Relatividade

Em 1905, Einstein fez a maior revolução conceitual que o mundo já viu: a teoria da relatividade . Com ela, Einstein propunha uma alteração radical em toda a visão de mundo da época; tudo, todas as coisas passavam a ser vistas de maneira diferente da anterior.

Há uma suposição generalizada de que tal façanha só pode ser conseguida através de uma extrema genialidade. Não negarei esse fato, embora acredite que o grande mérito de Einstein, no caso, não tenha sido tanto a genialidade, quanto a coragem.

De fato, a relatividade decorre de uma constatação muito simples, quase banal: existe uma incompatibilidade entre a mecânica clássica e o eletromagnetismo, fato notório que pode ser reconhecido por qualquer estudante secundarista. A referida incompatibilidade decorre da diferença entre a definição newtoniana de movimento, sempre uma relação direta entre a posição de um corpo e a de um observador, e a definição eletromagnética, na qual o espaço entre observador e objeto é mediado pela presença de um meio, no qual as perturbações se propagam. Desse modo, as transformações newtonianas diferem das eletromagnéticas, conforme o descrito na fórmula que quantifica o efeito Doppler.

O significado de uma "transformação" pode ser ilustrado por um programa de computador utilizado pela TV Globo durante a transmissão de partidas de futebol, que transforma a imagem para mostrar diversos pontos de vista da mesma cena; por exemplo: a visão do batedor de falta, do goleiro, do juiz e do bandeirinha, em um mesmo lance, a batida de uma falta. O conhecido programa é capaz de transformar o ponto de vista de alguém situado em um local, para o de outra pessoa, situado em outro, executando assim uma transformação espacial, meramente geométrica.

Podem-se efetuar outros tipos de transformações, incluindo aquelas que mostram a visão de pessoas que se movem, umas relativamente a outras. É exatamente nesses casos que a mecânica e o eletromagnetismo clássicos se revelam incompatíveis. A interpretação literal dessa incompatibilidade acarretaria a dissociação do mundo mecânico com o eletromagnético, ou seja, a admissão de duas realidades distintas e incompatíveis, um absurdo como o seguinte:

Quando um jogador bate uma falta, a bola pode entrar no gol, ou ir para fora. Caso a bola entre no gol, nenhuma transformação, nenhum ponto de vista, pode mostrar a bola indo para fora. Talvez o juiz consiga ver a bola entrando mais claramente que o bandeirinha, que talvez tenha sua visão eclipsada pela presença de jogadores entre ele e a bola, de qualquer forma, nenhum dos presentes poderá ver a bola que entrou no gol tendo ido para fora.

As diferentes transformações, no entanto, permitiriam exatamente esse tipo de absurdo, como se o mundo mecânico pudesse ser realmente diferente do eletromagnéticos , e os gols pudessem acontecer apenas eu um mundo, e não em outro.

A constatação desse absurdo estava exposta muito claramente, as vistas de qualquer um que conhecesse as bases de ambas as teorias, ensinadas em cursos escolares, e a genialidade de Einstein consistiu apenas em reconhecer o óbvio: existe apenas um mundo, que não pode ser descrito por duas maneiras antagônicas. Tendo escolhido um dos modos de descrever o mundo (o eletromagnético), restava apenas aplicar a lógica e com ela extrair as consequências da escolha realizada. A tarefa não chega a ser difícil, embora tremendamente, brutalmente corajosa!

A coragem tende a ser fartamente menosprezada pelos que tentam compreender a ciência, assim como as diversas atividades humanas, um erro. Creio que o grande mérito de Einstein consistiu exatamente em seu destemor, na coragem extrema de assumir o mais completo absurdo, em negar o que era reconhecido por todos.

A relatividade pressupõe que as transformações mecânicas propostas por Newton estejam equivocadas, negando assim o conhecimento aprendido e ensinado por todos os físicos da época, uma enorme heresia. Tal petulância costuma ser paga com escárnio, talvez com ódio. E necessária uma enorme coragem para propor e sustentar um absurdo diferente daquele ensinado pelos sábios de qualquer época.

Esse foi o grande mérito de Einstein, sustentar intrepidamente uma ideia diferente daquela defendida por todos os sábios da época.