Gregório de Matos e a poesia de cunho religioso

A JESUS CRISTO NOSSO SENHOR

Pequei, Senhor; mas não porque hei pecado,

Da vossa alta clemência me despido;

Porque, quanto mais tenho delinqüido,

Vos tenho a perdoar mais empenhado.

Se basta a vos irar tanto pecado,

A abrandar-vos sobeja um só gemido:

Que a mesma culpa, que vos há ofendido,

Vos tem para o perdão lisonjeado.

Se uma ovelha perdida e já cobrada

Glória tal e prazer tão repentino

Vos deu, como afirmais na sacra história,

Eu sou, Senhor, a ovelha desgarrada,

Cobrai-a; e não queirais, pastor divino,

Perder na vossa ovelha a vossa glória.

(https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4248394/mod_resource/content/2/Greg%C3%B3rio%20de%20Matos.pdf)

Buscando a Cristo

A vós correndo vou, braços sagrados,

Nessa cruz sacrossanta descobertos,

Que, para receber-me, estais abertos,

E, por não castigar-me, estais cravados.

A vós, divinos olhos, eclipsados

De tanto sangue e lágrimas abertos,

Pois, para perdoar-me, estais despertos,

E, por não condenar-me, estais fechados.

A vós, pregados pés, por não deixar-me,

A vós, sangue vertido, para ungir-me,

A vós, cabeça baixa, pra chamar-me.

A vós, lado patente, quero unir-me,

A vós, cravos preciosos, quero atar-me,

Para ficar unido, atado e firme.

(https://www.portugues.com.br/literatura/gregorio-de-matos-guerra.html)

O soneto ‘A Jesus Cristo nosso Senhor’ tem como tema o pecado e a culpa.

De acordo com a segunda estrofe, o pecado provoca a ira de Jesus e o eu lírico já inicia com uma confissão de seus pecados e confia na disposição de Jesus em lhe perdoar. ‘Pequei, Senhor; mas não porque hei pecado’, mostra-se humilde e submisso nesse verso, porém nos versos ‘Cobrai-a; e não queirais, pastor divino,/ Perder na vossa ovelha a vossa glória’ constata-se que faz uso da chantagem para conseguir seu intento – irônico e debochado, insinua ser Cristo obrigado a perdoar para não perder Sua ovelha.

No soneto Buscando a Cristo, o poeta também se assume como ser pecador, revelando seu arrependimento e mostrando-se digno de um pedido de perdão, escreve que, se arrependendo, conseguirá a salvação de sua alma, recebendo o perdão de Deus. De uma maneira irônica, o poeta declara a obrigação de Cristo em perdoar os pecadores, mesmo que esses continuem indefinidamente a pecar de modo consciente, isso pois Ele aceitou a condição de ser morto pelos pecadores cravado em uma cruz.

O eu lírico do poeta versa sobre sua trajetória na direção de Cristo. Um Cristo que ele vai apresentando nos versos aos pedaços – metonimicamente – e que, ao final, aparece completo e com unido.

Percebe-se nos textos de cunho religioso que Gregório de Matos tem um espírito contrarreformista; utiliza-se da dualidade matéria/espírito; pecado/perdão; também desenvolve seus temas demostrando os perigos, as instabilidades da vida; a angústia da mortalidade; a necessidade da salvação; a submissão humana ao divino.

É recorrente na poesia de cunho religioso católico do autor a glorificação da grandiosidade divina e de seu poder (representação do inexaurível, do espiritual, do eterno) diante da passageira existência humana.