À Guisa de Prefácio de Cristiano Ribeiro Sena
À guisa de Prefácio
Reconhecido pelos seus pares como detentor de um invejável cabedal de conhecimentos científicos e filosóficos, o escritor e filósofo Landulfo Santana Prado Filho traz a lume esta obra autobiográfica, que traduz um esforço empreendido pelo autor que é consentâneo com a sua busca pela verdade, busca denodada e sincera pela compreensão do mundo, das pessoas e do sentido da existência. Afinal, para desenhar um panorama coerente da realidade, o filósofo não pode se esquivar de analisar e entender a si mesmo, como agente dotador de significado e propósito a essa mesma realidade percebida.
Uma das facetas mais gratas da busca filosófica é a descoberta de implicações inesperadas, de fatos que encantam e satisfazem, ainda que momentaneamente, a fome de compreensão, do encontro do inusitado, que deslumbra a vista do viajante que depara uma paisagem que lhe enche os olhos, e recompensa o esforço da jornada. Pois nessa jornada histórica e biográfica em busca do conhecimento de si, o autor descobriu a sua verdadeira natureza, o móvel de sua curiosidade filosófica e da sua fome de saber. Ele se descobriu... Um garimpeiro da Verdade, sina que já veio programada em seus genes, e lhe descortinou um cenário repleto de possibilidades realizadoras. Tal sina se lhe apresenta entrelaçada em três conjuntos de fatos, inegáveis devido à sua tangibilidade evidente.
O primeiro conjunto, conforme já se aludiu, diz respeito à sua herança genética, por ser o autor descendente daquela estirpe de homens que, inquietos por natureza, lançaram-se à empreitada desbravadora do Novo Mundo, vindo dar com os costados no Alto Sertão da Bahia, ainda em meados do século XVIII, em busca do Eldorado mítico que incendiava a imaginação dos aventureiros de então. Ao contrário de muitos bandeirantes frustrados, esses seus ancestrais, dentre os quais os Medradas e os Prados, obtiveram algum sucesso com a descoberta de ribeirões auríferos em Rio de Contas, Mucugê e outras localidades da Serra Geral baiana, ainda que a sovinice desses veios levasse ao rápido esgotamento do ouro.
Muitos desistiram do sonho e foram embora, mas para aqueles que ficaram por ali e se estabeleceram como lavradores e criadores de gado, O destino reservaria uma grata surpresa, com a descoberta de grandes jazidas de diamante no século XIX, que fizeram a riqueza e o prestígio da Chapada Diamantina durante o Brasil Império, dando ensejo ao surgimento de uma civilização refinada e singular em pleno sertão.
É dessa gente que o autor descende, o que leva ao segundo conjunto de fatos supra-aludidos. Tendo herdado o gosto pela aventura, pelo novo, pelo desbravamento dos seus antepassados, o autor infletiu esse impulso para dentro, voltando-se à epopéia filosófica e tornando-se um buscador, não de serras de ouro e diamantes físicos, mas do ouro puro da Verdade filosófica. Pelos conhecimentos adquiridos em longas horas de leitura e reflexão, Landulfo Prado sabia que a sua almejada compreensão da verdade não estaria completa sem o conhecimento de si, e fiel à tradição filosófica helênica, transpôs os umbrais do Templo de Delfos, cujo frontão trazia a inscrição: Homem, conhece a Ti mesmo e conhecerás o Universo e os Deuses...
Dessarte, mergulhou dentro de si em busca do autoconhecimento e reconheceu-se um continuador dessa linhagem de garimpeiros, mas agora um garimpeiro de conceitos, preconceitos, reflexos condicionados e atavismos, que em seu conjunto poderiam explicar a mecânica do funcionamento de sua alma. Durante esse trajeto, talvez inconscientemente, quis saber em que medida as ações dos que vieram antes dele condicionaram a sua presente existência, e pôs mãos à obra, no árduo trabalho de deslindar os fatos e obras de seus antecessores.
Isso conduz ao terceiro conjunto de fatos, que levaram Landulfo a se reconhecer mais uma vez como um garimpeiro, sina que o jungiu ainda nesse labor empreendido. Explica-se. Devido à exiguidade de fontes documentais de pesquisa, que foram comprometidas por motivos diversos, inclusive uma enchente que destruiu o cartório de Abaíra-BA, núcleo inicial de sua família, compreendeu que o trabalho de pesquisa que tinha à frente seria mais árduo do que tinha imaginado, a princípio.
Munindo-se da bateia da paciência, arregaçou as mangas da camisa e as barras da calça, e acocorando-se na beira do riacho da Tradição Oral, entregou-se ao minucioso labor de descartar o cascalho da fantasia, dos exageros e dos mitos, para reservar as pepitas douradas dos fatos históricos, com os quais veio a compor o relato ora apresentado. Essa obra, gratificante não só para o autor, mas para todos os que dela tomarem ciência, vem enriquecer o acervo de informações históricas e conceitos filosóficos, constituindo sem nenhum favor mais um tijolo no edifício do conhecimento humano. Fonte de realização para o autor, fonte de deleite para nós, leitores. Que a lavra intelectual de Landulfo Prado nunca se esgote, é o nosso desejo sincero e algo egoísta, no sentido de aplacar a nossa ambição por saber...
CRISTIANO RIBEIRO SENA
Advogado
Instituto Histórico e Geográfico de Montes Claros-IHGMC