The ape of Naples
Um de meus temas líricos preferidos é o ocultismo. Não por necessariamente acreditar em tais coisas, mas não vou negar a beleza hermética de certos textos ocultos que me caíram em mãos – houve um tempo em que acreditei em magia entretanto, e a essa altura do campeonato não tenho vergonha de “dar a cara a tapas”, como diz o vulgo, e revelar detalhes sobre meu passado.
Durante o período de pesquisas pré-“Alceste”, li obras de Lévi, Agripa e Liddell Mathers; estudei diversas religiões, abraâmicas ou não, e fã inveterado de Raul Seixas até pretendo adotar os preceitos da Thelema. Atualmente, creio haver uma tênue linha entre autenticidade e charlatanismo em se tratando de tais assuntos – mas a atmosfera de mistério e inacessibilidade é algo que sempre haverá de atrair-me.
Assim sendo, selei minha própria sentença e, como todo bom aprendiz de mago, abri as portas de minha vida ao Coil – a famosa banda britânica cult industrial de inspiração esotérica. Como os conheci, não sei; talvez tenham vindo a mim por mágica de fato. Não há como explicar sua sonoridade aos não iniciados, pois cada um de seus álbuns é como um ritual diferente – outros são mais, outros menos agressivos, podendo ser mais ou menos acessíveis ao ouvido leigo. (Alguns, inclusive, podem dar tontura e dor de cabeça, como alega a própria banda.) Dentre seus incontáveis lançamentos há vários sobre os quais discorrer, pois todos são interessantes a seu próprio modo, mas em minha opinião o mais expressivo é “The ape of Naples”, de 2005 – um dos fatores para isto é o fato de ser um álbum póstumo, lançado um ano após a morte do vocalista Jhonn Balance em decorrência de uma queda acidental.
Junto com “Grey skies and electric light” do Woods of Ypres, sobre o qual já escrevi anteriormente, “The ape of Naples” é extremamente consciente da efemeridade da vida humana. Talvez devido a isto seja o álbum mais delicado da banda, com uma sonoridade comparativamente mais suave e letras que discorrem sobre abraçar a morte como única certeza e agente transformadora da Natureza. É quase como se Balance tivesse nos legado seu testamento em forma de disco, ciente de que haveria de morrer – e se meu argumento não é o suficiente, a faixa de encerramento, “Going Up”, é a própria despedida de Balance enquanto ascende a um novo plano astral.
Nenhuma banda igual ao Coil existiu ou existirá; se de fato existem mais coisas entre o Céu e a Terra do que sonha a Filosofia, eles foram os poucos que as atingiram. Deixando nada mais do que suas músicas, pois, ao contrário dos homens, a Música nunca passa, o Coil legou-nos uma verdade absoluta, que de tão certeira é desdenhada pelas massas:
“Presta respeito ao abutre, pois ele é teu futuro!”
(São Carlos, 30 de setembro de 2021)