VIDAS SECAS, DE GRACILIANO RAMOS.
"Vidas Secas" de Graciliano Ramos é um retrato tocante e visceral da luta e da resistência do sertanejo brasileiro diante da implacável seca do nordeste. A obra narra a história de Fabiano, sua esposa Sinhá Vitória, seus dois filhos e a cadela Baleia, que vagam pelo sertão em busca de sobrevivência. A seca não é apenas um fenômeno climático, mas uma força devastadora que molda as vidas, sonhos e esperanças dessa família.
Fabiano, um homem de poucas palavras, é a personificação da dureza e da resiliência do sertanejo. Sua luta diária contra a miséria e a opressão é marcada por uma profunda resignação e um instinto de sobrevivência que, embora silencioso, é ensurdecedor em sua intensidade. Sinhá Vitória, apesar de toda a adversidade, mantém um sonho simples e humano: ter uma cama de couro. Esse desejo, pequeno para muitos, simboliza um mundo de dignidade e conforto que lhe é constantemente negado.
A cadela Baleia, uma personagem tão central quanto os membros humanos da família, representa a lealdade e a pureza em meio ao caos. Sua morte é um dos momentos mais comoventes do romance, refletindo a brutalidade da existência no sertão e a dor de perder o pouco que se tem. E a morte da cachorra Baleia é uma das cenas mais emocionantes e comoventes do livro, simbolizando a brutalidade e a dureza da vida no sertão. Baleia adoece gravemente, acometida por uma infecção que a faz sofrer intensamente. Pelos caindo, ossos quase a mostra, moscas nas feridas da cadela. Que personagem tão doce e lindo que Graciliano Ramos criou em sua obra. Fabiano, percebendo que a cachorra não tem mais chances de sobreviver e para poupar seu sofrimento, decide sacrificá-la. Ele prepara a espingarda e, com muito pesar, dá um tiro em Baleia.
A descrição dos momentos finais de Baleia é tocante e cheia de simbolismo. Baleia, em seus últimos instantes de vida, tem visões de um paraíso canino, onde ela encontra conforto, comida abundante e uma vida sem sofrimento. Esse momento onírico contrasta fortemente com a dura realidade que a cercava. A narrativa detalha o sofrimento e a angústia da cachorra, mas também sua esperança e inocência, tornando sua morte um símbolo da pureza e da fragilidade em meio à adversidade.
A morte de Baleia não é apenas um evento isolado na trama, mas um reflexo do destino cruel que aflige todos os personagens da obra. É um lembrete da luta constante pela sobrevivência e da pouca margem para a felicidade em um ambiente tão inóspito. A maneira como Graciliano Ramos descreve a cena, com uma prosa seca e direta, mas carregada de emoção, destaca a profunda conexão entre os personagens e o ambiente em que vivem, tornando a morte de Baleia um dos momentos mais memoráveis e dolorosos da literatura brasileira.
A narrativa de Graciliano Ramos é seca e direta, assim como a paisagem que descreve. No entanto, por trás de cada frase enxuta, há uma profundidade emocional e uma crítica social que desafiam o leitor a sentir a angústia dos personagens e a questionar as injustiças de um Brasil marcado pela desigualdade. "Vidas Secas" é mais do que uma história de sobrevivência; é um grito silencioso de dor e esperança, uma obra que nos lembra da força e da fragilidade da condição humana diante das adversidades. A cada página, somos convidados a caminhar ao lado de Fabiano e sua família, sentindo a aspereza da terra seca sob nossos pés e a imensa vontade de viver, mesmo quando tudo parece perdido.
Com a leitura feita, e a análise da obra pronta, criei esse diálogo aqui:
[...]
Fabiano: (sentado na soleira da porta, olhando para o horizonte seco) Sinhá Vitória, a seca tá braba demais. É uma desgraça só!
Sinhá Vitória: Parece que essa terra num vai dar nada de novo. Até Baleia se foi...
Fabiano: A miséria é grande, e a fome não perdoa ninguém.
Sinhá Vitória: (ajeitando o pano na cabeça, com o olhar cansado) Eu sei, Fabiano. Cada dia que passa é um martírio. Ver os meninos pedindo comida e não ter o que dar me destrói por dentro. E Baleia... coitada da bichinha. Nunca pensei que fosse tão doloroso perdê-la.
Fabiano: (com voz rouca e triste) Eu também não, Vitória. A gente sabia que ia ser difícil, mas nunca pensei que ia ser assim. A morte tá rondando a gente. Cada noite, fico pensando se vai ser amanhã que a seca vai levar mais alguém.
Sinhá Vitória: (enxugando uma lágrima que escorre) A gente sempre teve esperança, Fabiano. Mas agora, parece que a esperança tá morrendo junto com a gente. Os meninos tão fracos, e eu... eu só queria uma cama de couro pra deitar e esquecer do mundo. Custa ter o meu sonho realizado?
Fabiano: (suspirando profundamente) Uma cama de couro... É um sonho bonito, Vitória. Eu também queria poder te dar isso. Mas agora, a gente só tem o chão duro e a fome pra nos fazer companhia. É essa a nossa miserável vida nesse inferno aqui!
Sinhá Vitória: (com voz trêmula) A vida tá difícil, Fabiano. Mas a gente tem que continuar lutando, nem que seja só pra ver os meninos crescerem. A gente não pode desistir, por mais que a seca tente nos vencer.
Fabiano: (segurando a mão de Sinhá Vitória) Você tá certa, minha velha.
Sinhá Vitória: A gente vai continuar, um dia de cada vez. Enquanto a gente tiver força, vamos lutar contra essa seca.
Fabiano : A morte pode até rondar, mas não vai nos levar sem uma boa briga. Dou um tiro nessa desgraçada! Temos que ser forte!
Sinhá Vitória: (forçando um sorriso) Isso mesmo, Fabiano. A gente é mais forte do que parece. E um dia, essa seca vai passar, e a gente vai lembrar de Baleia e de tudo o que enfrentamos com orgulho.
Fabiano: (olhando para o céu estrelado) Que assim seja, Sinhá Vitória. Que assim seja.
[...]
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Ronald Sá, é ator, dramaturgo, diretor e professor de teatro. Tem mais de 30 textos teatrais escritos, tanto infantil e adulto. Mora em São Luís do Maranhão. Começou a se interessar pelas letras desde criança. Formado em Artes Cênicas, tem um grupo de teatro na periferia da cidade maranhense, Anjo da Guarda. Bairro cultural, celeiro de vários artistas. Atuou, escreveu e dirigiu 26 espetáculos. No momento, escreve sua primeira série e e seu primeiro livro sobre o mundo teatral.