TOTAL DEPENDÊNCIA
 

 
Durante muitos anos eu tentei resistir à tecnologia, mas não foi possível. Eu não sei como consegui viver mais de 30 anos sem celular. Eu, que achava que a maior invenção do homem era a caneta BIC...
 
Lembram das canetas Parker, à tinta? Eu tinha o maior orgulho de ter uma, pois na escola onde eu estudava, quem tinha uma caneta daquela era mais inteligente. Que saudade dos tempos do fogão à lenha, da panela de ferro, do meu radinho de pilha e de minha bicicleta Monark...
 
Hoje eu me considero um dependente sem chance de cura, pois não tenho nenhum apoio na causa. O problema é que sou obrigado a conviver com a tecnologia, mesmo quando ela não me satisfaz. É verdade. Eu tinha uma TV convencional com uma imagem espetacular, mas fui obrigado a trocá-la por uma digital e ver aquelas imagens fantasmas, pois as transmissões de TV no Brasil ainda não são compatíveis com os equipamentos atuais. Fiz a troca porque não aguentava mais ouvir meus filhos dizendo: "Caraca, pai!  Troca este trambolho. Aqui no condomínio só a gente ainda usa isto!".
 
E o celular? Comecei a me envolver com esta droga nos anos 90, quando apareceram os primeiros celulares. Lembram? Nunca mais eu tive paz. Hoje eu tenho até vergonha de usar o meu celular em reuniões, pois são tantas as tecnologias de receber uma mensagem que eu me vejo mais longe de Deus, pois achei que podia alcançá-lo através de algum artifício cibernético ou tecnológico. Não dá... Com Deus a coisa é bem mais embaixo - ou acima...
... O mais difícil é acompanhar as mudanças, pois quando você acaba de ler aqueles manuais com mais de 300 páginas, aparece outro com novos recursos. E o mal causado pela tecnologia?! Vou relatar meu drama em detalhes sórdidos:
 
Dia desses fui usar o celular de minha filha, para fazer uma ligação. Acabei fotografando por engano os meus tímpanos na opção FOTOGRAFIA... Quando vi a foto, descobri que o meu ouvido estava cheio de cera. Ao comentar o fato com uma amiga médica, ela resolveu dar uma olhada. Foi aí que começou o meu problema. Usando de suas técnicas profissionais, meteu o dedo no meu ouvido e empurrou toda cera lá pra dentro. Lá se foi mais de 50 anos de “virgindade ótica”.
 
Eu, que tinha apenas séculos de cera no ouvido, pois jamais tinha usado o cotonete neste buraco, fiquei surdo e com uma dor insuportável. Como era sexta-feira e não encontramos esses deuses nos finais de semana, fiquei até segunda no sofrimento...
 
E para explicar pra médica o ocorrido?
 
Começou com ela perguntando: “O que houve?”.
 
- “O problema é exatamente este, doutora. Desde lado não ouço mais nada. Acho que perdi a virgindade do meu ouvido”.
 
Ela pegou uma luneta, que enxerga até o cérebro e disse:
 
- “Estranho! Parece que enfiaram alguma coisa no ouvido do senhor!”.
 
Claro que enfiaram! Mas como dizer a ela que foi um cuidado feminino?! Será que ela entenderia as razões que levaram a tal atitude? Preferi manter o meu silêncio...
 
Depois de usar aquele jato que joga água até os miolos, voltei a ouvir novamente do prejudicado orifício. Ao final dos exames, ela disse:
 
- “Seu Luiz, seja lá o que foi que aconteceu, tenha mais cuidado na próxima vez!”.
 
Estão pensando o quê?... Quem tem buraco, tem medo...