AUSÊNCIA de Flávia Cristina Simonelli
Livro Ausência de Flavia Cristina Simonelli
Ausência é um tema instigante, por suas várias nuances e linhas de interpretação.
A autora Flávia Cristina Simonelli direcionou com muita delicadeza uma dualidade impressionante nessa obra.
Várias situações surgiram em meu imaginário ao olhar a capa do livro e seu título.
Logo me encantei com sua indagação inicial “ O que eu seria se minha biografia desaparecesse da minha mente, apagando todas as pessoas, os lugares, os conhecimentos?"
O pano de fundo da obra é a doença degenerativa que assola uma família de repente, o Alzheimer. A perda gradativa e dolorosa da memória e porque não da própria existência.
O que torna o livro mais dramático são os encontros provocados pela vida.
O personagem principal é um professor acadêmico, de personalidade forte, escritor renomado e educador prestigiado por suas pesquisas e quando tudo isso se perde ? Você deixa de existir?
Esse aspecto intrínseco vai além da doença propriamente dita, existe um momento em que a dúvida da própria existência torna-se infindável e angustiante.
"Ser" é uma tarefa diária e involuntária para a grande maioria das pessoas, a fuga e o tempo podem ser uma libertação ou um algoz, a tua consciência é quem vai decidir.
A família sofre as consequências inerentes a doença implacável.
Os encontros de pessoas que em função da doença descobrem trajetórias em comum.
O médico psiquiatra, experiente e preparado para as mazelas da alma... Será?
Essa doença para ele é uma cicatriz ainda aberta, que o acaso, o destino ou a necessidade de rever sua própria vida, de
homem correto, vivendo no piloto automático.
Esse mesmo homem se viu diante de uma paixão avassaladora. É nesse momento que a dúvida surge e com ela o barulho interno da instabilidade, das curvas, das entrelinhas... até então nunca vividas.
No interim do novo, dos encontros e desencontros, vem o medo e a incerteza. O seu olhar no espelho já não era o mesmo, a transparência inquietante da própria sombra, da inexistência da zona de conforto de outrora e a fragilidade da máscara usada por tantos anos, logo ele, um psiquiatra experiente com as mazelas humanas enfrentadas todos os dias em seu consultório. Não sei ao certo, se a autora com muito talento, desenhou intencionalmente que a ausência imposta pela nossa própria inércia consciente é tão danosa quanto a doença. A fuga de si mesmo retalha conscientemente pedaços de você.
Como a autora diz " Nós nos perdemos de nós mesmos" a doença Alzheimer faz isso, involuntariamente, dolorosamente.
Mas quando nos perdemos de nós mesmos conscientemente, essa é uma escolha, e tem cura!
Drica Barreto