“Rede Hildenet” – Primeira parte
*Hildebrando Souza Menezes Filho
Esta experiência, plena de dificuldades, erros e acertos, nasceu das incursões deste cidadão no esforço de colaborar na popularização da ciência e da tecnologia, através da Internet.
No ambiente social hoje vivenciado no Brasil, constata-se a manipulação e controle da mídia por parte dos grandes grupos econômicos.
Na tentativa de romper com este cerco, mantivemos um intenso esforço de comunicação - via Internet - com diversos segmentos sociais, mas principalmente com o pessoal envolvido em C&T, na abordagem e popularização de temas desta área/setor.
Utilizou-se, desde 1998, do mesmo princípio filosófico idealizado por Betinho (IBASE/CONSEA), na época da Campanha Contra a Fome a Miséria e Pela Vida, que pretendia diminuir as desigualdades sociais através da mobilização popular, usando também de análises políticas, econômicas e culturais da realidade brasileira.
Foram cerca de dois mil e quinhentos E-mails emitidos, mais de 1.000 megabytes de memória de recepção e envio de mensagens para centenas de pessoas. Muitos desses “interlocutores” são jornalistas, professores universitários, estudantes, sindicalistas, políticos, empresários, religiosos, pessoas comuns, cidadãos da sociedade civil organizada.
É uma lista reduzida, porém uma importante amostragem de pessoas formadoras e multiplicadoras de opinião, que preenchem um pequeno universo, escolhido aleatoriamente, para permuta de idéias e correspondências, tanto no País quanto no exterior.
A totalidade desse esforço foi realizado no “laboratório” privado(hjuca@solar.com.br; já desativado) da Itautec-Pentium133, com o intuito, como já se afirmou, de melhorar em quantidade e qualidade as informações e a comunicação entre as pessoas interessadas nessa rede.
Desse conjunto de e-mails, disponível também em disquetes, selecionou-se 100 para amostragem. Outros 100, também selecionados, dizem respeito à Plataforma Lattes e foram coletados na intranet do CNPq. Os emails serviram de base para a pesquisa. e como comprovação do esforço despendido e referência dos assuntos abordados.
No início da construção da “Rede Hildenet (Nome criado pelo Professor Cristovam Buarque), este cidadão ainda não havia sido selecionado para o Mestrado da UnB e, portanto, a técnica, o conhecimento, os argumentos que se utilizava eram limitados e próprios de um aprendiz de computação e de redação provocativa.
O número de pedidos de remoção da lista de distribuição era, então expressivo. No decorrer do tempo as desistências de participação foram caindo e, num processo inverso, diversos pedidos de entrada, de inúmeras outras pessoas indicadas pelos próprios participantes, foram se registrando.
Inicialmente, a emissão de mensagens às caixas de correio eletrônico foi idealizada como uma espécie de militância política, contestadora dessa realidade perversa da manipulação da nossa mente pelos meios tradicionais de comunicação de rádio e TV.
Foi crescendo no propósito de conseguir adesões, tendo como característica principal o exercício da cidadania. A intenção não era só transmitir informação, mas de buscar colaboradores para formação de um grupo permanente de coletores e distribuidores interagindo entre si.
Percebeu-se, aos poucos, que esta prática "incomodava" porque era revestida de conteúdo, transmitindo uma enorme carga de informações, sem ser dirigida a um assunto específico.
A diferença entre enviar uma correspondência pelo correio comum e pela Internet é, sem duvida, a de custo da emissão de cartas que, no correio estatal são maiores que as os impulsos telefônicos. Além disso, e talvez principalmente, a velocidade da informação que circula pela Internet é muito superior à de outros meios de comunicação escrita.
Acresça-se a isto o fator de mobilização e de aprendizado ativo que a rede de comunicação possibilita, realizando-se em fração de segundos, estimulando espantosa criatividade, aumentando o poder de raciocínio e ampliando-se, em conseqüência a difusão do conhecimento e a participação popular no processo de aprendizagem compreensiva.
A burocracia começa a ter que amoldar-se ao cidadão e não o contrário.
É óbvio que os tecnocratas da informática tornaram-se censores do sistema. No entanto, a alienação repressora é vencida e convencida pela argumentação educativa, já que o processo acaba gerando outros procedimentos para comportar a demanda que os e-mails provocaram.
O valor da ciência e da tecnologia ganha transparência junto à grupos organizados. Os partidos políticos, com a colaboração da “Rede Hildenet”, ampliam a democratização da informação e passam a ter uma visão que desconheciam, ou mudam a visão das atividades da ciência, do seu significado, seus desvios bizarros, dos seus benefícios, das suas possibilidades de interação com a população, fazendo com que a cidadania ganhe novas adesões.
O pensamento desenvolvido não é o de acumulação e reprodução de capitais, mas do saber com toda a sua riqueza e dimensão sócio - cultural. A ciência e a tecnologia tem provado que nos momentos de crise cresce em sua força e resistência ao perverso sucateamento de suas instituições. É preciso que essas forças ressurjam e ajudem a enfrentar os desafios que lhe são impostos nos dias de hoje.
Que se faça ressurgir das cinzas, qual fênix, uma nova estratégia de luta, onde os sindicatos incorporem, no seu discurso, novas demandas para construção de novos e mais baratos padrões de habitação, transporte de massa, saneamento básico, saúde pública, medicina social, no desenvolvimento de fármacos, na melhoria do meio ambiente e na segurança do trabalho. Essas são apenas algumas das possibilidades de melhoria da qualidade de vida que a tecnologia pode propiciar.
O aluno de mestrado da UnB, Roberto Toledo Neder (2000), escreveu artigo com interessantes comentários sobre comunicação, num hipotético Governo Democrático e Popular para nosso País:
(...) “ um contraponto se daria em ofertar uma TV e rádio populares, a partir da aquisição de emissoras” (muito embora ele não tivesse a intenção de explicitar as estratégias de compra, de forma gradual e sistemática, por todo o país). O intuito seria de formar, ao longo de algumas décadas, uma rede de informação que levasse à população carente brasileira, mais informação de qualidade e voltada para seus interesses, sem perder de vista o perfil de entretenimento e de lazer que representam a televisão e o rádio”. (...) (Neder, 2.000)
Interessante mencionar que várias das mensagens recebidas e retransmitidas pela “Rede Hildenet”, possui essa mesma perspectiva apontada por Neder(2.000), e que um dos maiores divulgadores dessa idéia assim se expressou: (...) “este é um serviço da Rede de Informações para o Terceiro Setor- Rits - democratizar as informações para democratizar a sociedade.
O espírito de iniciativas desse tipo, além do exercício da cidadania, é também o de uma programatização para o enfrentamento da fome e da miséria, como foi proposto no Conselho de Segurança Alimentar - CONSEA: criar-se rede imaginativa e agradável, que possa captar o que de melhor sai na imprensa diária, inclusive a de rádio e na TV, com assuntos como os direitos da cidadania, auto estima dos participantes, propondo, ao mesmo tempo, maior interação com os cidadãos nas decisões sobre orçamento e obras públicas e, sobretudo, com cobranças às lideranças locais.
Ilustrando, foi assim que, de forma enfática e incisiva, a “Rede Hildenet” se posicionou publicamente, exigindo a cassação do Senador Luiz Estevão, quando parecia que o corporativismo dos senadores acabaria por prevalecer.
O reflexo dessa mobilização ampliou a participação popular
no tocante aos interesses da coletividade, numa espécie de
defesa da moralidade, sem um discurso moralista ou partidário, mas que reforçava o exercício da ética na política, com a valorização do próprio poder legislativo.
Neder (2.000), no artigo citado imediatamente acima e entregue para análise dos seus colegas de mestrado, na UnB, afirmou também que “as questões filosóficas e éticas do jornalismo profissional jamais poderão ser abandonadas” para que os programas de qualidade, que atendam aos anseios populares e que tragam assuntos nunca vistos/ouvidos pelos pobres, sejam discutidos e explicados nos seus porquês.
Esta seria uma grande contribuição para formação e democratização da sociedade. Uma pergunta pertinente e oportuna é também colocada pelo autor: “Alguém já viu programa de rádio ou de TV que discuta os problemas do pobre e excluído, sem oportunismo?”
O fato é que as reivindicações das camadas populares não têm girado em torno de assuntos como ciência e tecnologia. Apenas os partidos de oposição ao atual sistema neoliberal é que têm tido essa compreensão transformadora.
Ainda assim, com limitações e sem penetração popular. Nem no horário eleitoral gratuito se percebe um discurso favorável à C&T. O apoio se faz perceber, de forma explícita, nas emendas orçamentárias de parlamentares oposicionistas ao governo e, mesmo assim, pelo alto espírito público aguçado de alguns poucos.
Como justificar esses recursos para C&T se a comunidade científica está fechada em nichos? Muitas vezes os próprios programas sociais sofrem cortes diante da priorização de pagamentos a contratos com bancos internacionais?
Vários são os processos e formas de participação popular e de definição de políticas públicas em C&T com possibilidade de multiplicação e conscientização. É, necessário, no entanto, vontade política e interesse na mobilização popular em níveis local, regional, nacional e até mesmo internacional. Nossa abordagem continua no próximo artigo onde detalharemos melhor todo o processo empreendido.
*Hildebrando Souza Menezes Filho
É aprendiz de poeta e mestre de desenvolvimento sustentável da UnB
“Rede Hildenet” – Primeira parte