O Terceiro Reich no poder. Análise de obra efetuada por: Prof. Miguel A. Teodoro – Mestre em História

Neste segundo volume da trilogia que explora em profundidade a ascensão e queda do Terceiro Reich, o historiador Richard J. Evans apresenta um registro detalhado e impactante sobre o regime de Adolf Hitler entre os anos de 1933 e 1939. Intitulada "Terceiro Reich no Poder", essa obra monumental de 1007 páginas mergulha na atmosfera de medo e opressão que tomou conta da Alemanha após a ascensão dos nazistas ao poder.

Evans traça, com minúcia, o panorama da política de terror instaurada pelo regime, destacando como os nazistas consolidaram seu domínio não apenas por meio de mecanismos de repressão e controle social, mas também por meio de uma propaganda que distorceu profundamente os valores culturais e científicos. A Alemanha viu-se mergulhada em uma realidade onde a ideologia nazista permeava todos os aspectos da vida cotidiana, desde a educação até as artes, criando um clima de conformismo e medo.

O livro também aborda a fase inicial da agressiva política expansionista nazista, marcada por sucessivas invasões territoriais. Evans destaca como a obsessão de Hitler por criar um "espaço vital" para o povo alemão impulsionou a anexação de terras vizinhas, com o objetivo de garantir a hegemonia do regime na Europa. Esse projeto expansionista, porém, tinha como pano de fundo um objetivo ainda mais sinistro: a perseguição implacável aos judeus. Já nas primeiras fases do regime, o antissemitismo institucionalizado começava a ganhar força, pavimentando o caminho para a eventual implementação da Solução Final, que buscava o extermínio sistemático do povo judeu.

Evans examina de forma meticulosa como a ideologia nazista, que em poucos anos distorceu a ciência, a cultura e a moralidade, se voltou cada vez mais para a exclusão, repressão e destruição de grupos considerados "indesejáveis", com os judeus no centro de seu ódio e perseguição. À medida que o Terceiro Reich consolidava seu poder, a discriminação e a violência contra os judeus aumentavam, culminando em uma das maiores tragédias da história humana.

Essa versão expande a análise e oferece mais contexto histórico sobre o impacto do nazismo, mantendo o foco nos temas tratados por Richard J. Evans.

Entretanto, nesta sua obra destacamos as páginas de 657 a 664 que discorrem sobre “A Noite dos Cristais”, que é a denominação dada ao início das perseguições orquestradas pelos nazistas contra os judeus na Alemanha Nazista entre os dias 9 e 10 de novembro de 1938. Uma ação assim refere-se, em essência, a um ataque coordenado contra um grupo específico de pessoas. Esse termo também ficou conhecido por pogrom e foi frequentemente usado para designar ações violentas organizadas contra judeus.

A Noite dos Cristais, segundo Evans, é um evento marcante na história da Alemanha sob o regime nazista, pois representou um ato de violência em grande escala, além de ter dado início à detenção em massa de judeus nos campos de concentração. Ademais, este pogrom apresentou um nível de violência sem precedentes até então na Alemanha Nazista.

Destaca-se ainda que, antes desse evento, já haviam ocorrido demonstrações de violência contra os judeus alemães, além da implementação de diversas leis que retiravam seus direitos. Contudo, a Noite dos Cristais atingiu um patamar de brutalidade inédito, como veremos mais adiante. O nome desse pogrom (Noite dos Cristais) refere-se à grande quantidade de vidros quebrados que ficaram espalhados pelas ruas das cidades alemãs onde ocorreram os ataques.

O autor ressalta que o pogrom foi desencadeado como retaliação a um atentado cometido por um estudante judeu em Paris. No dia 8 de novembro de 1938, Herschel Grynszpan, um jovem judeu de 17 anos, realizou um atentado na embaixada alemã em Paris. Durante o ataque, o diplomata Ernst vom Rath foi alvejado e faleceu pouco tempo depois.

Afirma-se que Grynszpan cometeu o atentado como forma de vingança contra a deportação de seus pais da Alemanha. Este episódio rapidamente se transformou em uma ferramenta de propaganda antissemita nas mãos dos nazistas, gerando ataques espontâneos contra judeus em várias regiões da Alemanha.

Em contra partida, Adolf Hitler, então líder da Alemanha Nazista, e Joseph Goebbels, ministro da propaganda, reuniram-se para decidir que medidas seriam tomadas em resposta ao ataque em Paris. Ambos decidiram que a violência contra os judeus dentro da Alemanha deveria ser intensificada, com o objetivo de intimidar e forçar a emigração dos judeus do país.

Goebbels transmitiu a decisão aos membros do partido, instruindo que a violência deveria ocorrer de maneira a sugerir que o governo alemão não estava envolvido. As lideranças regionais do Partido Nazista foram informadas das ordens por telefone, e as tropas de assalto (SA) foram mobilizadas.

As instruções de Goebbels incluíam diretrizes sobre como os ataques deveriam ser executados e o que deveria ser evitado. Elas indicavam que saques não deveriam ocorrer, judeus estrangeiros não deveriam ser alvos e que lojas judaicas não deveriam ser incendiadas para evitar danos a propriedades alemãs.

As ordens foram transmitidas às tropas de assalto, que naquele dia celebravam o 15º aniversário do Putsch da Cervejaria, uma tentativa fracassada de golpe na Baviera. A maioria dos grupos que participaram do ataque atuou disfarçada, já que o objetivo era dar a impressão de que os eventos não tinham ligação com o partido nazista.

Como aconteceu o ataque?

Os ataques contra os judeus na Noite dos Cristais começaram na noite de 9 de novembro e se estenderam até o meio-dia de 10 de novembro. Como mencionado, a Noite dos Cristais foi um ataque sem precedentes contra os judeus, alcançando um nível de violência até então nunca visto na Alemanha Nazista.

Relatos descrevem o frenesi dos ataques realizados contra as propriedades judaicas. Os primeiros alvos foram as sinagogas, seguidas por lojas de judeus e, por fim, suas residências. Ao longo desses ataques, inúmeros casos de violência foram relatados. Apesar das ordens recebidas, saques e incêndios foram generalizados durante toda a noite.

Destaca Evans sobre a brutalidade dos nazistas:

"Em Esslingen, camisas-pardas vestidos de trajes civis e armados com machados e marretas invadiram o orfanato judaico entre meia-noite e uma hora da madrugada e destruíram tudo que podiam, jogando livros, símbolos religiosos e o que fosse inflamável em uma fogueira que acenderam no pátio. Um camisa-parda disse às crianças em prantos que, se não saíssem imediatamente, elas também seriam lançadas às chamas."

Naqueles dois fatídicos dias para os judeus, o saldo da crueldade dos nazistas podem ser resumidos da seguinte forma: cerca de mais de mil sinagogas foram destruídas e incendiadas. Entre estabelecimentos comerciais e lojas judaicas, o número da destruição atingiu mais de nove mil empresas. Os prejuízos foram calculados em trinta e nove milhões de reichmarks – moeda padrão alemã entre o período de 1924 a 1948. Como se não bastasse tamanha crueldade, estima-se que mais de mil pessoas tenham sido assassinadas durante aqueles dias de 9 e 10 de novembro de 1938.

Outra gravíssima consequência daquela barbárie foi o aprisionamento em massa de judeus e seu envio para três campos de concentração: Dachau, Buchenwald e Sachsenhausen. Ao todo, 30 mil judeus foram presos pela polícia alemã, que seguia ordens de Hitler para prender o maior número possível de judeus durante o pogrom.

Fonte: EVANS, Richard. J. Terceiro Reich no poder. São Paulo: Planeta, 2014.