Precisamos falar sobre o Felipe Neto

Se você espera ler nesse texto um ataque gratuito a imagem do Felipe Neto ou reprodução de acusações infundadas, desculpe, não me prestaria a um papel desses! Eu não sou inscrito do canal dele. É um programa voltado ao público infantil, com vídeos de reação, memes, curiosidades e jogos etc. Traduzindo, não é para mim. Logo, nada tenho a dizer sobre seu conteúdo infantil.

No que diz respeito às suas redes sociais, vejo quase sempre crítica aos seus posicionamentos políticos. Felipe Neto é um crítico do Estado. Foi muito aguerrido contra a gestão da presidenta Dilma Rousseff (PT). Nesse momento, poderíamos dizer que ele era um “queridinho” da extrema-direita, tão carente de jovens lideranças midiáticas. Tinha gente que o seguia apenas para ver suas críticas ao governo PTista.

As Jornadas de Junho (2013) somada ao Golpe jurídico-parlamentar que culminou no impeachment da então presidenta Dilma Rousseff (2015-2016) permitiram que as vozes do baixo-clero da política ecoassem nas ruas do Brasil. O Movimento Passe Livre (MPL), mais alinhado ao anarquismo do que há partidos políticos, arrefeceu e cedeu espaço para o Movimento Brasil Livre (MBL), nada mais que um conjunto de lideranças artificiais da extrema-direita movidos a bombas midiáticas e guerrilha digital neoliberal.

Nesse cenário de agitação social, crises econômicas e políticas sucessivas culminaram na ascensão de um partido que tem muitos postulantes da extrema-direita, o PSL. Ganharam as últimas eleições uma grande massa de ultracapitalistas, neoconservadores, fundamentalistas cristãos, militaristas, intolerantes religiosos, olavistas, enfim, uma série de gente que só mesmo a liberal democracia para dar vez e voz.

Tendo um incompetente como Chefe de Estado e uma grande massa de ministros acéfalos — muitos com formação duvidosa ou inexistente —, o Brasil se viu mergulhado em uma de suas maiores crises da história com a chegada da pandemia de COVID-19. De todas as desgraças que nos poderia acontecer, uma pandemia era o pior cenário. Se o governo já era uma sucessão de crises e escândalos, piorou à enésima potência.

Qualquer pessoa em sã consciência se tornaria crítico de um governo desses. Porque o Felipe Neto que já tinha uma consciência crítica em relação a nossa política seria diferente? Ele passou a criticar não apenas o presidente, mas também os apoiadores do governo Jair “não sou Messias” Bolsonaro. O ápice disso foi a participação de Felipe Neto no edital do The New York Times, onde ele faz severas críticas ao presidente estadunidense Donald Thump, e depois ao próprio Bolsonaro. Ou seja, comprou briga com cachorros grandes... e loucos.

A sucessão de fake news, falsas acusações, notícias malucas, discursos insanos, declarações ilógicas e todo tipo de barbaridade que você possa imaginar foi usada para incriminar o youtuber. Dentre as mais pesadas, a acusação de que ele seria “pedófilo” ou teria feito “apologia à pedofilia”. Mas o que motivou essa caça ao Felipe nas redes sociais? Porque ele incomoda tanto a extrema-direita brasileira?

Não falarei aqui como um advogado do Felipe Neto, não tenho vocação para isso. Nem agirei aqui como um cientista política, sou graduando de outra área de Humanas. Não vou apelar a discursos ideológicos desse ou daquele lado. Ao contrário, quero apenas que você esteja aberto a ouvir um novo ponto de vista. Use apenas a sua consciência crítica — se ela não tiver sido abduzida por alguma teoria da conspiração.

Não existe nenhuma acusação formal contra o Felipe Neto. Repetindo, o youtuber não foi acusado em lugar algum contra quaisquer crimes ou atos infracionais em relação a pedofilia, ou seja, até que alguém prove ao contrário, essas acusações são falsas. Não há inquérito aberto contra o Felipe Neto, no entanto, ele sim deve ter feito muitos boletins de ocorrência contra esses propagadores de mentiras nas últimas semanas.

O objetivo do presidente Bolsonaro e suas milícias digitais é manchar a imagem do Felipe para diminuir os pesos de suas críticas ou denúncias. O youtuber é uma grande ameaça política ao clã Bolsonaro. O canal Felipe Neto tinha até a escrita desse texto 39 milhões de inscritos, somando desde a criação do canal em 2006 cerca de 10.199.183.452 visualizações. Ele tem um grande poder de comunicação. E seu público é o infantil e infanto-juvenil, ou seja, os eleitores do futuro.

Acusá-lo de pedofilia ou apologia à pedofilia é jogar sujo, mas tem sua eficiência. Como dito, seu público é composto majoritariamente por crianças. Os pais vão começar a ficar preocupados e vão julgar precipitadamente. É muito difícil depois desse clima alarmista e especulativo as pessoas pararem para procurar comprovação dos fatos. Não temos cultura digital suficiente para buscar provas e contraprovas de fatos.

A coisa fica ainda pior quando bastiões imorais da moralidade se acham no direito de perseguir e agredir o youtuber, ou seja, fazer injustiça com as próprias mãos. Para se ter uma ideia, um homem autointitulado o “Guerreiro de Bolsonaro” nas redes sociais, e não contente com a disseminação de fake news, alugou um carro de som, foi até a entrada do condomínio onde o Felipe Neto mora, o acusou e o ameaçou. Algo mais perigoso para a integridade física e moral do Felipe do que ridículo para a já longa lista de imbecilidades dos bolsonaristas.

Esse mesmo templário dos tempos modernos, o tal “Guerreiro de Bolsonaro”, posta fotos ostentando armas em ameaça ao Felipe Neto ao lado de foto de crianças nas redes sociais. Pera aí, mas isso não é apologia à criminalidade? Isso de certo modo não é expor crianças a conteúdos violentos? Onde está a censura dos moralistas puritanos cristãos? Desde quando alguém que porta armas e ameaça as pessoas pela internet é alguém que nos transmite alguma segurança? Já reparou que a grande maioria dos apoiadores de Bolsonaro são pessoas que apontam armas contra inocentes? Tá tudo errado aí!

Mas porque ser tão baixo a ponto de acusar alguém levianamente de um crime tão hediondo? Caro leitor ou leitora, entenda uma coisa, alguém que faz arminha com os dedos em Marcha pra Jesus, promove aglomerações em períodos de pandemia, tem um manual de tortura como livro de cabeceira, não faria muito pelo Brasil. E o que mais me irrita, 57,8 milhões de brasileiros, ou seja, 55,13% do povo brasileiro se vê reconhecido nos ideias e posturas desse homem, e de seus apoiadores políticos. Para piorar, ele já lidera algumas pesquisas de intenção de voto com 30%, cedo eu sei, mas já me preocupa.

Bolsonaro, na última eleição, só perdeu em votos no Nordeste, 69,7% dos nordestinos votaram em Fernando Haddad (PT), 30,3% foram para Bolsonaro. O que mostra que os nordestinos ainda têm um pouco de vergonha, visto que o clã Bolsonaro odeia os nordestinos, e consciência, pois só teríamos a perder com essa adesão. Inclusive, os investimentos no Nordeste caíram muito desde sua subida ao Planalto.

Defender suas ideias e criticar seus opositores é algo natural, razoável e até necessário. Mas quando isso é feito de modo desonesto, mesquinho, acrítico, sensacionalista, extremista e messiânico, a democracia vai desfalecendo para nunca mais acordar. Estamos em um período absurdista, ou melhor, louco mesmo, veja só: Olavo de Carvalho e Nando Moura começaram a criticar e acusar Bolsonaro; a militância da extrema-direita é liderada, pasmem, por um ex-feminista, a Sarah Winter; os bolsonaristas “defendem” a democracia, mas pedem intervenção militar!; todos falam de liberdade de expressão para atacar as instituições públicas e defender os atos hediondos desse governo, mas querem criminalizar o comunismo; em meio a pandemia, o presidente Bolsonaro correu atrás de uma ema com uma caixa de cloroquina no gramado do Palácio da Alvorada; o Ministério da Saúde reforça o uso de um medicamento que não funciona contra a doença, e para completar, o laboratório do Exército aumentou 80 vezes, ou seja, de 250.000 comprimidos, agora temos 1,2 milhões de comprimidos de cloroquina que só os bolsonaristas vão tomar; nem vou falar da política internacional, é uma vergonha e seria um perda de tempo.

Se você é pai ou mãe, e está preocupado com o conteúdo que seu filho consome na internet, mais que justo. Aliás, é uma das suas obrigações acompanhar os passos dele(s) nas redes sociais, ninguém mandou você fazer filho. Você assumiu uma grande responsabilidade que vai te acompanhar pelo restante de sua vida. Mas não faça julgamento por especulações. Saiba com quem seus filhos conversam nas redes, quais sites frequenta, que canais ele assiste, em que grupos ele entrou etc. isso não é vigilância, porque você será participe, essa atitude é uma precaução de segurança, logo, um ato de amor. Despois de tomar ciência, e decidindo que o conteúdo é nocivo, impeça o máximo possível o acesso dele a esses lugares daninhos da internet. Se muitos pais fizessem isso ao invés de assistir a filmes pornôs e procurar parceiros extraconjugais no Tinder, talvez as crianças ficassem menos indefesas.

Outra coisa que me preocupa nesse fato é: todo mundo que crítica Bolsonaro é criminoso? É comunista? É de esquerda? O mundo se resume a dois termos: “nós” e “eles”. Como não deixaria de ser, o “nós” sempre está correto. Se toda pessoa que estiver na oposição ao atual presidente for tachada como criminoso, o Brasil vai deixar de ser uma nação de cidadãos republicanos e passaremos a ser uma nação de presidiários. Isso é uma falta de percepção da realidade que dói os tímpanos quando se ouvi, e fere os olhos quando se lê. Traduzindo, é ridículo. Mas os brasileiros são ridículos por natureza, uma ridicularidade a mais ou a menos não faz diferença.

Caliel Alves
Enviado por Caliel Alves em 03/08/2020
Código do texto: T7024956
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