"Do lado de lá do olhar", do poeta português José Gomes Ferreira.
Poucos são os que se atrevem em contemplar o nada e, os que o fazem, não estão desenganados de seus riscos... e de sua beleza e fantasia tentadoras. “Do lado de lá do olhar” é um atrevimento; não é fuga, não é trabalho acovardado, nem a resignação romântica de quem não segura o olhar perante o outro e o nada. A verve de José Gomes Ferreira, um poeta “fugitivo”, é uma explosão singela, macia, delicada, de quem se permite viver a intimidade e a transitoriedade das palavras. E dos amores. Mesmo que tamanhas sejam as distâncias, o que o poeta nos assinala é que delas vivemos e, talvez, através delas estabelecemos contatos eternos. Como a vida, como a morte, como a poesia.
Em seus poemas “excentricidade” e “homem bomba”, o poeta encara a beleza do vazio, munido com suas armas explosivas: a palavra, o silêncio, a fantasia. E por isso mesmo é capaz de destruições inofensivas, aquelas que nos causam barulhos fortíssimos e necessários. Transeunte e fugitiva que é, a poética de José Gomes está ali do outro lado da margem, talvez a caminho da “Terceira margem do rio”, para citar Guimarães Rosa. Ou às margens do mar profundo. Ela está para quem se dispõe a fazer travessias.