Crime perfeito
Não consegui decidir-me se isto é bom ou ruim, mas tenho acessos frequentes de anemoia. Não sou suficientemente ingênuo a ponto de crer que certos períodos do Tempo eram desprovidos de problemas, mas, evidenciado por meu gosto musical, sinto-me triste por não ter vivenciado a década de 1980.
Prelúdio do clima de fin de siècle que a década subsequente traria, tudo aparentava ser mais colorido e ingênuo naquele tempo – creio eu que, devido às tecnologias nascentes (e que só nos viriam a trazer contratempos posteriormente) que começavam a ser introduzidas na vida cotidiana, a humanidade aparentava muito mais entusiasmada, e isto podia ser visto em grande parte das produções culturais da época – particularmente na música dançante e sintetizada.
“Qual álbum é o mais significativo desta década para você?”, muitos de meus amigos me perguntam. Não diria que sou um grande connoisseur, mas em termos de memória afetiva acho que um de meus preferidos, apesar de não ser grandemente renomado, traz encapsulado em si todo aquele sentimento de naïveté predominante durante os ‘80s: “Crime perfeito”, do Fruto Proibido.
Liderados pela linda francesa Virginie, do Metrô (outra banda popular da época), ao contrário de seu grupo anterior este não foi bem conhecido – algo inconcebível para mim, já que o creio, em termos de letra e música, melhor que o Metrô. Não que o Metrô não seja também bastante emblemático para mim, mas creio que a maior diferença entre os dois é a maturidade lírica alcançada pelo Fruto Proibido: o Metrô tinha canções mais “adolescentes”, enquanto o Fruto Proibido já demonstra composições adultas (sem, no entanto, perder o romantismo ingênuo da juventude) e de cunho inclusive reflexivo: “Alucinação”, por exemplo, que é uma das mais bonitas do álbum, seguida pelo cover de Itamar Assumpção, “Que Tal o Impossível?”, “Más Companhias” e “Il était une fois”, cantada em francês.
Extremamente subestimado e injustiçado à época de seu lançamento, talvez por ser anos 80 até demais quando a década já chegava ao fim (saiu em 1988), “Crime perfeito” é o mais saudosista de todos os álbuns já lançados durante este período, e é a trilha sonora perfeita para relembrar-se do passado ou imaginá-lo com as cores que lhe aprouver, “vendo o tempo passar enquanto olha pela janela”.
(São Carlos, 22 de fevereiro de 2022)