Midsommar

Não professo ser um grande cinéfilo. Vejo alguns filmes, aqui e ali, mas nada sei sobre influências, movimentos, cineastas em si; escolho ver um filme por duas razões, e duas razões somente.

Ou porque o acho bom, ou porque o acho ruim (pois é uma paixão minha rir de mídias ruins).

E é exatamente por causa desta visão bem preta e branca que, às vezes, não me deixo levar pelo entusiasmo das massas quando algum filme aclamado é lançado. Costumo esperar o burburinho passar até dar uma chance, e recentemente foi o que fiz ao assistir o célebre filme de terror “Midsommar”.

Peço perdão ao leitor por minha ignorância; se esperam uma profunda análise psicológica, sairão desapontados. Apenas o assisti como o que é, um filme – mas posso concordar que a estima que lhe dirigem é 100% merecida, pois é um trabalho magistral. O horror de “Midsommar” é baseado em duas premissas: estados mentais alterados por uso de psicotrópicos e justaposição entre o mundo “civilizado” e o mundo “pagão”. Tanto é que os personagens a morrer no decurso do filme não conseguem se adaptar ao mundo “pagão”, causando o caos na organização da comunidade; enquanto que a protagonista principal, depois de tantos dissabores em meio à civilização, abraça seu lado tribal e primitivista ao cabo do filme – lado este que, de um jeito ou outro, todo ser humano traz dentro de si.

Mesmo a Natureza demonstra uma face dúplice: ao mesmo tempo em que é apresentada como bela, verdejante, idílica e pouquíssimo alterada pela humanidade, também é inculta, letal, primeva – nada devendo aos humanos, ela é mortífera, e em seu estado bruto é utilizada para fins alucinógenos e até mesmo para matar.

Ao fim do dia, a mensagem de “Midsommar” é que os seres humanos são sempre forças temíveis, e que o famigerado arquétipo do “bom selvagem” é um mito: animais que somos, nossa natureza é uma de morte, uma barbárica natureza de sangue e sacrifícios, e por mais que os recursos e a civilização modernos prometem aliviá-lo, apenas suprimimos (sem jogar fora por completo) nossos impulsos ancestrais de tempos mais selvagens.

(São Carlos, 25 de outubro de 2022)

Galaktion Eshmakishvili
Enviado por Galaktion Eshmakishvili em 21/03/2014
Reeditado em 02/11/2022
Código do texto: T4738680
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