O poema "Quase" de Mário de Sá-Carneiro é uma expressão poética da busca incessante do eu lírico por realizações e significados que quase foram alcançados, mas que permanecem fugazes e inatingíveis. Através de imagens poéticas e uma linguagem rica, o poeta explora a sensação de quase alcançar o sucesso, o amor e a plenitude, mas no final, a realização é sempre elusiva.

 

Na primeira estrofe, o eu lírico descreve a sensação de estar perto do sol e do azul, simbolizando a realização e a transcendência. No entanto, ele lamenta que tenha faltado "um golpe de asa" para realmente alcançar esses objetivos. Ele deseja permanecer aquém, ou seja, aquém da plenitude, da perfeição, preferindo não tentar alcançar essas alturas para evitar a decepção.

 

Um pouco mais de sol - eu era brasa,
Um pouco mais de azul - eu era além.
Para atingir, faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém...

 

A segunda estrofe reflete sobre o que se perdeu e a sensação de que tudo o que foi buscado se esvaiu como "um grande mar enganador de espuma." O poeta menciona o "grande sonho" que foi quase vivido, sugerindo que a vida está repleta de sonhos não realizados.

 

Assombro ou paz? Em vão... Tudo esvaído
Num grande mar enganador de espuma;
E o grande sonho despertado em bruma,
O grande sonho - ó dor! - quase vivido...

 

A terceira estrofe destaca a frustração do eu lírico com relação ao amor, ao triunfo e às aspirações em geral. Ele quase tocou esses sentimentos e realizações, mas eles se desvaneceram. A palavra "quase" é central no poema, repetida ao longo do texto, enfatizando a ideia de que a vida é cheia de quases.

 

Quase o amor, quase o triunfo e a chama,
Quase o princípio e o fim - quase a expansão...
Mas na minhalma tudo se derrama...
Entanto nada foi só ilusão.

 

A quarta estrofe destaca a sensação de que o eu lírico falhou em muitos aspectos de sua vida e que suas aspirações e objetivos foram deixados para trás sem serem alcançados. Ele descreve o desencanto de ter beijado coisas que nunca viveu completamente.

 

De tudo houve um começo ... e tudo errou...
- Ai a dor de ser - quase, dor sem fim...
Eu falhei-me entre os mais, falhei em mim,
Asa que se elançou mas não voou...

 

Momentos de alma que desbaratei...
Templos aonde nunca pus um altar...
Rios que perdi sem os levar ao mar...
Ânsias que foram mas que não fixei...

Se me vagueio, encontro só indícios...
Ogivas para o sol - vejo-as cerradas;
E mãos de herói, sem fé, acobardadas,
Puseram grades sobre os precipícios...

Num ímpeto difuso de quebranto,
Tudo encetei e nada possuí...
Hoje, de mim, só resta o desencanto
Das coisas que beijei mas não vivi...

Um pouco mais de sol - e fora brasa,
Um pouco mais de azul - e fora além.
Para atingir faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém...

 

A última estrofe sugere uma sensação de fuga e desorientação. O eu lírico se sente perdido e incompreendido, buscando abrigo, mas sem encontrar um lugar para se aninhar.

 

Listas de som avançam para mim a fustigar-me
Em luz.
Todo a vibrar, quero fugir... Onde acoitar-me?...
Os braços duma cruz
Anseiam-se-me, e eu fujo também ao luar...

 

"Quase" é um poema que explora a fragilidade da existência humana, a efemeridade das realizações e a busca constante por algo além do alcance. É uma reflexão poética sobre as aspirações e decepções que fazem parte da experiência human