SOBRE PESQUISAS.... ETNOGRAFIA E OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE
A pesquisa social pode ser amparada por métodos quantitativos ou qualitativos. Aqui, nesse comentário, a ênfase será o registro de dados relativos à investigação científica através da pesquisa qualitativa.
Enquanto as pesquisas de cunho quantitativo de maneira geral seguem um rigor metodológico e costumam agregar funções matemáticas e instrumental estatístico para a análise de dados, os levantamentos que optam pelo viés qualitativo normalmente são direcionados, ao longo da sua realização, para a obtenção de dados descritivos, captados a partir do contato direto com o público observado.
O assunto é amplo, mas aqui nos limitaremos ao exercício e ao registro de informações, detalhes e impressões em torno do que se apresenta no primeiro capítulo da obra "Etnografia e Observação Participante", de Michael Angrosino (2009, 138 p.; Artmed Editora).
Na verdade, o livro pode ser considerado um manual sobre o fazer etnográfico. A obra é composta de uma introdução e nove capítulos, onde o autor aponta, de forma didática, os caminhos para que estudantes ou pesquisadores possam ser bem sucedidos nesse formato de pesquisa de coleta de dados.
É preciso registrar que, embora bastante parecidas, etnografia se diferencia de observação participante. Da mesma forma que as duas também diferem da participação observante, do estudo de caso e da observação não participante ou não intrusiva (p. 57-58). Cada uma tem características específicas, embora sejam pesquisas exploratórias.
Já no início do livro o autor explica: “Muito do que se sabe sobre relações de campo, sobre abertura e direcionamento rumo a um campo e seus membros, sabe-se através da pesquisa etnográfica. Embora ela seja estreitamente ligada ao método da observação participante, tenha sido baseada nele ou talvez mais recentemente o tenha substituído, a etnografia sempre incluiu vários métodos de coleta de dados” (Angrosino; p. 13).
O que aprender
O autor divide esse primeiro capítulo, “Etnografia e Observação Participante” (p. 15-34), que tem o mesmo título do livro, em oito itens. E procura destrincha-los didaticamente: “Uma breve história da pesquisa etnográfica” (p. 16-17), “Teorias da cultura e pesquisa etnográfica – Funcionalismo, Interacionismo Simbólico, Feminismo, Marxismo, Etnometodologia, Teoria Crítica, Estudos Culturais, Pós-Modernismo” (p. 17-30); “Etnografia: princípios básicos” (p. 30), “Definições” (p. 30-31), “Etnografia como método” (p. 31), “Etnografia como produto” (p. 32-33), “A Observação Participante como estilo e contexto” (p. 33-34) e “Pontos-chave” (p. 34), seguido de uma sugestão de leituras complementares.
A etnografia (etno = pessoas + grafia = escrever) é uma especialidade da Antropologia e refere-se, resumidamente, aos estudos e escritos científicos sobre determinados grupos de pessoas. Segundo Angrosino (2009), “etnografia significa literalmente a descrição de um povo (...), lida com gente no sentido coletivo da palavra, e não com indivíduos” (Angrosino, p.16).
Na última página desse capítulo ele dá a definição de etnografia: “um método de pesquisa que busca definir padrões previsíveis de comportamento de grupo (...), baseada em trabalho de campo, personalizada, multifatorial, de longo prazo, indutiva, dialógica e holística” (p. 34).
Esse método de coleta de dados envolve a participação direta do pesquisador no local do levantamento das informações, sejam elas hábitos, vestimentas, modos de falar, comportamentos ou atividades comuns do universo pesquisado. Esse método requer longa permanência do pesquisador no local investigado, além de sensibilidade para a observação dos pequenos detalhes.
A Observação Participante é uma abordagem de observação etnográfica na qual, o pesquisador participante tem um papel de destaque, porque ele não é apenas um mero observador. Torna-se parte da comunidade observada e com ela interage e partilha o cotidiano. O período de observação é longo, mas pode ser inferior ao registrado na pesquisa etnográfica.
Nesse tipo de pesquisa se faz necessário eliminar conceitos pré-estabelecidos e subjetividades. O observador deve-se ater a observar, escutar e registrar, tendo em vista que a sua principal característica é “descrever detalhes do modo mais objetivo possível, evitando interpretações e inferências, e pondo de lado os próprios preconceitos” (Angrosino, p. 61).
Ao longo da sua dissertação sobre o tema, mais à frente, em outros capítulos da obra, Angrosino cita as habilidades que precisam constar no repertório de todo pesquisador de campo (p. 56-71) e as diversas formas e tipos de participação e envolvimento (ou não envolvimento) do observador (p. 74-77).
O início
Angrosino explica que os estudos etnográficos tiveram início em fins do século XIX e início do século XX (p.16). Segundo ele, os pesquisadores perceberam a necessidade de começar a entender a sociedade através das especulações acadêmicas dos sociólogos.
Pesquisadores britânicos como Bronisław Malinowski e Alfred Radcliffe-Brown – considerados os mais influentes da escola britânica - caracterizaram-se como antropólogos sociais, pois direcionaram os seus estudos etnográficos para a compreensão de instituições duradouras da sociedade. “A partir da Inglaterra (...) pesquisadores desenvolveram uma forma inicial de pesquisa etnográfica. Ela refletia o seu trabalho de campo em áreas ainda então sob o controle colonial, tais como as sociedades da África ou no Pacífico que pareciam estar preservadas em suas formas tradicionais (...) Os britânicos, portanto, enfatizaram um estudo das instituições duradouras da sociedade; este procedimento veio a ser chamado de antropologia social” (Angrosino, p. 16).
Já nos Estados Unidos, antropólogos como Franz Boas voltaram os seus estudos para a antropologia cultural. Suas observações foram direcionadas para o entendimento dos modos de vida dos índios norte-americanos “cujos modos de vida tradicionais já haviam sido drasticamente alterados” (Angrosino, p. 16). Dessa forma, a antropologia norte-americana foi classificada e passou a ser chamada antropologia cultural.
De acordo com o autor, Malinowski e Franz Boas eram defensores da pesquisa de campo, que ficou conhecida como a Observação Participante (p. 17). Essa técnica foi amplamente utilizada por Frank Hamilton Cushing, durante o estudo do povo Zuni (nativos do Novo México) nos meados do século XIX.