Conclusão: Sobre as postagens de C&T.

*Hildebrando Souza Menezes Filho

Como todos devem ter percebido o trabalho colocado aqui para ser debatido a quem interessar, fez parte de minha dissertação de mestrado em fevereiro de 2001 e que recebeu honra e mérito da UnB, sendo o único dos 18 mestrandos a ter esse reconhecimento pela Banca Examinadora e depois em jantar com o reitor da UnB Lauro Mohry, o Professor Cristovam Buarque e José Aleixo Secretário Nacional da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência - SBPC

Assim me manifestei ao final de 180 páginas com o título:

Relatos e reflexões sobre o sistema de informações do CNPq numa sociedade democrática – Dissertação de Mestrado – Brasília fevereiro de 2001.

Coloquei aqui apenas um sumário do que considerei pertinente para debate porque o restante é mais de interesse interno e estratégico da área de C&T.

Assim me posicionei ao final do trabalho...

CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES FINAIS

Não há no CNPq uma estratégia de ação que pense em renovação dos recursos humanos e da criação de grupos emergentes. Da análise dos dados constantes nas tabelas de bolsas contrapostas aos dados dos currículos Lattes, encontram-se resultados intrigantes quanto à queda nos números de distribuição de bolsas e, o que é pior, quanto à formação de quadros para a pesquisa (apoio concreto à pesquisa) que pelo menos estimule o crescimento como foi pensado há 35 anos. A hipótese levantada na análise dos gráficos e tabelas Lattes sobre o “envelhecimento” da comunidade científica é algo inquietador.

A Plataforma Lattes é uma idéia viável, mas pode também vir a cair no esquecimento, ou logo ser desmontada como tantos outros programas o foram, caso o CNPq não trabalhe os números e preocupe-se apenas em servir aos grupos de excelência instalados na região Sudeste. O vinho da adega já está virando vinagre e é preciso que outros degustem, tenham acesso ao “néctar dos deuses” e possam fomentar outras safras.

Considera-se relevante a tentativa de fornecer algumas diretrizes básicas para ordenamento das ações de C&T, tomando-se como referência a busca da articulação entre as agências de C&T. Não esquecendo antes de citar o conceito que Herrera (1978) tem de projeto nacional que “compreende o projeto do grupo ou classe que tem o controle da situação em determinado momento, do tipo de sociedade que se quer construir”.*

Estas diretrizes são as seguintes:

1) Sistema de Financiamento

Há a necessidade de expansão da base de pesquisa com a geração e difusão do conhecimento aplicado para o desenvolvimento econômico e social do país. A pluralidade das agências federais de financiamento à C&T poderão adequar seus orçamentos para evitar duplicidades e melhor direcionar seus recursos tendo, na Plataforma Lattes, um referencial importante para troca dessas informações.

O CNPq é responsável pelo fomento à pesquisa, devendo introduzir como prática habitual o acompanhamento e avaliação desse fomento, indicando em seus projetos aprovados um percentual (por exemplo, de 1%) para fazer face às despesas com uma equipe interna e externa de avaliação.

Tem-se conhecimento de que não há uma única técnica de avaliação perfeita e que as avaliações mais conseqüentes e profundas devem ser baseadas em vários procedimentos complementares, sendo necessário o desenvolvimento de indicadores compatíveis à realidade brasileira para o processamento de uma avaliação adequada e legítima.

O componente de C&T poderá privilegiar sua integração às ações públicas e privadas,visando à solução dos problemas sociais, ampliando a massa crítica dos servidores e pesquisadores e a infra-estrutura básica para a pesquisa, com indução de projetos em áreas estratégicas, harmonizadas ao atendimento dos projetos de “balcão” (também chamados de demanda espontânea, ou universal).

Nota:.

* Cf. Herrera., in: S.F. Gomes e R.C. Cerqueira Leite (ed.) Ciência, Tecnologia e Independência, Liv. Duas Cidades, SP, 1978.

Sobre essa mesma questão, também Cassiolato (1982) diz que

(...) “obteve-se um razoável sucesso na montagem de uma infra-estrutura científico - tecnológica, mas pouco se conseguiu em termos de uma real utilização dos resultados dos investimentos em C&T. Novas alianças, técnicas e políticas se fazem necessárias,

(...) além de um exato entendimento das demandas locais, para que a sociedade brasileira possa vir a se beneficiar dos resultados desses investimentos ( ...)”.

A Abipti, por exemplo, poderia ser uma das instituições com a qual se fizesse uma articulação mais permanente, chamando também à parceria as academias, associações de classe e outras entidades afins.

Cumpre relembrar também os ensinamentos contidos no tema 6 (seis) do Debate Nacional numa Sociedade Democrática (1986), que pressupunha que para alcançar-se o papel necessário das várias instâncias executoras de uma política ampla de C&T era (e continua sendo hoje) imprescindível a definição da administração dos recursos públicos com total transparência.

É, então, necessária uma divulgação sistemática clara e ampla das prioridades, critérios, compromissos, avaliações, elenco de projetos apoiados e por apoiar inserindo as condições de escolha dos ad hoc ou colegiados, fazendo com que o público em geral fique ciente dos procedimentos de apoio à C&T.

2) Ampliação da Base de Pesquisa

O apoio à pesquisa básica deverá ser mantido e ampliado, com liberdade de escolha dos temas, mas com a exigência de trabalhos de qualidade. O mesmo estímulo à realização da pesquisa aplicada em áreas mais carentes da população, engajando-a num projeto de cidadania, usando-se bolsistas de iniciação tecnológica, num projeto integrado à associação de moradores, por exemplo, para que a ciência e a tecnologia sejam vistas, sentidas como algo fundamental na vida das pessoas.

Outra importante colocação, essa feita no Relatório Geral do Debate (1986), é a que o respaldo comunitário aos planos de C&T só virá à medida que o segmento social, (constituído dos próprios pesquisadores) receber efetiva valorização e dignidade pelo seu trabalho, o que apenas pequena parcela da elite científica já usufrui. Essa, então, é uma justa aspiração, sem a qual não será possível atingir a credibilidade indispensável para que a comunidade científica atinja níveis satisfatórios de desempenho e atenção aos interesses sociais através de políticas de C&T.

3) Cultura de Acompanhamento e Avaliação (A&A) no CNPq

Considera-se fundamental criar uma cultura de A&A como ferramenta permanente do processo de apoio público à pesquisa científica e tecnológica. Sugere-se que se possa concentrar a avaliação nos processos de gestão e tomada de decisões visando intervenções para criação de programas públicos específicos, ou até mesmo o resgate de alguns que no curso da história da C&T foram desaparecendo.

Para tanto, é necessário fazer um cruzamento dos recursos aplicados ao longo do tempo para planejar as ações de fomento. Como está o CNPq formando os seus recursos humanos?

Onde está o seu planejamento para que daqui a 20 anos não se constate que mais uma vez omitiu-se em aplicar recursos na formação de uma base de pesquisa para enfrentar os desafios sociais, científicos, tecnológicos, econômicos e culturais do século que nasce? E não vai faltar gente porque o CNPq corrigiu 20 anos antes o curso da história, o que não fez nesses 20 anos passados, deixando que sua massa crítica envelhecesse, ficasse com anorexia mental.

4) Processo decisório do CNPq

Concebe-se a perspectiva de que as estatísticas e indicadores subsidiarão o processo decisório do CNPq e demais instituições participantes, com destaque para a gestão institucional, seu planejamento e desenvolvimento de ações programadas, que redundarão no fortalecimento das atividades de execução de pesquisas.

Informação é poder e as agências de C&T crescerão em eficiência à proporção que as condições de acesso às informações forem adequadas, eficientes e eficazes, permitindo, assim, efetiva transparência das ações do setor de C&T.

Uma importante recomendação foi dada no Debate Nacional (1986), de que seria necessário rever os (...) “mecanismos de representação dos cidadãos junto ao Estado, e este rever sua relação com a sociedade para deixar de ser o Estado que administre em benefício de minorias de privilegiados e passar a administrar em proveito da maioria.

Seria necessário superar o nível da retórica de participação e realmente, procurar estabelecer pontes de representação dos interesses da sociedade civil”**.

Segundo Paula (1999), é necessário responder às seguintes indagações: “Como são definidas as principais áreas do conhecimento dentro do CNPq? Qual a integração do Conselho Deliberativo com as demais instâncias decisórias? Quais as conseqüências do CNPq estar participando de diversos Conselhos? Conselho de Ciência e Tecnologia (CCT), por exemplo. Qual é a integração intra-institucional?”

A resposta a essas perguntas pressupõe uma riquíssima discussão, iniciada nos Seminários no CDS/UnB, e que antecedem a articulação com as outras agências de fomento.

Na questão da articulação propriamente dita, o desejável é que haja entre as próprias agências de C&T e destas com os demais organismos públicos, o estabelecimento de prioridades claras, precisas, com trocas permanentes de informações, acesso fácil e desburocratização no processo de interação e implementação dos programas de C&T.

Outras questões colocadas por Paula*** (1999) dizem respeito aos resultados dos esforços realizados anteriormente, como por exemplo: "Conferência Nacional de Saúde”.

“A Área de Saúde do CNPq está usando os critérios oriundos dos documentos produzidos durante o evento? Que repercussão isso acarretou para as esferas estaduais, regionais e federais da área de Saúde? E discussões realizadas nos outros programas do CNPq?

Agronegócio, por exemplo?”.

No texto denominado “Política e Políticas Públicas”, de Salomão e Rua, distribuído no mestrado do CDS/UnB, encontrou-se a descrição de algumas precondições para que haja uma implementação perfeita de políticas públicas. São elas: “As circunstâncias externas à agência implementadora não devem impor restrições que as desvirtuem;

Nota:

**. Cf. Ciência, Tecnologia e o Futuro da Sociedade Brasileira - Tema 1 - páginas 92-93, do Debate Nacional Ciência e Tecnologia numa Sociedade Democrática.

***. Maria Carlota de Souza Paula - Professora de Mestrado do Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília/CDS-UnB, da Disciplina de Planejamento e Gestão de C&T. Doutora em Políticas Públicas e uma das autoras dos termos de referência do debate nacional de C&T numa sociedade democrática.

# o programa deve dispor de tempo e recursos suficientes;

# não apenas as disponibilidades globais de recursos de todos os títulos devem ser suficientes, mas também, em cada estágio da implementação, a combinação necessária de recursos deve estar efetivamente disponível;

# a política a ser implementada deve ser baseada numa teoria adequada sobre a relação entre causa (de um problema) e o efeito (de uma solução que está sendo proposta);

# esta relação entre causa e efeito deve ser direta e, se houver fatores intervenientes, estes devem ser mínimos e bem conhecidos;

# deve haver uma só agência implementadora, que não depende de outras agências para ter sucesso; se outras agências estiverem envolvidas, a relação de dependência deverá ser mínima em importância;

# deve haver completa compreensão e consenso quanto aos objetivos a serem atingidos e esta condição deve permanecer durante todo o processo de implementação;

# ao avançar em direção aos objetivos acordados, deve ser possível especificar, com detalhes completos e em seqüência perfeita, as tarefas a serem realizadas por cada participante;

# é necessário que haja perfeita comunicação e coordenação entre os vários elementos envolvidos no programa;

# os atores que exercem posições de comando devem ser capazes de obter efetiva obediência dos seus comandados.” .

No Seminário de Políticas Públicas "Como Fazer Acontecer", realizado no CNPq (22/11/99), fizeram-se referências a essa questão, colocada pelo expositor Carlos Américo Pacheco (secretário executivo do MCT) e pelo debatedor Cristovam Buarque, ao se referirem à questão do “para quem?” como sendo um pré-requisito do “como fazer” ciência e tecnologia. Há outra pergunta importante que pode-se fazer “para que”?

O expositor falou da “horizontalidade” das ações de C&T, que perpassam todas as dimensões das políticas públicas. O debatedor insistiu na tese de que essa abrangência recaia em políticas específicas para combate a erradicação da fome no Brasil, priorizando o mercado interno, no lugar das exportações de produtos. O enfoque das prioridades deve recair, então, nos processos de produção, muito mais do que nos produtos.

Nota

**** Cf. Rua, Maria das Graças e Salomão, Luiz Alfredo. Essa referência foi apresentada a este autor em sala de aula, em texto de mimeo sem outras indicações de data e título.

Salomão e Rua citam quatro variáveis fundamentais que devem ser observadas:

# a natureza da política não pode admitir ambigüidades;

# os elos da cadeia na estrutura de implementação devem ser no menor número possível, fortes e articulados;

# a prevenção contra interferências externas;

# o controle sobre os atores envolvidos na implementação. {208}.

Para essas questões colocadas neste trabalho, e que estão ligadas intimamente à democracia e a popularização da ciência, reservaram-se algumas palavras***** que sintetizam toda uma vida e o esforço desenvolvido para referendar a peregrinação visando atingir-se o sentimento de perfeita identidade com a cidadania:

“(...) A massa de trabalhadores brasileiros terá recuperado a cidadania quando de fato tiver a possibilidade real do acesso igual à educação, à cultura, à saúde, à moradia, à justiça e ao lazer. Isto significa empreender um esforço, tanto a nível de Estado quanto dos agentes produtivos, para que se alcance não só reais melhorias nos padrões de renda, de consumo e de acesso aos benefícios dos bens materiais e simbólicos para todos os cidadãos, mas também reconhecer como reais parceiros e interlocutores os amplos setores da população e suas organizações legítimas.”

O que é fundamental e necessário ainda dizer para finalizar, é que o autor não tem solução ou respostas prontas para apresentar. O que se procurou fazer aqui foi um exercício cheio de aspirações, utopias e buscas para reencontrar a memória do CNPq e instigar a participação, a resistência perdida nos subterrâneos da vida da instituição.

Procurou-se também vislumbrar as possibilidades de encontrar-se novas formas de Pensar a instituição para confrontar o conhecimento adquirido com o que está no inconsciente coletivo, na sua cultura, na sua forma de pensar esse ato de conhecer, para ir trocando as certezas por perplexidades, como primeiro passo para enfrentar o olhar especializado sobre essa realidade, onde poucos saboreiam seus frutos de forma dinâmica, complexa, prazerosa, porém excludente do resto da sociedade que desconhece o que seja o valor dessa fruta proibida pela teologia científica e tecnológica dos incluídos.

Nota:

*****. Cf. Tema 1 - Ciência e Tecnologia e o Futuro da Sociedade Brasileira., in: Debate Nacional Ciência e Tecnologia numa Sociedade Democrática. O reordenamento social interno, página 93.

Há muita “gaveta conceitual” nascida do pensamento acadêmico, que suspeita-se seja de um lado, proibitiva de acesso às camadas menos formadas e informadas da sociedade, e de outro lado cumpre que este autor não deixe morrer a chama, o fomento, os gravetos que acenderam a sua alma inquieta por organizar essa desordem do saber disciplinar.

(...)”Sem pretender reduzir o homem à dimensão cognitiva, desde esta perspectiva, poderia se dizer que um ser humano é um polo de construção de significados. As diversas experiências, estímulos, informações e interação com seus semelhantes não só são processadas pelo indivíduo, mas, à medida que elas ganham sentido, significado, vão constituindo um de seus aspectos essenciais ( Lazarte, 2.000:47).

Encontrar motivação, buscar objetivos claros, interagir sempre, criar condições, buscar com tenacidade o saber, o conhecimento, pelos caminhos multi/inter/trans/disciplinar, democráticos, transparentes, é de essencial importância para a vida de qualquer cidadão.

Neste trabalho tentou-se inferir algumas análises e proposições resultantes dos estudos de caso, remetendo à perspectiva da necessidade inadiável de assimilação e conscientização dos problemas da ciência e da tecnologia, há muito diagnosticados, da esperança que a sua popularização atinja a todos os segmentos da sociedade.

Quem sabe não poder-se-á continuar procurando noutras jornadas, lá na frente, a consecução desse objetivo? Porque o desafio das reflexões históricas e dos relatos das ações globais e locais é necessário para o avanço da ciência, da tecnologia e da qualidade de vida em nosso meio.

(...) “Marx considerava que o desenvolvimento das forças produtivas conduziria à superação do capitalismo. Essa tese continua válida. Mas o saldo do movimento socialista de um século e meio aponta que o avanço social também está relacionado com a conquista da democracia. Só ela assegura avanços permanentes. (...) É com tranqüilidade e segurança que vejo o presente para divisar o futuro. Com a esperança e o otimismo na continuação da batalha pelo socialismo (...).”

Marx apud Coelho apud Menezes F.º(2001) .

Este autor envia um grande e comovido abraço aos colegas, professores e amigos da Rede Hildenet e do Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília. Fevereiro/2001... E agora aos membros do Grupo Política e Sociedade do Mural dos Escritores e os participantes do Recanto das Letras.

*Hildebrando Souza Menezes Filho

É aprendiz de poeta e mestre em desenvolvimento sustentável da UnB

Navegando Amor
Enviado por Navegando Amor em 29/05/2010
Reeditado em 29/05/2010
Código do texto: T2286635