"Darkson: o pirata das trevas" de Marcos Perillo: obra possui boas premissas para a trama e personagens, mas carece de um desenvolvimento melhor devido ao pequeno número de páginas
Esse livro foi gentilmente enviado pelo autor, que me procurou indagando se eu tinha vontade de ler e resenhar sua obra. Eu gostaria muito de crer que tal interesse partiu da leitura das resenhas/comentários literários que já faço há alguns anos na internet, e que tal interesse não constituiu uma mera escolha aleatória, baseada apenas em algum livro que eu tenha lido e comentado no passado. Isso me deixaria feliz pois seria uma forma de reconhecimento e respeito com meus textos, que o autor reconhece a seriedade e honestidade da opinião, seja ela positiva ou negativa. Eu fico muito honrado com o pedido de resenha, com a confiança do autor em mim.
Feita essa introdução, vamos lá... o livro conta a história de Darkson, um pirata que foi amaldiçoado duas vezes: a primeira, ainda bebê, pelo Diabo, sendo traído pelo próprio pai; a segunda, por Netuno, o deus do mar, cansado das tiranias do protagonista, levando-o a vagar por dimensões estranhas e envoltas em trevas, com muito sofrimento. Em meio a tudo isso, suas fiéis três amantes prostitutas e sua grande tripulação, que viajam com ele num barco chamado Last Voyage.
O livro de Perillo soa como uma instigante mistura de duas franquias: em certos momentos lembra "Piratas do Caribe" e, em outros, "Percy Jackson", em sua temática. Há, inegavelmente, uma premissa interessante, considerando ser uma obra de aventura/fantasia, e os personagens possuem, igualmente, boas premissas. Destaque também para o projeto gráfico, muito competente e bonito, ainda que alguns pequenos erros de revisão tenham passado.
Embora as premissas sejam interessantes e a leitura seja fluída, há alguns problemas, em minha opinião, no desenvolvimento de personagens, principalmente do protagonista. É importante frisar: não sei se este livro será uma história única ou o início de uma série ou trilogia. Dependendo da resposta, os problemas podem se acentuar ou não.
O livro possui pouco mais de 100 páginas. Obviamente que a quantidade pequena de páginas não é um parâmetro para definir a qualidade literária. Entretanto, quando você gasta uma grande parte da obra introduzindo personagens, cenários, armas e a trama, sobra pouco espaço para o desenvolvimento em si e, principalmente, para algo que valorizo muito na Literatura, que é o envolvimento do leitor com o personagem. Farei uma analogia, comparando Darkson com outro pirata fictício famoso, o Jack Sparrow do cinema: ambos são piratas, ambos são cafajestes, ambos cometem seus crimes, mas a relação com o público é diferente. As pessoas gostam de Sparrow devido não apenas à caracterização peculiar do ator Johnny Depp mas porque os diálogos de Sparrow, principalmente no primeiro filme da franquia são inusitados e divertidos. Faltam diálogos no livro, mostrando a interação de Darkson com os outros personagens, o que prejudica o desenvolvimento de Darkson em si. Para mim, eu não senti empatia pelo personagem em nenhum momento. Há uma maldade intrínseca ao personagem, que é feita simplesmente por ser feita, sem motivação, de forma gratuita, e a questão da maldição inicial, talvez utilizada como forma de justificação das ações, se assim se interpreta, não convence como ato motivador da crueldade. Sem relevar spoilers mas, como toda aventura, surgem antagonistas e eu, como leitor, me senti motivado a torcer pelos antagonistas, tal é a crueldade do protagonista. Isso poderia ser amenizado por diálogos, pela interação dele com os personagens, o que humanizaria o personagem que, ao longo da história, se comporta como um monstro. Darkson, como personagem, age de forma repulsiva e violenta. Diálogos, quando bem construídos, podem tornar os personagens mais complexos e interessantes, o que permite o surgimento da empatia, ainda que seja com um vilão, por exemplo. Exemplos na Literatura não faltam.
A falta de diálogos também prejudica as motivações dos personagens. As três prostitutas que acompanham Darkson na história, por exemplo. Há um trecho do livro que explica o que leva cada uma delas a estar naquele contexto. Contudo, como quase não há diálogos, não há a interação delas com Darkson, o que me explicaria, como leitor, porque elas ficariam com alguém tão cruel com os demais. Há sim explicações, mas que não me convenceram como leitor. Um outro exemplo: a faca de Darkson (Handless) age como um personagem, comportando-se de forma senciente. Contudo, em nenhum momento, isso me é apresentado com clareza. Fazendo uma outra analogia, com a personagem Katana, dos Quadrinhos da DC Comics, a espada homônima dela possui um comportamento um pouco parecido, mas o comportamento é justificado continuamente por meio de imagens. Em Literatura prefiro que me demonstrem, não que me expliquem... que a interpretação do texto e definição de minha opinião não me sejam impostas, mas instigadas. Num romance, não importa o tamanho, diálogos são fundamentais, não em quantidade (que deve ser satisfatória), mas na qualidade.
O livro deixa possibilidades para uma sequência. Portanto, tal desenvolvimento dos personagens poderia ser melhor explorado numa eventual continuação. Afinal, há premissas interessantes para a trama e para os personagens. Há um universo (cenários) que pode ser bem explorado. Contudo, há que se desenvolver esses componentes sem parcimônia, não com poucas ou muitas páginas... mas com a quantidade de páginas apropriadas para aquilo que se propõe a narrar.
Enfim, Darkson é um livro instigante, com boas premissas de trama e personagens, que serve como introdução para algo que ainda carece de um desenvolvimento melhor... que pode (e deve) ser explorado numa eventual continuação, o que torço para que ocorra. Ao autor, votos de sucesso e vida longa na carreira literária!
(PERILLO, Marcos. Darkson: o pirata das trevas. Barueri: Novo Século Editora, 2016, (Coleção Talentos da Literatura Brasileira), 104 páginas)
P.S.: Resenha escrita em 2018.