'V-8' - Uma paixão 'acelerante'.
Nasci há quase sessenta anos atrás (cinquenta e oito, para ser exato) e, creio que minha mãe tenha aplicado em mim, quando ainda um bebê, graxa de rolamentos para assadura e gasolina azul (será que ainda existe?) como lavanda.
Cresci no meios de porcas (não as suínas) e parafusos. Arruelas e ferramentas diversas. Poderia, com plena certeza, identificar um motor de automóvel somente pelo seu ronco e acertar o número de cilindros que ele portasse, sem necessidade de abrir o capô.
Meu filho mais velho diz sempre: - 'meu pai é capaz de identificar a marca de qualquer carro através de um simples pedaço de sua lataria'.
Exageros à parte, não me é difícil identificá-los mesmo. Para quem passou boa parte da infância e juventude embaixo, em cima, dentro, fora, enfim, rodeando estas belas máquinas, é muito natural que eu tenha um pouco de 'super égo' e me sinta orgulhoso por isso.
Meu primeiro automóvel, foi um 'Cadillac Eldorado 1953', quando ainda nem havia completado dezoito anos e, também, sem a 'carta' de motorista, que só era expedida aos maiores de dezoito anos mas, a vontade de ter um carro era maior e incontrolável. O modelo, de duas portas, conversível, equipado com câmbio 'Hydra-Matic' de três velocidades à frente, motor de oito cilindros em 'vê' com 331 pol.³, de 5,4 litros e 210 cv. O torque eram brutos 45 kgfm, tudo isso alimentado por um carburador quádruplo, que levava a máquina de mais de duas toneladas aos 180 km/h.
Os bancos, inteiriços - dianteiros -, eram ajustados em sua distância manualmente. Os vidros das portas e das laterias, eram de acionamento elétrico - que nunca apresentaram falhas. Os grandes pneus 'balão' com largas faixas brancas, eram complemento de beleza com as calotas exclusivas de aço polido - algumas até do tipo 'raiadas'.
Uma das novidades daquela época foi a transmissão automática (não muito bem aceita por nós que, apesar de bastante resistente, não inspirava a confiança nos 'chofeurs' da época que optavam sempre pelo câmbio mecânico e que para outros motoristas, era algo complicado por não ter um pedal de embreagem.
Na minha opinião, o câmbio automático é mais simples e melhor controlável. Basta tão somente ser cuidadoso.
A outra novidade seria a direção assistida hidraulicamente - ficava mais leve e macia. As manobras com o carro parado pareciam uma 'pluma' e não exigiam o esfôrço de uma direção mecânica.
Além do ar condicionado - de fábrica -, havia um sistema de 'ôlho eletrônico' sobre o painel que, à noite, ao detectar um farol em sentido contrário, transformava a luz alta do farol para baixa, evitando o ofuscamento ao outro motorista. Isso tudo no início da década de 1950.
Foram momentos memoráveis e de muitas alegrias, eu e o meu belíssimo Cadillac conversível, que tive de vender por não ter uma garagem para guardá-lo.
O tempo passou e eu cresci. Já, depois de casado e morando aqui no interior da Bahia, iniciei a minha coleção 'sequencial' de 'banheiras' consumidoras de combustíveis. Primeiro foi um Dodge Chrager R/T que, por ter um motor quase 'muscle car', não me permitia um consumo mais economico - fazia exatos 5km/l na estrada a 100 km/h.
Seu motor era um vê oito de 215 hp's - mascarados pois, na minha opinião ele 'despachava' mesmo uns 245 hp's - câmbio mecânico de quatro marchas à frente mas, um pouco duro na suspensão, devido ao apelo esportivo.
Desfiz-me dele pois, o 'custo benefício' não estava adequado à atual situação econômica do Brasil - isso lá pelos idos da década de 1970 -, quando o governo militar ditava as ordens políticas e administrativas e o preço da gasolina estava lá pelas alturas - ainda hoje está.
Demorei-me em ter um novo carro e iniciei um 'namoro' com um Landau da Ford. Estávamos no ano de 1985 e adquirí um modelo LTD, do ano de 1978, mecânico que, só era diferente do Landau pela janela vigia mais larga - igual às do Galaxie.
Todas as aplicações de conforto como direção hidráulica, ar condicionado, estofamento em camurça, tapetes de 'buclê' menos os vidros das portas que eram acionados por maçanetas - foi assim até o fim de sua produção em 1983 mas, que eram compensados pelo extremo conforto e o silêncio interior, mesmo que em alta velocidade.
O seu rodar macio não era prejudicado mesmo em pisos irregulares ou de calçamento. A suspensão independente com molas espirais no eixo dianteiro e oscilante no traseiro, não permitia abalos ou solavancos nem na direção.
Equipado com um motor de oito cilindros em vê de 302 pol³ com 199 cv, poderia vir com transmissão hidráulica de três velocidades à frente e era tão dócil ao ser dirigido, tendo sido considerado o melhor automóvel de luxo que o Brasil produziu e, não fazia feio para os seus similares americanos - Cadillac's e Lincoln's.
Seu motor equipou alguns Mustangs americanos e os famosos Mavericks V-8 nacionais, peça de desejo de muitos apaixonados e colecionadores brasileiros.
A história do Galaxie teve início em 1967 e, ao longo de sua produção que se encerrou no início de 1983, quando apenas 125 unidades foram fabricadas, quatro modelos foram oferecidos: Galaxie 500, LTD, Landau e 'Standard'. Este último tinha construção espartana e atenderia aos profissionais de taxis e era despojado de direção hidráulica, ar condicionado, relógio, rádio e acendedor de cigarros.
Sua forração era em vinil nos painéis das portas e bancos e os carpetes eram mais simples.
O primeiro motor foi um 272 pol³ de 164 hp's, passando pelos conhecidos 292, 296, até chegar ao 302 que teve uma versão à álcool.
Ainda muito procurado por 'fanáticos' e apaixonados - assim como eu -, estes quase raros exemplares tem uma forte cotação no mercado de veículos usados e podem, facilmente atingirem a cifra de R$ 40 mil ou mais, dependendo do estado de originalidade e conservação.
Não é um carro de apelo esportivo, sendo considerado como automóvel de 'tiozinho' mas, que é bom, isso é.
De minha coleção 'sequencial', já tive cinco exemplares e estou à cata do sexto exemplar. O que me falta, no momento, é o dinheiro pois, o glamour e o bom gosto, isso eu tenho de sobra. E agora, já tenho uma garagem.