mesmo livro está disponível online. Impossível compreender que tantos que se arvoram inteligentes não saibam sobre os Recursos Educacionais Abertos. Difícil compreender também como pode alguém querer ler um livro de duzentas páginas para localizar determinada passagem de interesse a uma pesquisa se o Word localiza imediatamente o que for solicitado. Como posso aceitar que alguém se dê ao trabalho e à perda de precioso tempo (Time is money!) só pra dizer que valoriza o livro de papel. Ora ora, não sejamos tão falsos.
Li certa feita que Bill Gates disse a seguinte frase: “Meus filhos terão computadores, sim, mas antes terão livros”. Eu não sei onde Bill Gates mora, mas assim mesmo acredito na boa intenção dele. Aliás, faz algum tempo que ele disse a frase. Talvez até tenha mudado de ideia, quem sabe?
Ninguém quer rasgar e nem dar fim aos livros. Não se deixa de ser romântico porque chegou o modernismo. Aquele pessoal que comprava livros caros e que via defeito em tudo, quer agora que os pobres fiquem fora da realidade, da leitura do mundo moderno, é isto mesmo.Todos gostam dos livros de papel, claro. Só que o reinado deles agora é dividido (e eles perderam bastante terreno) e ponto final.
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Aqui insiro o texto e o link para a matéria sobre a questão da caligrafia nos Estados Unidos da América do Norte:
Sociedade
Educação
Estados americanos abolem escrita à mão nas escolas (Disponível em: http://www.cartacapital.com.br/sociedade/novos-tempo)
A nova norma aprovada em Indiana recomenda aos professores não dar ênfase na aprendizagem da letra cursiva, mas sim à digitação em teclados
por Ricardo Carvalho — publicado 25/07/2011 10:10, última modificação 26/07/2011 13:03
O estado norte-americano de Indiana, seguindo uma tendência de mais de 40 estados do país, aboliu a exigência do ensino de letra cursiva em suas escolas.
A nova norma recomenda aos professores não dar ênfase na aprendizagem da letra cursiva – escrita manuscrita em que as letras são arredondadas e ligadas umas às outras pelas pontas – e focar em outras habilidades, como a digitação de textos em teclados. Desse modo, os educadores norte-americanos conferem menos importância à prática de caligrafia, algo que sempre foi tradição no país. Na prática, a norma significa o desestimulo ao trabalho de uma das formas da escrita à mão – e mantém-se a exigência do ensino da letra de forma (também chamada de "imprensa"), o que acarreta na diminuição do tempo gasto com a aprendizagem da forma manuscrita.
A medida adotada por Indiana é um reflexo do crescente peso das novas tecnologias na sala de aula. Os responsáveis por sua adoção creem que o uso cada vez mais frequente pelos alunos de computadores torna desnecessário que a criança concentre esforços na forma cursiva.
Trata-se, também, de um reflexo de algo que já é uma realidade em muitas escolas norte-americanas. De acordo com o jornal Valor Econômico, pesquisas nacionais mostram que 90% dos professores da 1ª a 3ª série gastam apenas uma hora por semana para o desenvolvimento da escrita à mão.
A nova norma gerou polêmica tanto entre educadores norte-americanos quanto brasileiros. “Não há perda propriamente da aprendizagem escolar (ao abandonar-se o ensino da letra cursiva), mas sim na aprendizagem para a vida social: o da escrita para comunicações pessoais, bilhetes, listas de compras, atividades que a escrita com lápis e papel resolve mais rapidamente, preservando a intimidade da comunicação”, afirma Magda Becker Soares, professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais.
A opinião é partilhada por Artur Gomes de Morais, professor titular do Centro de Educação da Universidade Federal de Pernambuco. “Saber escrever à mão é parte da noção que construímos, nos últimos séculos, de ser humano civilizado. Ser capaz de escrever de próprio punho e ser capaz de usar tecnologias antigas como a caneta ou o lápis continua sendo parte importante na definição de cidadão alfabetizado e letrado”, diz. Ele também destaca que escrever à mão, com letra cursiva, é um símbolo de diferenciação. “Na França, por exemplo, uma carta de recomendação escrita à mão tem um valor simbólico muito maior que o mesmo texto digitado e apenas assinado”.
Os dois educadores também concordam que uma medida semelhante seria impensável para a realidade brasileira. Em primeiro lugar, pelo fato de aqui as novas tecnologias da comunicação ainda não estarem inseridas nas salas de aula do mesmo modo que nos Estados Unidos. Além do mais, historicamente o Brasil e os Estados Uniram se distanciaram da maneira como abordam a alfabetização e o letramento de seus alunos. Até os anos 80, havia grande ênfase também no Brasil ao ensino da leitura e escrita pela letra cursiva, principalmente com a prática da caligrafia.
“Desde então, temos avançado numa frente mais importante. Em lugar de investir muito tempo em treino caligráfico ou coisas afins, despertamos para algo mais fundamental: o papel da escola é formar cidadãos capazes de compreender os textos escritos que circulam na sociedade. Hoje, é quase consenso que, mesmo aos seis anos, é preciso alfabetizar letrando”.
Para isso, diz o professor, os alunos precisam saber ler todos os tipos de letra, seja a cursiva ou a de imprensa (presente nos teclados). “Como alfabetizar letrando ensina também ensinar a escrever, as crianças precisam a escrever conforme o gênero textual. Se vou fazer uma carta, por exemplo, posso usar a letra cursiva”, conclui.
Para Artur Gomes de Morais, esse abandono da escrita à mão nos EUA é reflexo de uma tendência no país de separar, na etapa da alfabetização, o ensino da leitura e o ensino da escrita. “Lá existe uma mentalidade, a meu ver questionável, de que primeiro a criança aprenderia a ler e depois a escrever. Felizmente isso não ocorre no Brasil, porque do ponto de vista cognitivo essa dicotomia não existe”, afirma.
“A mente do aprendiz, para aprender a ler, precisa aprender como as letras funcionam e precisa juntar mentalmente as letras. Ora, poder escrever, seja do próprio punho, seja teclando, é o ato de materializar a produção da escrita, tomar a decisão sobre que letras pôr, etc...”