O Iluminado e Doutor Sono
"O mundo é um lugar duro, Danny. Não se importa com a gente. Não odeia a você, nem a mim, mas também não morre de amor por nós. Coisas terríveis acontecem no mundo, e são coisas que ninguém pode explicar. Indivíduos bons morrem de forma ruim e dolorosa e deixam as pessoas que os amam sozinhas. Às vezes, parece que só as pessoas ruins permanecem sadias e prósperas. O mundo não ama você, mas sua mãe o ama e eu também."
("O Iluminado")
Na segunda parte das análises de obras do escritor Stephen King trago duas de suas histórias mais famosas O Iluminado (1977), conquistou maior popularidade após a adaptação cinematográfica feita por Stanley Kubrick em 1980 e Doutor Sono (2014) obra lançada recentemente que propõe a continuação e desfecho de fatos que ficaram em aberto no enredo de O Iluminado.
A comparação entre essas duas obras se torna até certo ponto desnecessária tendo em vista que Doutor Sono acaba por ser uma complementação de O Iluminado. Porém, ao reler O Iluminado e em seguida ler Doutor Sono algumas considerações podem ser refletidas de maneira mais profunda. Nessas fantásticas histórias criadas por King o que aparentemente é simples na realidade esconde atrás de si possibilidades maiores de reflexão. Comecemos analisando a figura de Jack Torrance, o protagonista de O Iluminado.
Jack passa por uma transformação psicológica-comportamental ao se isolar no Hotel Overlook a fim de terminar seu livro. Esse personagem padece do que já citei em análise anterior, do elemento “coisa ruim” que King insere em todas suas obras. O que leva Jack Torrance a se tornar um assassino psicótico? Durante toda história de O Iluminado vemos a descida de Jack até o clímax da perseguição empunhando um bastão de beisebol/machado atrás da esposa Wendy e do filho Danny. Em vários momentos tentamos compreender quais foram os elementos motivadores da transformação de Jack Torrance.
Inicialmente, o autor nos faz crer que o isolamento em um local longe de qualquer interação humana, no limiar de uma nevasca, o que em outras análises chamaram de Síndrome da Cabana, ou seja, a loucura que a falta de interação com o mundo externo pode causar em uma mente com tendências psicóticas, causou a transformação assustadora do protagonista. Porém, no decorrer dos acontecimentos no Hotel Overlook passamos a conhecer as facetas do sobrenatural que King introduz pouco a pouco. O livro nos mostra que Jack Torrance sempre possuiu tendências ao alcoolismo desde os tempos de juventude, a própria esposa Wendy em seus capítulos aprofunda-se em reflexões sobre as sutis transformações de comportamento do marido que se assemelham aos momentos que ele se encontrava alcoolizado. A falta de bebidas alcoólicas no interior do Hotel elimina a possibilidade de Jack estar sofrendo delírios através da ingestão de álcool. O seu filho Danny nos dá uma visão mais terna de Jack, apesar de ter sido vítima da agressividade do pai Danny mantém seu carinho e admiração pelo mesmo.
Jack Torrance não está padecendo simplesmente de acessos paranoicos causados pelo isolamento, pressão do trabalho, falta de álcool no organismo, resquícios de uma infância problemática, esses elementos fazem parte do mundo real, do aceitável em nosso cotidiano. São elementos que explicariam racionalmente sua degradação comportamental, elementos que a esposa Wendy procura acreditar para tentar superar o período que precisa passar no Overlook dando apoio ao marido. À medida que o romance vai chegando ao fim, os elementos sobrenaturais e fantásticos passam a guiar toda a estrutura da narrativa e dão a ela o caráter assustador e sombrio. Jack Torrance está sendo influenciado por forças do Hotel Overlook, é como se o Hotel usasse Jack para cumprir uma antiga maldição. A presença de fantasmas, almas atormentadas que morreram no local as quais Jack mantém uma relação real, como se existissem de fato, torna o Overlook quase como um personagem palpável na obra. A questão que é levantada a partir da queda de Jack é: por que ele foi o escolhido para ser o instrumento da vontade maligna do Overlook?
Para responder essa questão precisamos analisar Danny Torrance, o filho de Jack, o elemento central da narrativa e o protagonista de Doutor Sono. Danny possui um dom, outro elemento fantástico das duas obras, a Iluminação. King nos mostra que ele não é o único a possuir tal peculiaridade, em O Iluminado Danny conhece o cozinheiro do Hotel, Dick Hallorann, que se aproxima do garoto se tornando seu único amigo em meio àquilo que um garotinho não consegue entender. A Iluminação de Danny é tão forte que Dick se surpreende e se compromete a ajudar o garoto. Resumidamente, os Iluminados são aquelas pessoas que conseguem se comunicar mentalmente com outros, bem como, conseguem ler o que está na mente das pessoas, seus pensamentos, vontades. Danny consegue se comunicar com Dick mesmo que ele esteja viajando para outro estado no país, seu poder é forte. A Iluminação de Danny, porém, é uma benção, pois o salvou do pai quando ele estava sob efeito do Overlook, mas é também uma maldição, pois, as forças malignas do hotel queriam o garoto para si. Compreendemos que esse dom é de total interesse do Overlook, das forças que o habitam, e por isso, Jack Torrance foi usado para trazer o filho para eles. Jack é suscetível às influências de tais forças, talvez por suas tendências à agressividade, seu passado problemático e violento sendo criado por um pai alcoólatra. Não sabemos ao certo porque Jack se deixa envolver tanto pelo hotel, mas arrisco refletir sobre algo que provavelmente poucos tenham se atentado acerca das influências malignas sobre o protagonista.
Jack é um escritor isso já torna sua mente mais suscetível à lapsos dissociativos da realidade, e resolve escrever sobre o passado negro do Hotel, toda sua mente e concentração se debruçam sobre a investigação desse passado. Jack acaba mexendo em fatos obscuros que aconteceram no Hotel, reavivando memórias há muito sepultadas. Esse intenso fluxo de rememoração pode ter desencadeado sua fuga para uma realidade paralela, aquela que existe apenas no interior do Overlook e que no passado também influenciou outros hóspedes e funcionários a serem acometidos pela “coisa ruim”. Nas cenas que se passam no bar do hotel em que Jack se vê envolvido por uma festa, cercado por antigos hóspedes e personagens já mortos, King quase nos faz acreditar que de fato aquilo tudo está acontecendo, é como se Jack estivesse vivendo em um passado morto, sendo parte daquela realidade. Aqui notamos novamente o contínuo movimento que King realiza em suas histórias entre passado-presente. O elemento estranho se torna evidente quando Wendy, presa no quarto por medo do marido, também escuta ruídos de festa vindos do salão do hotel. Nesse momento nos perguntamos até que ponto aquela realidade paralela envolve apenas a mente de Jack? Uma vez que Wendy, a personagem mais sensata da história, também escuta tais ruídos. A loucura da mente de Jack não é apenas dele, envolve os três elementos da família Torrance, cada um de uma maneira particular. Porém, é a figura de Jack Torrance que nos traz todos elementos do horror da história. Ao fim da obra até mesmo a voz de Jack não lhe pertence mais, as descrições do pânico vivido por Wendy e pelo filho Danny são perturbadoras.
Voltando ao personagem central Danny, em Doutor Sono o dom da Iluminação é aprofundado. Danny se encontra já adulto, a mãe está morta e o amigo da infância Dick também. Ele se encontra sozinho em um mundo que existem cada vez menos iluminados. Com o tempo para de usar o seu dom, até que encontra Abra Stone, uma adolescente tão – ou mais – iluminada que ele. Estabelece-se aí uma relação onde Danny se vê no lugar do seu antigo amigo Dick, pois, auxilia Abra a lidar com esse dom/maldição. Abra e Danny travam uma luta perigosa contra um grupo de fanáticos autoproclamados O Verdadeiro Nó. Esse grupo de indivíduos compõe-se de velhos viajantes que usam trailers para se deslocar pelo país. Suas aparências não denotam qualquer tipo de perigo, são apenas velhinhos ou senhoras de meia-idade, mas o que está por trás do grupo é assustador. Os personagens do Verdadeiro Nó são as criações de King que dão o ascpecto sobrenatural à obra, de fato, eles realizam vampirismo. Diferente da definição clássica de vampiros, mortos-vivos que se alimentam de sangue, repousam em caixões e só saem à noite, os componentes do Verdadeiro Nó se alimentam de crianças iluminadas, o dom da Iluminação é o que os mantém vivos e saudáveis por anos e até mesmo séculos. A líder do grupo, Rose da Cartola, é a principal inimiga de Abra e Danny, eles precisam lidar com ela que é a mais poderosa dos indivíduos do Verdadeiro Nó. Não entrarei no embate entre os iluminados e essas criaturas durante a narrativa de Doutor Sono, e sim, na intersecção entre o Hotel Overlook e a última batalha entre Rose e Abra.
Há uma batalha final travada entre Rose da Cartola e Abra Stone auxiliada por Danny, e o Hotel Overlook reaparece aqui, pois o grupo do Verdadeiro Nó deixa claro no decorrer da narrativa que no antigo local do Overlook é onde se tornam mais fortes, apenas ali podem vencer o poder conjunto de Danny e Abra, os dois maiores iluminados. O que nos leva a relembrar os fatos que levaram à destruição de Jack Torrance. As forças do Hotel Overlook tinham interesse em manter Danny para eles, seu dom da iluminação lhes era importante para permanecerem vivos, o que nos leva a conexão com os indivíduos do Verdadeiro Nó. As forças que envolviam Overlook, provavelmente, estavam ligadas a essas criaturas vampíricas que se alimentavam da Iluminação. O desfecho de Doutor Sono encerra definitivamente as histórias tenebrosas que cercaram O Iluminado, explicando muito dos fatos sobrenaturais que transformaram a mente de Jack.
Há brechas entre uma história e outra que permanecem em suspenso justamente para dar às obras seu teor de fantástico. Jack Torrance ainda é um dos personagens mais curiosos a serem analisados, apesar de Danny ser a espinha dorsal dos dois livros, Jack é o memorável personagem que esconde atrás de si mistérios irresolúveis que compõe as obras, que fizeram de O Iluminado um dos thrillers mais terríveis de toda obra de Stephen King. Ressalto que provavelmente Jack (assim como o personagem Scott de LOVE – a história de Lisey) possui traços autobiográficos, pois, King passou por períodos de alcoolismo, uso de entorpecentes e experiências de quase morte durante sua vida (vide a biografia do autor: Coração Assombrado). Muitos dos fantasmas que atormentam Jack Torrance podem ser os próprios fantasmas do autor e por isso alguns elementos de O Iluminado se tornam ainda mais misteriosos à medida que o revisitamos.
Espero que a análise tenha sido satisfatória, ainda há muito o que se falar sobre ambas histórias, porém, o exercício de analisar não finda em si mesmo. A cada nova leitura uma nova perspectiva. Para aqueles que ainda não conhecem o trabalho de Stephen King recomendo O Iluminado seguido de Doutor Sono para compreenderem a proposta única de horror psicológico criada pelo autor.
A comparação entre essas duas obras se torna até certo ponto desnecessária tendo em vista que Doutor Sono acaba por ser uma complementação de O Iluminado. Porém, ao reler O Iluminado e em seguida ler Doutor Sono algumas considerações podem ser refletidas de maneira mais profunda. Nessas fantásticas histórias criadas por King o que aparentemente é simples na realidade esconde atrás de si possibilidades maiores de reflexão. Comecemos analisando a figura de Jack Torrance, o protagonista de O Iluminado.
Jack passa por uma transformação psicológica-comportamental ao se isolar no Hotel Overlook a fim de terminar seu livro. Esse personagem padece do que já citei em análise anterior, do elemento “coisa ruim” que King insere em todas suas obras. O que leva Jack Torrance a se tornar um assassino psicótico? Durante toda história de O Iluminado vemos a descida de Jack até o clímax da perseguição empunhando um bastão de beisebol/machado atrás da esposa Wendy e do filho Danny. Em vários momentos tentamos compreender quais foram os elementos motivadores da transformação de Jack Torrance.
Inicialmente, o autor nos faz crer que o isolamento em um local longe de qualquer interação humana, no limiar de uma nevasca, o que em outras análises chamaram de Síndrome da Cabana, ou seja, a loucura que a falta de interação com o mundo externo pode causar em uma mente com tendências psicóticas, causou a transformação assustadora do protagonista. Porém, no decorrer dos acontecimentos no Hotel Overlook passamos a conhecer as facetas do sobrenatural que King introduz pouco a pouco. O livro nos mostra que Jack Torrance sempre possuiu tendências ao alcoolismo desde os tempos de juventude, a própria esposa Wendy em seus capítulos aprofunda-se em reflexões sobre as sutis transformações de comportamento do marido que se assemelham aos momentos que ele se encontrava alcoolizado. A falta de bebidas alcoólicas no interior do Hotel elimina a possibilidade de Jack estar sofrendo delírios através da ingestão de álcool. O seu filho Danny nos dá uma visão mais terna de Jack, apesar de ter sido vítima da agressividade do pai Danny mantém seu carinho e admiração pelo mesmo.
Jack Torrance não está padecendo simplesmente de acessos paranoicos causados pelo isolamento, pressão do trabalho, falta de álcool no organismo, resquícios de uma infância problemática, esses elementos fazem parte do mundo real, do aceitável em nosso cotidiano. São elementos que explicariam racionalmente sua degradação comportamental, elementos que a esposa Wendy procura acreditar para tentar superar o período que precisa passar no Overlook dando apoio ao marido. À medida que o romance vai chegando ao fim, os elementos sobrenaturais e fantásticos passam a guiar toda a estrutura da narrativa e dão a ela o caráter assustador e sombrio. Jack Torrance está sendo influenciado por forças do Hotel Overlook, é como se o Hotel usasse Jack para cumprir uma antiga maldição. A presença de fantasmas, almas atormentadas que morreram no local as quais Jack mantém uma relação real, como se existissem de fato, torna o Overlook quase como um personagem palpável na obra. A questão que é levantada a partir da queda de Jack é: por que ele foi o escolhido para ser o instrumento da vontade maligna do Overlook?
Para responder essa questão precisamos analisar Danny Torrance, o filho de Jack, o elemento central da narrativa e o protagonista de Doutor Sono. Danny possui um dom, outro elemento fantástico das duas obras, a Iluminação. King nos mostra que ele não é o único a possuir tal peculiaridade, em O Iluminado Danny conhece o cozinheiro do Hotel, Dick Hallorann, que se aproxima do garoto se tornando seu único amigo em meio àquilo que um garotinho não consegue entender. A Iluminação de Danny é tão forte que Dick se surpreende e se compromete a ajudar o garoto. Resumidamente, os Iluminados são aquelas pessoas que conseguem se comunicar mentalmente com outros, bem como, conseguem ler o que está na mente das pessoas, seus pensamentos, vontades. Danny consegue se comunicar com Dick mesmo que ele esteja viajando para outro estado no país, seu poder é forte. A Iluminação de Danny, porém, é uma benção, pois o salvou do pai quando ele estava sob efeito do Overlook, mas é também uma maldição, pois, as forças malignas do hotel queriam o garoto para si. Compreendemos que esse dom é de total interesse do Overlook, das forças que o habitam, e por isso, Jack Torrance foi usado para trazer o filho para eles. Jack é suscetível às influências de tais forças, talvez por suas tendências à agressividade, seu passado problemático e violento sendo criado por um pai alcoólatra. Não sabemos ao certo porque Jack se deixa envolver tanto pelo hotel, mas arrisco refletir sobre algo que provavelmente poucos tenham se atentado acerca das influências malignas sobre o protagonista.
Jack é um escritor isso já torna sua mente mais suscetível à lapsos dissociativos da realidade, e resolve escrever sobre o passado negro do Hotel, toda sua mente e concentração se debruçam sobre a investigação desse passado. Jack acaba mexendo em fatos obscuros que aconteceram no Hotel, reavivando memórias há muito sepultadas. Esse intenso fluxo de rememoração pode ter desencadeado sua fuga para uma realidade paralela, aquela que existe apenas no interior do Overlook e que no passado também influenciou outros hóspedes e funcionários a serem acometidos pela “coisa ruim”. Nas cenas que se passam no bar do hotel em que Jack se vê envolvido por uma festa, cercado por antigos hóspedes e personagens já mortos, King quase nos faz acreditar que de fato aquilo tudo está acontecendo, é como se Jack estivesse vivendo em um passado morto, sendo parte daquela realidade. Aqui notamos novamente o contínuo movimento que King realiza em suas histórias entre passado-presente. O elemento estranho se torna evidente quando Wendy, presa no quarto por medo do marido, também escuta ruídos de festa vindos do salão do hotel. Nesse momento nos perguntamos até que ponto aquela realidade paralela envolve apenas a mente de Jack? Uma vez que Wendy, a personagem mais sensata da história, também escuta tais ruídos. A loucura da mente de Jack não é apenas dele, envolve os três elementos da família Torrance, cada um de uma maneira particular. Porém, é a figura de Jack Torrance que nos traz todos elementos do horror da história. Ao fim da obra até mesmo a voz de Jack não lhe pertence mais, as descrições do pânico vivido por Wendy e pelo filho Danny são perturbadoras.
Voltando ao personagem central Danny, em Doutor Sono o dom da Iluminação é aprofundado. Danny se encontra já adulto, a mãe está morta e o amigo da infância Dick também. Ele se encontra sozinho em um mundo que existem cada vez menos iluminados. Com o tempo para de usar o seu dom, até que encontra Abra Stone, uma adolescente tão – ou mais – iluminada que ele. Estabelece-se aí uma relação onde Danny se vê no lugar do seu antigo amigo Dick, pois, auxilia Abra a lidar com esse dom/maldição. Abra e Danny travam uma luta perigosa contra um grupo de fanáticos autoproclamados O Verdadeiro Nó. Esse grupo de indivíduos compõe-se de velhos viajantes que usam trailers para se deslocar pelo país. Suas aparências não denotam qualquer tipo de perigo, são apenas velhinhos ou senhoras de meia-idade, mas o que está por trás do grupo é assustador. Os personagens do Verdadeiro Nó são as criações de King que dão o ascpecto sobrenatural à obra, de fato, eles realizam vampirismo. Diferente da definição clássica de vampiros, mortos-vivos que se alimentam de sangue, repousam em caixões e só saem à noite, os componentes do Verdadeiro Nó se alimentam de crianças iluminadas, o dom da Iluminação é o que os mantém vivos e saudáveis por anos e até mesmo séculos. A líder do grupo, Rose da Cartola, é a principal inimiga de Abra e Danny, eles precisam lidar com ela que é a mais poderosa dos indivíduos do Verdadeiro Nó. Não entrarei no embate entre os iluminados e essas criaturas durante a narrativa de Doutor Sono, e sim, na intersecção entre o Hotel Overlook e a última batalha entre Rose e Abra.
Há uma batalha final travada entre Rose da Cartola e Abra Stone auxiliada por Danny, e o Hotel Overlook reaparece aqui, pois o grupo do Verdadeiro Nó deixa claro no decorrer da narrativa que no antigo local do Overlook é onde se tornam mais fortes, apenas ali podem vencer o poder conjunto de Danny e Abra, os dois maiores iluminados. O que nos leva a relembrar os fatos que levaram à destruição de Jack Torrance. As forças do Hotel Overlook tinham interesse em manter Danny para eles, seu dom da iluminação lhes era importante para permanecerem vivos, o que nos leva a conexão com os indivíduos do Verdadeiro Nó. As forças que envolviam Overlook, provavelmente, estavam ligadas a essas criaturas vampíricas que se alimentavam da Iluminação. O desfecho de Doutor Sono encerra definitivamente as histórias tenebrosas que cercaram O Iluminado, explicando muito dos fatos sobrenaturais que transformaram a mente de Jack.
Há brechas entre uma história e outra que permanecem em suspenso justamente para dar às obras seu teor de fantástico. Jack Torrance ainda é um dos personagens mais curiosos a serem analisados, apesar de Danny ser a espinha dorsal dos dois livros, Jack é o memorável personagem que esconde atrás de si mistérios irresolúveis que compõe as obras, que fizeram de O Iluminado um dos thrillers mais terríveis de toda obra de Stephen King. Ressalto que provavelmente Jack (assim como o personagem Scott de LOVE – a história de Lisey) possui traços autobiográficos, pois, King passou por períodos de alcoolismo, uso de entorpecentes e experiências de quase morte durante sua vida (vide a biografia do autor: Coração Assombrado). Muitos dos fantasmas que atormentam Jack Torrance podem ser os próprios fantasmas do autor e por isso alguns elementos de O Iluminado se tornam ainda mais misteriosos à medida que o revisitamos.
Espero que a análise tenha sido satisfatória, ainda há muito o que se falar sobre ambas histórias, porém, o exercício de analisar não finda em si mesmo. A cada nova leitura uma nova perspectiva. Para aqueles que ainda não conhecem o trabalho de Stephen King recomendo O Iluminado seguido de Doutor Sono para compreenderem a proposta única de horror psicológico criada pelo autor.