“Não há amanhã” – Gustavo Melo Czekster

 
O escritor porto-alegrense, Gustavo Melo Czekster, nos brinda com o imprevisível e impensado no decorrer das 31 histórias que estão no livro “Não há amanhã” publicado pela editora Zouk. Czekster é o artesão da narrativa curta, utilizando construções esféricas para nos engolir em suas tramas.

O que o escritor faz é conduzir suas personagens por labirintos internos que vão ao encontro do que há por fora. O ambiente em que se passa as histórias é secundário se comparado ao lugar onde os fatos realmente ganham forma, o interior das personagens

Cortázar em seu livro “Valise de Cronópio” escreveu:

 
“Um contista eficaz pode escrever narrativas literariamente válidas, mas se alguma vez tiver passado pela experiência de se livrar de um conto como quem tira de cima de si um bicho, saberá a diferença que há entre possessão e cozinha literária, e por sua vez um bom leitor de contos distinguirá infalivelmente entre o que vem de um território indefinível e ominoso, e o produto de um mero métier” (p.231)
 
 
Não sei se posso me considerar uma boa leitora de contos, mas com certeza ao entrar em contato com o universo literário de Czekster me vi mergulhada no terreno ominoso e indefinível. O horror evocado pelo autor está associado ao desconhecido, ao absurdo do inimaginável. Com as palavras pinta tramas surreais, oníricas. Há muito do insólito presente na tradição fantástica latino-americana nas construções do autor.

Um dos meus contos favoritos “Cinco (ou infinitos) fragmentos em busca de", Czekster se aventura através da metalinguagem aproximando-nos do processo criativo literário. Comprovando a esfericidade que conduz as histórias reunidas no livro, nos chama atenção o recurso usado na organização dos contos. Há um título “Efemeridade” que nomeia 4 histórias curtas diferentes, mas ao mesmo tempo afins. Essa forma de organizar as narrativas reforça a atmosfera que envolve a vida das personagens, a falta total de sentido, um “eterno retorno” ao absurdo da existência.

Nada acontece ao acaso nas histórias de Czekster. Os fios que entrelaçam as vidas das personagens parecem organizados por mecanismos cósmicos que fogem à cognição humana. Presos numa série de situações corriqueiras que coexistem em espirais invisíveis sustentadas por efeitos-borboletas, não podemos enxergar as cordas que nos fazem mover.

Czekster absorve nossos medos e angústias inexplicáveis e pinta um mundo que “é formado por um sem-fim de eventos apavorantes”. A leitura das narrativas de Gustavo Melo Czekster é um mergulho no inapreensível. Não somos os mesmos depois que chegamos ao ponto final (que representa mais reticência). Para o insólito produzido por Czekster sempre haverá amanhã.
Larissa Prado
Enviado por Larissa Prado em 29/06/2018
Reeditado em 13/08/2019
Código do texto: T6377211
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