Centenário da morte de Machado de Assis

CENTENÁRIO DA MORTE DE MACHADO DE ASSIS
Miguel Carqueija

Falecido em 1908, Joaquim Maria Machado de Assis é uma unanimidade nacional em termos de prestígio como escritor (principalmente contista e romancista). Entretanto é geralmente visto como “mainstream”; algumas de suas obras porém pendem para o lado fantástico, patológico ou mesmo de ficção científica.
Em “Contos escolhidos” — voluem 17 da Coleção Livros O Globo (Click Editora e jornal O Globo, sem data) há 15 contos do autor, sendo um deles, “O alienista”, já com as dimensões de noveleta, inclusive divisões em capítulos.
Pois justamente “O alienista” — que saiu pela primeira vez em 1882, no volume “Papéis avulsos” — possui características de ficção científica. Há quem negue, mas examinemos o enredo. No comentário editorial de “Contos escolhidos” lê-se: “Em “O alienista” o autor mostra como a Ciência (encarnada em Simão Bacamarte) revela-se incapaz de compreender a complexidade tanto da mente humana como do funcionamento da sociedade. O personagem principal busca separar radicalmente loucos e sãos, tomando como sintoma de loucura qualquer expressão de subjetividade mais marcante. Além de criticar a pretensão científica de tudo explicar e classificar, Machado nos mostra como a Ciência (aliada ao poder político) pode levar o homem a perder contato com a variedade inexplicável dos indivíduos.”
Já o conto “A sereníssima república” — também pinçado de “Papéis avulsos” — navega em águas mais explícitas de FC, apesar de reconhecível a intenção de sátira política. O Cônego Vargas, numa conferência, narra as suas experiências com uma raça de aranhas que possuía linguagem articulada. Tratar-se-ia de um idioma completo, “com a sua estrutura sintática, os seus verbos, conjugações, declinações, casos latinos e formas onomatopeicas, uma língua que estou gramaticando para uso das academias.”
Note-se que existem contos de Machado que derivam para os lados da patologia, como “A causa secreta”, aproximando-se de certos estudos terríveis que Poe desenvolveu em torno do crime e da perversidade.

Rio de Janeiro, 19 de abril de 2008.


Nota: este texto foi recém-achado num dos meus cadernos e encontrava-se inédito.