"O rio da minha aldeia" - Fernando Pessoa.
O "rio da minha aldeia" está na obra "O guardador de rebanhos", atribuído ao heterônimo Alberto Caeiro, o mais humilde e atento dos heterônimos de Fernando Pessoa, e talvez por isso me agrade tanto, ele era o verdadeiro guardador de rebanhos, a forma poética de se referir a suas escritas.
Tomei conhecimento desta escrita no Vestibular de 87, quando tive a sorte de conhecer um pedacinho do poeta, antes já ouvira falar , lá longe, mas não havia me tocado até então. Que sorte a minha !
" O Tejo é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia
Mas o Tejo não é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia.
Porque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia
O Tejo tem grandes navios
E navega nele ainda
Para aqueles que veem em tudo o que lá não está
A memória das naus
O Tejo desce de Espanha
E o Tejo entra no mar em Portugal
Toda a gente sabe isso
Mas poucos sabem qual é o rio que passa pela minha aldeia
E para onde ele vai
E donde vem
E por isso, porque pertence a menos gente
É mais livre e maior o rio da minha aldeia
Pelo Tejo vai-se ao mundo
Para além do Tejo há a América
E a fortuna daqueles que a encontram
Ninguém nunca pensou no que há para além do rio da minha aldeia
O rio da minha aldeia não faz pensar em nada
Quem está ao pé dele, está só ao pé dele. "
Fernando Pessoa nos apresenta uma ótima decotomia, onde as partes contrárias de um elemento se classificam, mas isto não importa tanto assim, o que fica é o valor que as coisas simples, as nossas pequenas coisas representam para nos, o que está ao nosso alcance e que pertence tão somente a nos, e não precisamos dividir com o mundo.
O Tejo é o maior rio da Península Ibérica, nasce pequenino na Espanha ( Teruel) a 1600 m , e vem descendo pelos montes até Lisboa em Portugal, já grandão, repleto de grandes navios, é um rio lindo em todo o seu percurso de mais de 1000 km, passando por cidades importantes, como Aranjuez, regiões como Castilla e La Mancha , Madrid, depois pelo Alentejo , até chegar a Lisboa e se juntar ao Atlântico. O Tejo também desenha a fronteira entre os dois países por 47 km. Na Espanha se chama " Tajo", quase igual.
O rio da minha aldeia, bem , é o meu rio e quando se está tão somente ao pé dele, não é preciso nada explicar, basta sentir.