“Além do Princípio de Prazer” - S. FREUD

Tendo em vista os estudos realizados dos dois capítulos referentes ao tema, de Sigmund Freud (1856-1939) Livro XVIII - Obras Psicológicas de Sigmund Freud, entende-se que Freud tinha um modelo teórico sobre a origem do homem; que ele articulou a definição biológica do cérebro como órgão; o conjunto de atividades psíquicas, chamada mente; desenvolveu o conceito de aparelho neurocerebral e um conceito organizacional. E, com ou à partir de Freud, descortinou-se uma realidade que comporta uma face organizacional, uma face do órgão biológico e uma face psíquica, cujo interesse não foi o de reduzi-los um ao outro, mas sim o de pesquisar a natureza de sua articulação e reconhecer seus princípios e processos. Segundo sua teoria (1911), o princípio de prazer seria, basicamente, o curso de eventos colocado em movimento por uma tensão desagradável que toma uma direção tal, resultando numa redução dessa tensão, com uma evitação de desprazer ou uma produção de prazer. Freud, ao desenvolver sua teoria, vai distinguir e designar dois princípios que regem o funcionamento do aparelho psíquico humano:

1.O princípio de prazer: é o propósito dominante dos processos inconscientes (id, processos primários, primitivos de todo ser) impulsionados pelo desejo, na constante busca de proporcionar prazer e evitar o desprazer. Evitar o desprazer aqui representa afastar-se de qualquer evento que venha despertar desprazer, justamente o que caracteriza o sentimento de castração e consequentemente, o recalque.

2.O princípio de realidade: é o que regula a busca pela satisfação do desejo levando em conta as condições impostas pelo mundo externo (superego, a moral, a cultura, a religião, a educação) e, segundo Freud, vem substituir o princípio de prazer como uma proteção e não como uma deposição deste (que caracterizam-se nos mecanismos de defesa do ego).

Logo, a ideia da regulação prazer-desprazer está presente em Freud na concepção econômica de um aparelho psíquico regido pelo aumento (desprazer) ou pela diminuição (prazer) das quantidades de excitação, ou tensão. A introdução do princípio de realidade produz transformações no ego, isto é, de um ego-prazer dominado pelo princípio de prazer-desprazer forma-se um ego-realidade conduzido pelo mundo exterior. Nesse ponto, entende-se que o prazer momentâneo (primário, primitivo) e incerto é abandonado por um prazer seguro, mais tardio (sublimado). No entanto, importa assinalar que o princípio de prazer não é suprimido, ou deposto, antes, ele continua no inconsciente, esperando sempre uma oportunidade de vir à tona. Assim, se o princípio de realidade busca a satisfação no real, o princípio de prazer por sua vez, continua a reger a instância inconsciente, a qual funciona de acordo com as leis dos processos primários e apresenta uma outra realidade, isto é, os sonhos (enquanto dormindo), as fantasias (enquanto acordado).

E, ao analisar os processos de criação de sonhos e fantasias, ao situar as operações cerebrais mais próximas do terreno do significado, Freud desenvolve uma perspectiva energética do psiquismo que, além de se aproximar da moderna teoria científica da complexidade auto-organizada, é capaz de questionar as definições e categorias dualistas que tradicionalmente são aplicadas à relação mente-corpo.

Isso permeia a ideia de um corpo vivencial e multidimensional que difere do corpo (abstrato, dissecado) da Modernidade. Freud aponta, nesse ínterim, uma posição dialética que se estabelece na ideia de que medida em que o princípio de realidade, garantido pelo ego, atua no adiamento ou não da reivindicação da pulsão, tendo afinal objetivo semelhante ao do princípio de prazer: obter a satisfação exigida pelo aparelho. Isto é, através da presença das ficções conscientes (fantasias) e dos símbolos oníricos (sonhos) ele situa as operações cerebrais mais próximas do terreno do significado, e, com isso, percebe-se, a valoração semântica libertou o corpo do domínio da anatomia.

Para Freud, esse psiquismo está ligado à presença de ''energias livres'' que não assumem a capacidade de se vincular, e acabam pressionando no sentido de satisfação total, e à presença de ''energias quiescentes'', que são aquelas em estado de prontidão, à espera de serem investidas em algo. Nisto, em seu modelo energético, Freud visa explicar a natureza dos processos excitatórios através da intensidade das catexias, que depende das qualidades perceptuais relacionadas à circulação energia interna, o que implica estímulo exterior, capturado interiormente, é transformado em uma excitabilidade que se associa a um sentido, ou seja, o estímulo externo é transformado em algo distinto dele mesmo. 

Logo, conclui-se que o princípio do prazer caracteriza-se pela procura de prazer e ao mesmo tempo de evitamento de dor, sofrimento ou tensão, por parte de um organismo. Todos os seres vivos obedecem a este princípio, mas no caso do homem, os processos psíquicos inconscientes procuram a obtenção do prazer e este princípio governa completamente o seu comportamento enquanto criança, e quando adulto, o princípio do prazer constitui uma energia interna enorme à qual se opõe o princípio da realidade, que o leva à aceitação e sublimação (aceitável ante a sociedade) ou reflete a incapacidade de fazê-lo, expressando em distúrbios psicológicos tão comuns na modernidade (angústia, depressão, stress, doenças psicossomáticas, esquizofrenia e/ou histeria coletiva).

Bibliografia

Freud, S. Livro XVIII - Obras Psicológicas de Sigmund Freud, (1856-1939).

Freud, S. - A interpretação dos sonhos [1900] in Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1980.Freud, S. - Formulações sobre os dois princípios do funcionamento mental [1911] in Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1996.

Freud, S. - As pulsões e seus destinos [1915] in Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1980.Vocabulário de Psicanálise / Laplanche e Pontalis; sob a direção de Daniel Lagache; [tradução Pedro Tamen]. - 3a ed. - São Paulo: Martins Fontes, 1998.Dicionário de Psicanálise / Roudinesco e Plon; tradução Vera Ribeiro, Lucy Magalhães; supervisão da edição brasileira Marco Antonio Coutinho Jorge. - Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1998.

Dicionário enciclopédico de psicanálise: o legado de Freud a Lacan / editado por Pierre Kaufmann; tradução, Vera Ribeiro, Maria Luiza X. de A. Borges; consultoria, Marco Antonio Coutinho Jorge. - Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1996.

Nina Costa
Enviado por Nina Costa em 18/06/2015
Reeditado em 06/09/2015
Código do texto: T5281309
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