Parte III - Quem mexeu no meu queijo? Mensagens no labirinto, a coragem de Haw na perspectiva aristotélica.
Mensagens no labirinto, a coragem de Haw na perspectiva aristotélica.
No ponto de vista aristotélico, tanto o medo quanto a bravura não são virtudes, ao dizer “é com uma finalidade nobre que o homem bravo age e suporta conforme lhe aponta a coragem” (1991, p. 8), Aristóteles mostra que, em sua perspectiva, a coragem serve de bússola que indica quais situações devem ser enfrentadas com bravura e quais devem ser enfrentadas com cautela ou resignação. Estes aspectos da virtude de Aristóteles podem ser vistos conforme acompanhamos Haw no percurso pelo desconhecido labirinto. No início da sua solitária jornada, Haw percebeu que suas crenças estavam paralisando sua ação ao questionar o porquê de não ter iniciado a procura pelo queijo antes. Durante uma epifania, o duende teve a ideia de escrever seus aprendizados nas paredes do novo percurso do labirinto para ajudar Hem, caso ele mudasse de ideia e decidisse seguir a mesma jornada.
A primeira mensagem que Haw escreveu no labirinto foi: “o que você faria se não tivesse medo?”. Esta mensagem foi escrita após Haw vencer sua preocupação inicial de esperar por mais tempo no mesmo local do labirinto, o duende também notou pela primeira vez as consequências físicas da falta de queijo quando começou a caminhar mais lentamente, o que tornou mais dificultosa sua caminhada pelo labirinto. Após os sinais de fraqueza corporal, Haw pensou que independente do momento, o importante é começar sua jornada e jurou a si mesmo que frente à semelhante situação teria uma postura diferente e adaptaria-se às mudanças mais rapidamente.
Mais à frente, o duende viu-se perdido nos corredores do labirinto e questionou por um momento se de fato valia a pena realizar toda essa jornada, rindo de si próprio em seguida dando seguimento à busca, manteve o tempo todo seu objetivo em mente para não desviar dele, “estava assumindo o controle, em vez de simplesmente deixar que as coisas lhe acontecessem” (1998, p. 21). Ao notar que a mudança só o pegou de surpresa por não ter observado com clareza o que estava acontecendo ao seu redor, Haw escreveu a segunda frase na parede do labirinto: “cheire o queijo com frequência para saber se está ficando velho”.
Sem alimento, Haw sentiu sua força física abandonar seu corpo e, perdido, sentiu o medo de não sobreviver à procura do novo queijo, pensou em Hem e que se estivesse em casa com o amigo, ao menos teria companhia, mesmo que a fome o matasse. Perguntando novamente a si mesmo o que faria se não sentisse medo, o duende foi surpreendido pelo forte medo de seguir sozinho e mais uma vez pensou se seu amigo teria criado coragem para realizar sua jornada. Perdido em seus pensamentos, ele escreveu uma nova frase em outra parede do labirinto: “o movimento em uma nova direção ajuda-o a encontrar um novo queijo” e assim ele fez, fortalecido pelas lembranças das vezes que se sentiu bem estando no labirinto.
A seguir, confrontado novamente pelo medo de haver perigo escondido nos corredores, Haw foi tomado por pensamentos de situações ruins que poderiam acontecer com ele no labirinto. Quando finalmente acalmou seus pensamentos, escreveu, na parede, sua quarta frase: “quando você vence seu medo, sente-se livre”. Constantemente, ele perguntava a si mesmo o que faria se não tivesse medo, este hábito foi a chave para gostar cada vez mais da sua jornada.
Para tornar as coisas ainda melhores, Haw começou a pintar um quadro em sua mente. Ele se viu em grandes detalhes, sentado no meio de uma pilha de todos os seus queijos favoritos – de Velveeta a Brie! Viu-se comendo os muitos queijos de que gostava, e gostou do que viu. Então imaginou o quanto apreciaria todos os seus ótimos sabores. Quanto mais claramente ele via a imagem do Novo Queijo, mais real se tornava, e mais sentia que iria encontrá-lo (Spencer Johnson, M. D., 1998, p. 23).
Deste ponto da narrativa, é possível notar que o medo foi um dos obstáculos a ser vencido na jornada pelo queijo, sendo necessário que Haw utilize a coragem para superar seu temor. É importante lembrar que Aristóteles diz que a virtude da coragem encontra-se no meio-termo entre a covardia e a bravura. Num fragmento da sua obra “ética a Nicomaco” (1991, p. 7) o filósofo aborda a diferença entre medo, coragem e bravura da seguinte forma: “ora, nós tememos todos os males, como o desprezo, a pobreza, a doença, a falta de amigos, a morte; mas não se pensa que a bravura se relacione com todos eles, pois que temer certas coisas é até justo e nobre, e vil o não se arrecear delas”. A seguir, fica notável que Haw entendeu o poder de criação da sua mente.
Além disso, Haw percebeu que sua mente pode criar medos ou soluções a depender do direcionamento que ele daria ao pensamento. Assim, sua próxima frase foi a seguinte: “imaginar-me saboreando o novo queijo, antes mesmo de encontrá-lo, conduz-me a ele” e rapidamente correu pelo labirinto sendo surpreendido por pequenos pedaços de um queijo novo próximo à entrada.
Faminto, o duende deliciou-se com o novo queijo sentindo sua força recuperada e guardou alguns pedaços em seu bolso para o restante da jornada. Saciado, pensou em Hem e decidiu verificar se o amigo estava pronto para seguir a jornada com ele, mas antes de voltar escreveu na parede: “quanto mais rápido você se esquece do velho queijo, mais rápido encontra um novo” e seguiu rumo à sua casa onde encontrou Hem.
Haw ofereceu o novo queijo a Hem, mas foi surpreendido pela reação do amigo ao ouvir que não sabia se gostaria do novo queijo e que estava acostumado com o velho. Hem optou por suas antigas crenças, mesmo depois do seu amigo desbravar todo o desconhecido labirinto, o que significa que preferiu morrer com seus medos e preocupações que a nobre atitude de enfrentar a momentânea dor causada pela mudança, que, no ponto de vista de Aristóteles, seria atitude do indivíduo corajoso.
Pois, a coragem é um meio-termo no tocante às coisas que inspiram confiança ou medo, nas circunstâncias que descrevemos; e o homem corajoso escolhe e suporta coisas porque é nobre fazê-lo, ou porque é vil deixar de fazê-lo. Contudo, morrer para escapar à pobreza, ao amor ou ao que quer que seja de doloroso não é próprio de um homem bravo, mas antes de um covarde. Porquanto é moleza fugir do que nos atormenta, e um homem dessa espécie suporta a morte não por ela ser nobre, mas para eximir-se ao mal (Aristóteles, 1991, p. 8).
Após Hem optar por continuar em sua espera pelo surgimento do velho queijo no local de costume, decepcionado, Haw e regressou novamente sozinho à sua jornada. Apesar do desapontamento, o duende sorriu quando voltou para o labirinto e pensou: “é mais seguro procurar no labirinto do que permanecer sem queijo”, ele sabia que era questão de tempo encontrar o que desejava e sentia-se realizado pelo simples fato de retomar a jornada pelo labirinto e as novas descobertas que a experiência o proporciona.
No caminho de volta, Haw escreve na parede do labirinto: “velhas crenças não o levam ao novo queijo” (1998, p. 25). Ele ainda não havia encontrado o queijo, porém aprendeu que resistir à mudança de crenças limitantes não era uma decisão boa a se tomar e escreveu outra frase: “Quando você acredita que pode encontrar e apreciar um novo Queijo, muda de direção” (1998, p. 25). Logo após, o duende decidiu desbravar partes desconhecidas do labirinto, encontrando novos pedaços de queijo. Contente com a descoberta, Haw pensou no quanto as frases ajudariam Hem quando ele tomar a iniciativa de explorar o labirinto e voltou a escrever: “notar cedo as pequenas mudanças ajuda-o a adaptar-se às maiores que ocorrerão” (1998, p. 26). Pouco tempo depois, Haw encontrou o que seria o ponto de chegada da sua jornada ao dar de cara com uma pilha de queijo de diversos tipos.
O lugar do labirinto descrito como posto N já havia sido encontrado pelos seus amigos ratos Sniff e Scurry, que o receberam com grande satisfação. A farta barriga dos ratos e sua mudança de aparência demonstrava que estavam ali a um bom tempo, Haw saudou os velhos amigos, “então se atirou sobre o Novo Queijo. Depois de saciar a fome, ergueu um pedaço de Queijo fresco e fez um brinde. - Viva a Mudança! (1998, p. 26)”. Ao mesmo tempo que saciava a fome, o duende refletia sobre o que havia feito e como aprendeu a rir de si mesmo diante do medo e do que fizera de errado.