Coração Da Montanha
Falas d'amor
Doem à razão
Do não virás, e se...
com um beijo,
Ao menos, meio
E mais, o tão menos
Deste seu olhar,
Não aqui...
Resulto: não vê-la!
Tão, tão,
Não aqui
Não aqui
Não aqui
Que bate, bate...
Com efeito
Esse poema,
Descompassado
Bate, sem porquês!
(João Manoel Lourenço)
O texto que tem seu início no título, na palavra coração, músculo oco, mas recheado de significados interpretativos, mais uma vez fala de amor, e não poderia ser diferente, “doem à razão”, essa crase deixa uma pergunta: doem na razão, para a razão, com a razão? Fica para o leitor dentro da sua visão, se conseguir separar, essas linguagens antagônicas: razão e coração, como a sístole e a diástole cumprindo sua função.
Não podemos deixar de esclarecer o estilo do autor, o de fazer uso do anacoluto, ele prende a atenção do leitor para as quebras, as interrupções, que muitas vezes são construídas para dar pistas falsas, numa brincadeira de deixe solta, busque traga, como um barco que só usa o sinalizador no último minuto. Você prende a respiração e pergunta: deu tempo? Volte ao texto questione o tempo tão relativo diante da obra.
E por falar em tempo voltemos o futuro tão certo negando, dizendo não virás, e o leitor, aqui pensando se não virás o beijo ou a razão. Essa condicional precedida de reticencias abre um leque de possibilidades onde encontra outra condicional que amplia a imaginação do leitor e constrói um eu-lírico que se sente empurrado, que se vê levado navegando em cinco negativas: não. A impressão que se tem é que embora comece com o coração , o texto traz mais razão: menos, menos; tão , tão. Não aqui, Não aqui... quem sabe em um outro lugar, talvez , numa outra ocasião.
Mas não podemos nos esquecer que o poema vai fechando seu fazer com a palavra descompassado, que não tem medida, comedimento, desapoderado, então tudo pode acontecer, e como um menino travesso , o poema nos leva a pensar numa ode exclamativa: que maravilha, sem porquês!