SENHORA DOS AFOGADOS

"Senhora dos Afogados" é uma peça teatral escrita por Nelson Rodrigues em 1947. A trama gira em torno da família Drummond, que vive em uma ilha isolada. A peça é marcada por elementos simbólicos e surreais, abordando temas como obsessão, incesto, violência e morte. A personagem central é a matriarca da família, Dona Eduarda Drummond, conhecida como a "Senhora dos Afogados". Ela é uma mulher dominadora e autoritária, cujo marido, Misael, é considerado afogado há anos. Dona Eduarda é obcecada pela memória do marido e vive em constante luto por ele.

Os três filhos de Dona Eduarda são Lia, Moema e Cláudia. Lia é a filha mais velha e é casada com um homem chamado Herculano. Moema é a irmã do meio e Cláudia é a filha mais nova. A peça revela uma trama de incesto entre os irmãos, envolvendo Moema e Cláudia. A chegada de um marinheiro chamado Oduvaldo agita a família Drummond. Oduvaldo se apaixona por Cláudia, despertando ciúmes em Moema e levando a um confronto entre as duas irmãs. Além disso, Oduvaldo desencadeia uma série de revelações e segredos sombrios da família, revelando a complexidade dos relacionamentos e a decadência moral que permeia a história.

A peça trata de temas tabus e controversos, explorando a natureza humana em seus aspectos mais sombrios. "Senhora dos Afogados" é considerada uma das obras mais emblemáticas de Nelson Rodrigues, famoso por suas narrativas densas e provocativas, que desafiam as convenções sociais e exploram as emoções humanas de forma intensa. A peça trata do mito grego de Electra, mesclado a conceitos freudianos e incestos. Além de uma releitura da tragédia grega de Ésquilo, o texto é também paráfrase da obra Electra Enlutada, de Eugene O’Neill. A transposição da ação para fins do século XIX reforça ainda mais o atrito entre impulso vital e convenção social proposto por Nelson, que incluía o texto no rol de suas peças desagradáveis: “pestilentas, fétidas, capazes, por si sós, de produzir o tifo e a malária na plateia”. Senão causar isso, não é marca de Nelson Rodrigues. Esteve sob censura, de 1948 a 1954, nos governos de Dutra e Vargas. Apesar de o texto de “Senhora dos Afogados" ser classificado, oficialmente, como um drama, nota-se, claramente, que ela se aproxima mais de uma tragédia, o que me encanta mais como leitor das obra de Nelson Rodrigues.

Sua estreia ocorreu em 1954, com um grande elenco, capitaneado por Nathalia Timberg, sob a direção de Bibi Ferreira. Como também aconteceu em outras peças de Nelson Rodrigues, houve uma cisão na plateia. Parte aplaudia. Uns, naturalmente; poucos, com bastante entusiasmo, chegando ao extremo elogio de considerá-lo “gênio”. Outra parte do público apupava o autor, com assovios, vaias e xingamentos, como o de “tarado”, como atesta o noticiário da época. Os elementos presentes nesta ficção são facilmente encontrados em quase todas as obras dramáticas de Nelson Rodrigues: traição, incestos, destruição da instituição família, fratricídios, falta de pudor, desvalorização da honra, infidelidade, repressão sexual, vingança e morte; os principais.

Como a maioria das obras de Nelson Rodrigues, ela aborda temas polêmicos e controversos, explorando a psicologia humana em suas profundezas mais sombrias. A peça retrata a história de uma família disfuncional em uma cidade litorânea, cujos membros estão presos em uma rede de relações obsessivas, incestuosas e perturbadoras. A personagem principal é uma mulher jovem e sedutora, conhecida como a "Senhora dos Afogados" por supostamente atrair homens para o mar e provocar sua morte. Nelson Rodrigues utilizou esse termo "Senhora dos Afogados" para explorar a natureza da culpa, do desejo reprimido e da violência psicológica. A peça revela a decadência moral da família retratada, colocando em evidência tabus como incesto, traição e perversão sexual. Além disso, a obra também aborda a dualidade entre o amor e o ódio, mostrando como esses sentimentos extremos podem se manifestar dentro das relações humanas.

Herculano (para Dona Eduarda): Eduarda, por que você insiste em me trair?

Dona Eduarda: Herculano, não é traição! É só uma paixão passageira. Eu te amo, mas às vezes sinto falta de algo mais.

[...]

Moema: Lia, eu não aguento mais essa vida sufocante nessa casa!

Lia: Moema, somos mulheres de família. Temos que nos comportar.

Moema: Eu não quero ser como você! Quero liberdade, quero viver!

[...]

Claudia : Mãe, por que você permite que o papai nos maltrate dessa forma?

Dona Eduarda: Seu pai é um homem difícil, mas ele é o provedor da família. Temos que suportar.

[...]

Herculano: Moema, você não tem o direito de se apaixonar por outro homem!

Moema: Por que não, pai? Eu tenho direito à minha felicidade também.

[...]

Dona Eduarda: Lia, eu estou cansada dessa vida. Quero me libertar das amarras desse casamento infeliz.

Lia: Mãe, não diga essas coisas. Precisamos manter a aparência de uma família feliz.

Esses são apenas alguns exemplos de diálogos presentes em "Senhora dos Afogados". A peça aborda temas como infidelidade, repressão familiar e busca por liberdade, características marcantes nas obras de Nelson Rodrigues. Vale ressaltar que a peça é conhecida por seu estilo teatral expressionista e suas personagens femininas fortes e complexas.

Uma das interpretações possíveis é que Nelson Rodrigues estava criticando a sociedade brasileira da época, expondo seus tabus, hipocrisias e a complexidade das relações humanas. Através de personagens perturbados e situações extremas, o autor buscava provocar reflexões sobre a moralidade e a ética, questionando as convenções sociais e os limites do comportamento humano. A presença constante da água na peça, representada pelos afogamentos, simboliza tanto a liberdade quanto a morte, refletindo a dualidade de sentimentos e desejos presentes na obra. "Senhora dos Afogados" é considerada uma das obras mais provocativas e impactantes de Nelson Rodrigues, reforçando seu estilo dramático e controverso. Ela representa a exploração do submundo dos desejos humanos reprimidos, revelando os aspectos sombrios da alma humana e expondo as consequências trágicas de seus conflitos internos. o grande dramaturgo Nelson Rodrigues, através de personagens e situações extremas, provoca o público a refletir sobre a hipocrisia e os tabus presentes na sociedade, além de explorar a psicologia humana e os conflitos individuais.

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Ronald Sá, é ator, dramaturgo, diretor e professor de teatro. Tem mais de 30 textos teatrais escritos, tanto infantil e adulto. Mora em São Luís do Maranhão. Começou a se interessar pelas letras desde criança. Formado em Artes Cênicas, tem um grupo de teatro na periferia da cidade maranhense, o Núcleo de Produção Teoria das Artes, no Anjo da Guarda, bairro cultural, celeiro de vários artistas. Atuou, escreveu e dirigiu 26 espetáculos. No momento, escreve sua primeira série e e seu primeiro livro sobre o mundo teatral.

Ronald Sá
Enviado por Ronald Sá em 29/05/2023
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