O pálido Olho Azul
Histórias de detetive, atreladas a assassinatos esfíngicos, sempre povoaram o imaginário coletivo, servindo de combustível para a literatura, como parte de um gênero aprazível entre os leitores, até por algumas histórias se mostrarem altamente inventivas. Já pensou na possibilidade de, diante do desafio de desvendar uma trama sórdida, vestir-se da armadura de detetive intrépido, destemido, possuidor de insofismável talento como Sherlock Holmes ou Hercule Poirot? E se pudesse ainda recrutar como parceiro uma figura icônica da literatura, como o dileto Bram Stoker, no melhor estilo H. P. Lovecraft, e por que não, evocando a solércia de Edgar Allan Poe?
Se a ideia pode ser concebida como uma verdadeira mostra de inventabilidade, os créditos devem ser conferidos ao autor norte-americano Louis Bayard. No entanto, seu livro “O Pálido Olho Azul” é muito mais do que um suspense aterrador, trazendo o enigmático autor do famoso poema "O Corvo", como um dos protagonistas. A despeito da presença de Poe irromper como um atrativo, a suntuosidade da narrativa vive em seu enredo inteligente, apostando na peculiaridade da trama, repleta de reviravoltas bastante satisfatórias. Além de Poe, outros personagens são bem delineados e os diálogos entre eles são construídos com esmero.
A história é datada de 1830 e se passa quase inteiramente na Academia de West Point. Era uma noite comum até uma tragédia abater o local, com a descoberta do corpo de um cadete, visto pendurado em uma corda. O que teria levado aquele jovem a desistir da vida e resolver ceifá-la? O caso toma contornos mais aterrorizantes, pois primeiro é descoberto que o corpo foi roubado e maculado, sendo-lhe retirado o coração. Depois, é constatado que o tempo inteiro não se estava diante de um suicídio, sendo esse apenas parte de um sórdido estratagema para camuflar o assassinato.
A busca por respostas mobiliza o aposentado detetive de Nova York, Augustus Landor, que logo recruta secretamente o cadete Edgar Allan Poe para auxiliá-lo nas investigações. Quanto mais mergulham nos mistérios do caso, mais complexidades passam a vir à tona e logo os investigadores se dão conta de que os arcanos de West Point podem estar um tanto além da capacidade deles.
“O Pálido Olho Azul” realiza uma espécie de mescla entre personagens fictícios e reais e esse amálgama acaba gerando um resultado satisfatório. De maneira geral, o leitor se vê diante de uma trama marcada por jogos perigosos e atitudes inesperadas, abrindo margem até para crendices sobrenaturais, rituais macabros, organizações secretas e mais mortes inusitadas e indecifráveis mistérios.
Apesar de cativante sob diversos vieses, um suspense recheado de eventos bem dissonantes quanto às tramas corriqueiras, peca por algumas passagens demasiadamente extensas e às vezes um tanto cansativas. Na maior parte do tempo, a trama desafia o leitor, abre margem para diferentes possibilidades. É impossível presumir qual rumo o livro tomará diante de figuras dramáticas tão enigmáticas, sobretudo, Edgar Allan Poe, que empresta um desmedido carisma à história.
O desfecho da narrativa é uma primazia. O encerramento não é apenas surpreendente, tem certo poder de destruidor, na maior parte das vezes indo totalmente além da perspectiva dos leitores.
-) Vale lembrar que o livro, assinado por Louis Bayard, recentemente recebeu uma adaptação homônima pela Netflix. O filme é estrelada por Christian Bale e Harry Melling, com direção do cineasta Scott Cooper.