Fanatismo- Florbela Espanca.
"Fanatismo" , faz parte do livro "Soror Saudade", de "Flor Bela", datado de 1923, quando a escritora portuguesa tinha vinte e nove anos, e apesar da pouca idade, já era uma mulher bastante desiludida, mas ainda tentando ser feliz.
Minh' alma de sonhar-te anda perdida
Meus olhos andam cegos de te ver !
Não és sequer razão de meu viver
Pois que tu és já toda a minha vida !
Não vejo nada assim enlouquecida...
Passo no mundo , meu amor , a ler
No misterioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lidas !
Tudo no mundo é frágil, tudo passa...
Quando me dizem isto, toda a graça
Duma boca divina fala em mim !
E olhos postos em ti, digo de rastros,
"Ah ! Podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como um Deus, princípio e fim !..."
Trata-se de um lindo poema de amor, cujo título é contido em cada frase, e nelas conseguimos sentir o coração pulsando da autora, e a sua sensíbilidade com as palavras.
Seu nome de batismo era realmente " Flor Bela", e este nome tão singular que a fez famosa, sempre fez jus a sua arte, mantendo o seu lirismo imortal até hoje.
A ideia de escrever sobre "Fanatismo" me veio de repente, assistindo a um programa esportivo , onde o jornalista disse em certo momento ;- " Como dizia Caetano Veloso...meus olhos andam cegos de te ver ", e na hora pensei; " Isto é de Florbela, nada tem a ver com Caetano, e quem musicou foi Fagner, nos anos oitenta, naquela fase tão rica culturalmente, onde teve a magia de musicar coisas lindas, de autores ,como ; Lorca, Florbela, Cecilia Meireles, Ferreira Goulart...num atrevimento que aplaudo até hoje.
Essa frase ; " Meus olhos andam cegos de te ver " é realmente maravilhosa, e diz tanto sobre a paixão, que as vezes não sabemos como expressar, e que vem tão forte quando somos jovens, e sonhamos, e então entendemos a autora, e a sua sensibilidade.
"Olhos postos em ti, vivo de rastros", é a intensidade e a entrega , a não resistência,e o abandono ao amado. Nada mais faz sentido, pois representa toda a sua vida.
Não vou extender, pois a poesia é simples, apesar de intensa, e nisto também consiste a genialidade, quando percebemos que a obra sai do papel, e pulsa, como neste caso.
Florbela morreu num 08 de Dezembro, no dia do seu aniversário de apenas trinta e seis anos, em 1930, após a terceira tentativa de suicídio, pois havia perdido toda a ilusão de viver, pois para ela viver era sentir-se viva a cada minuto, amada a cada segundo, e a realidade se apresentou em ironias e fatalidades, então não soube como prosseguir.