"CORDÃO" de Chico Buarque
A produção musical de Chico Buarque, na década de setenta, assume um forte conteúdo contestador, com mensagens, muitas vezes subliminares, de resistência ao regime ditatorial que o Brasil vivia na época. É o caso de “Cordão”, onde o compositor prega a união de todos, no sentido de enfrentamento da situação, na esperança da transformação daquela realidade, acreditando que dias melhores viriam, mas era preciso reagir de forma coletiva.
“Ninguém /Ninguém vai me segurar / Ninguém há de me fechar / As portas do coração / Ninguém / Ninguém vai me sujeitar / A trancar no peito a minha paixão... E então / Quero ver o vendaval / Quero ver o carnaval sair”.
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O grito de rebeldia ecoando no peito de quem se dispunha a enfrentar a violenta repressão instalada no país a partir de 1964. Chico dá voz à coragem, ao destemor, à intrepidez, que deveria tomar conta da consciência coletiva do povo brasileiro. O amor cívico e a paixão pela causa energizavam os corações daqueles que se determinavam a combater o bom combate. Não haveria força de proibição que inibisse essa voluntária disposição de ir à luta.
Declara que sua ousadia não o levaria à desesperança em nenhum instante. Descarta qualquer possibilidade de se deixar dominar pelo medo e abster-se dessa vontade de brigar pelo que acreditava poder contribuir com a construção de uma nova história política no Brasil, num resgate pleno dos princípios democráticos. Fugir seria uma atitude dos covardes, e o momento era dos destemidos. Ninguém haveria de tolher sua caminhada. Enquanto houvesse capacidade de clamor e de fé em dias melhores, seu canto seria ouvido e o seu sorriso de esperança entusiasmaria seus compatriotas.
Demonstrar sofrimento seria, na visão dele, sinalizar resignação, aceitação passiva das condições a que estavam sendo impostos. O ideal era revelar que nada produziria abatimento, nenhum constrangimento ou opressão serviria como componente de surpresa para recuo. As tenebrosas noites do período vivenciado não teriam efeito de pavor, pânico, susto, na intenção então definida. Quem dispusesse a se submeter aos riscos da empreitada, que o acompanhasse formando um imenso cordão.
Não tinha dúvidas de que estaria próximo o dia da celebração da vitória. Depois da tempestade, com certeza viria o momento da festa, o carnaval, na comemoração nacional de reconquista da liberdade. E o povo, então, poderia sair às ruas num congraçamento de alegria e contentamento para aplaudir a chegada de um novo tempo de paz e de respeito aos direitos próprios da cidadania.
* Uma das cem crônicas inspiradas em letras de músicas de Chico Buarque que integram o livro "UM OLHAR INTERPRETATIVO DAS CANÇÕES DE CHICO", a ser lançado até o final deste ano.