Piano Bar - Engenheiros do Hawaii (Análise da Letra)
Já faz um tempo que eu escrevo aqui no recanto mas hoje percebi que nunca fiz uma das coisas que mais gosto: analisar letras de músicas. Geralmente tenho minhas próprias interpretações de obras. Algumas vezes as pessoas concordam comigo, muitas vezes não. De toda forma, se você está dedicando um pouco do seu tempo para ler o que aqui está escrito, peço que fique mais um pouco e deixe seu comentário sobre a música e sobre minha interpretação. Vamos discutir ideias e pontos de vista.
A música escolhida é uma das minhas favoritas. Piano Bar é uma música da banda Engenheiros do Hawaii gravada no disco Várias Variáveis datado de 1991. A faixa de número quatro é cheia de mistério, amor, paixão, sexo, traição e suspense. Acho que o título da música é bem importante pois consigo ver toda a música como cenas e séries de acontecimentos em um bar ou algum outro local noturno, em alta madrugada. Vou recitar os trechos da letra e comentar logo abaixo. A letra dessa música passou por alterações durante os anos, uma característica forte do Humberto Gessinger de sempre tentar atualizar suas letras para seu pensamento atual ou momento que o país está vivendo. Para todos os aspectos, vamos analisar a letra original do álbum Várias Variáveis.
“O que você me pede eu não posso fazer
Assim você me perde, eu perco você
Como um barco perde o rumo
Como uma árvore no outono perde a cor”
Nesse primeiro trecho, o autor deixa claro que a música trata de mais de uma pessoa. O eu lírico explica a uma outra pessoa que o que ela deseja não poderá ser feito. Mas o que será que ela deseja? O mais importante aqui é a forma como ele a perderia: de forma natural. Um barco exige que seu rumo seja ajustado constantemente. Meu pai é pescador, ele me ensinou algumas coisas do tipo. O barco está sempre sujeito a forças do vento e do mar, o que faz com que ele desvie sua rota naturalmente, por isso, o comandante deve sempre que possível mantê-lo no azimute. Da mesma forma a arvore no outono. Nada mais natural.
“O que você não pode eu não vou te pedir
O que você não quer... eu não quero insistir
Diga a verdade, doa a quem doer
Doe sangue e me dê seu telefone”
Agora, pra mim, a coisa parece ganhar mais forma. Trata-se de um trato, um pacto, entre duas pessoas. O que na minha visão é um relacionamento extraconjugal. Um daqueles relacionamentos que duram uma noite, ou deveriam. Provavelmente, no inicio o que ela pede é o que toda amante, cedo ou tarde pede, a titularidade. Ele diz que não pode, ele ainda ama alguém. Se ele a assumir, isso vai separa-los. Da mesma forma, ele tenta mostrar empatia com ela, dizendo que não vai fazer coisas que ela não pode. Empatia essa meramente para justificar sua negativa. E quanto ao “Doe sangue”? Será apenas uma mensagem de utilidade publica ou tem algum significado que eu ainda não captei?
“Todos os dias eu venho ao mesmo lugar
Às vezes fica longe, difícil de encontrar
Mas, quando neon é bom
Toda noite é noite de luar”
Que lugar seria esse? Um lugar físico ou um estado de espírito? Eu já tive algumas teorias sobre esse tal lugar e quais emoções ele esconde. Mas na verdade acredito que seja realmente um lugar físico. O próprio bar. Um lugar de fuga da realidade, pois é isso que ele procura. O neon é uma luz comum em casas noturnas, mas nesse caso ela simboliza uma outra coisa. A comparação da luz artificial dos bares com a luz natural da Lua nos mostra um belo comparativo de sexo com amor, e sexo com desejo. Sim, podemos amar alguém e com ela fazer amor, mas o nosso desejo pode está aprisionado em outra pessoa. Acho uma incrível comparação.
“No táxi que me trouxe até aqui
Julio Iglesias me dava razão
No clip Paul Simon estava de preto
Mas, na verdade, não era não
Na verdade nada é uma palavra esperando tradução”
Essa é a parte que eu fico mais confuso pois não estou tão “por dentro” das referências. Por isso peço a você, caro leitor, que me ajude. Atualizarei essa parte com os comentários de quem tiver uma teoria sobre o significado.
Mas quanto ao Julio, creio que ele estava querendo explicitar sua solidão. Quando é dita a frase “Julio Iglesias me dava razão” é dita uma frase em segunda voz, eu particularmente entendi “Yo soy um hombre solo”. É uma música do Julio que fala realmente de solidão. Mas quanto ao Paul estar ou não de preto, essa eu não captei (risos).
“Toda vez que falta luz
Toda vez que algo nos falta (alguém que parte e não volta)
O invisível nos salta aos olhos
Um salto no escuro da piscina”
Agora retornamos à luz como amor. É uma introspecção sobre as besteiras que fazemos quando estamos carentes. Quando aquela pessoa que realmente amamos nos faz falta, quando estamos em uma crise ou por algum motivo não a temos nos sentimos sós. E quando nos sentimos assim, coisas que antes eram imperceptíveis agora começam a aparecer. E uma dessas coisas são as outras pessoas. Outras formas de nos “curarmos” ou ao menos um analgésico para dor que em breve voltará. E tudo isso é um salto no escuro, uma surpresa, um caminho sem volta, um tiro no escuro que muitas vezes pode acertar nosso próprio pé.
“O fogo ilumina muito
Por muito pouco tempo
Em muito pouco tempo o fogo apaga tudo
Tudo um dia vira luz
Toda vez que falta luz
O invisível nos salta aos olhos”
O fogo representa o sexo sem paixão. É o ardor do momento. Naquele momento nos sentimos bem, mas depois a ficha cai e voltamos ao mundo real, ao mundo sem “luz”.
“Ontem a noite eu conheci uma guria
Já era tarde era quase dia
Era o princípio
Num precipício, era o meu corpo que caía”
Agora sim estamos falando do mesmo momento em que estávamos quando a musica começou. A moça que ele conheceu no bar, tarde da noite. E foi com essa moça que ele deu “o salto no escuro”. Nesse momento, sua mente despenca, desmorona, há muitos questionamentos envolvidos enquanto seu corpo sucumbe aos próprios desejos.
“Ontem a noite, a noite tava fria
Tudo queimava, nada aquecia
Ela apareceu, parecia tão sozinha
Parecia que era minha aquela solidão”
E é aqui, senhoras e senhores, que eu vejo uma pequena “pegadinha” na interpretação. Quando ele diz que a noite estava fria que tudo queimava, mas não aquecia ele está falando de antes da mocinha aparecer e não durante o seu aparecimento. Provavelmente ele já estava vindo de um encontro ruim ou mesmo da própria casa, com sua parceira. Um sexo sem paixão, sem tesão. Mas aí a moça do bar apareceu, e ele se identificou com ela.
“Ontem à noite eu conheci uma guria
Que eu já conhecia de outros carnavais
Com outras fantasias
Ela apareceu, parecia tão sozinha
Parecia que era minha aquela solidão”
Esse trecho me parece bem revelador. A moça já era conhecida, já era uma colega ou amiga. Isso nos mostra o motivo pelo qual ela o questionava no inicio da música. Talvez nem quisesse ser a principal, mas talvez só estivesse se questionando se seria certo ou errado sair com ele aquela noite, já que ele aparentemente é comprometido. Ele diz que conheceu uma guria que já conhecia, porém de outra forma. Ele não a via daquela forma antes daquela noite, nem passou pela cabeça dele. Mas a “falta de luz” fez com que ele visse algo que antes era “invisível.”
“No início era um precipício (meu corpo que caía)
Depois virou um vício
(Foi tão difícil) Acordar no outro dia
Ela apareceu, parecia tão sozinho
Parecia que era minha aquela solidão”
Vemos o medo e o receio dele antes de iniciar a noite com a moça, mas aparentemente aquilo deu certo e tornou-se uma situação corriqueira. Era um sonho do qual não queria acordar. Era enfim, a Lua que não precisava de neon para ser substituída.
Espero que tenham gostado do texto, por favor, deixem suas críticas, eu nunca fiz algo do tipo antes. Obrigado!