A TRILOGIA DE KLEBER MENDONÇA FILHO: A RUA, O PRÉDIO E O POVOADO: PASSADO, PRESENTE E FUTURO.

[Contém spoilers dos filmes “O som ao redor”, “Aquarius” e” Bacurau”] Desde que assisti a “Bacurau” estou trabalhando na análise deste 3 longas como uma obra só e o texto que venho escrevendo já passa de 10 págs., porque os filmes têm íntima relação. Aqui vai o resumo.

As 3 obras dialogam de várias formas e a mais evidente é o tratamento dado ao espaço físico, que pode ser lido como personagem, talvez protagonista. Primeiro a rua, depois o prédio e, por fim, o povoado: todos apresentam disputas dos locais.

Quanto ao tempo, na minha leitura do conjunto da obra, penso que o primeiro filme lançado - “O som ao redor” - trata do passado (resgate de uma violência sofrida anteriormente); o segundo - “Aquarius” -, do presente (resistência individualizada/atomizada a uma agressão atual - ataque e contra -ataque simultâneos); e o terceiro - “Bacurau” -, vai ao futuro (resistência organizada coletivamente para lutar contra uma violência que ainda virá). E isso fica claro em tudo que os longas apresentam, até nas aberturas de cada um, inclusive na trilha sonora. Os dois primeiros filmes se iniciam com fotografias antigas, e o último, com imagens do espaço, talvez de uma nave, que acabam mostrando de cima o Brasil e a região Nordeste.

Em “O Som ao redor”, a classe pobre de ex-escravizados vem resgatar o passado com os latifundiários de ontem. Em “Aquarius”, a classe média brasileira, isolada no seu apartamento - sem consciência de classe nem identificação mais profunda com os mais pobres -, luta, no presente, contra o poder econômico. Em “Bacurau”, um povoado que ainda será construído, num futuro próximo, supera as divisões em classes, ao menos no seu território, com democracia direta, participativa e genuína. E é a gente de Bacurau, coletivamente organizada, que representa a única e última solução para o amanhã na luta contra os poderes políticos que já se venderam ao poder econômico internacional.