O Estrangeiro No Manicômio

O Estrangeiro No Manicômio

Olhos perdidos no vão entre o sorriso e a sensação de perda.

Eu posso querer permanecer saudável.

Mas a doença é a minha cura,

A loucura é o meu abrigo de exílio.

Tudo que faço é o que não sou,

E tudo que sou, bem, não faço.

Se ao menos fosse o meu desespero, seria algo.

Ah, maldita sensatez que me aprisiona,

Maldita fome de querer tudo,

E me perco na miséria de não ter nada.

Quando passo em frente à loja de discos da esquina

Ouço tocar o som da liberdade

Que por séculos aprisionou a felicidade.

Passo na tabacaria para comprar cigarros,

Mais adiante compro café.

Me sinto leve, fraco,

Talvez esteja sóbrio demais para viver.

E penso que é preciso cuspir nas flores Que brotam,

E cultiva-las depois.

É isso que fazem,

Somos frutos da bosta,

Fomos regados com mijo,

E bebemos saliva para matar a sede,

Nascemos do estrume,

Dormimos com os ratos e baratas,

Eles são nossos companheiros,

E não somos nada além daquilo que

Nos propusemos a ser.

E quando penso em gritar, lembro que as

Horas são lentas...

Mas quando percebo já é noite.

Me arrasto pelos cantos das ruas

Movimentadas por gente, e tudo me é estrangeiro,

As pessoas que passam sem que eu perceba o que fazem nessa cidade

Todos os dias do ano,

Sem saber o que o vendedor do mercado Pensa,

E ao pensar nisso, vejo que essas perguntas são sobre mim mesmo,

Quando saio desse quarto de apartamento--- um pequeno quarto de Apartamento,

Vejo as casas, as ruas estreitas,

(E tudo me pesa, me pesa como um fardo Imenso, e não consigo dormir,

O teto é o meu espelho.)

Não conheço essas placas nas esquinas.

Chove fraco, molho o all star sujo,

O dinheiro que havia no bolso,

Já não há mais, e quem é dinheiro, perto da água da chuva?

O vento agarra meus cabelos.

Caminho com as mãos enfiadas nas algibeiras das calças,

Não sinto nada. Só sinto que devo seguir andando,

Infinitamente, desgraçadamente, insolentemente​ ao que me chamaram,

Despretensiosamente do que sou.

Preciso seguir andando pela rua meio escura,

Cantarolando versos de músicas que salvam,

Jogado ao chão tudo o que sou, e

Por um desprezo aos sábados infinitos,

Engulo o meu lixo,

Ao gesto pequeno dos meus passos lentos, canto.

É possível não querer nada definido,

Mas sinto que quero tudo,

Tudo o que não existe.

Eu sou um estrangeiro no inferno,

Engoli meus versos,

Atiro ao degredo tudo aquilo que não pude agarrar,

E por um instante me vi tocando uma gaita,

E tomando café nas escadas da casa do fundo

Com a porta aberta para o infinito,

E cantei ao som do Bob Dylan tudo aquilo que vi há muito tempo,

Quando entrei no quarto abri a gaveta que

Guardava as relíquias de tudo que me

Fizera feliz um dia, me surpreendi, lá não tinha Nada...

Só havia migalhas, estrume, ópio, flores murchas pelo tempo,

Sorrisos falsos, indecisões,

Mentiras, folhas em branco, poesias Incompletas,

Sapatos gastos pelo morro que Sobe a rua ao lado,

A minha imaginação que me prende,

A vontade que me liberta, o desejo que me mata, um pacote de café forte,

A janela do trem que peguei onde refletia o meu rosto cansado,

Fúnebre e corria sem direção sob a chuva fria que caía lá fora molhando todos os Miseráveis das madrugadas longas que

Tiveram as cerimônias de enterros vazias e

Aqueles também que dedicavam uma vida

Toda à viagens pelas rodovias que cruzam O país noite e dia,

E deixavam as garrafas de vinho quebradas em cima da pia,

E choravam quando tinham que acordar às seis horas da manhã na segunda,

Estava lá dentro o manicômio que fiquei preso a vida toda

Pensando estar livre as noites todas,

O manicômio que me fez correr por uma estrada de terra

Ao lado de uma floresta sem árvores, e nadei num rio sem água,

E amei, sem sentimentos, uma garota que também não sabia amar,

Junto a tudo isso ainda encontrei o meu

Violão sem cordas que arrebentei tocando Canções sem melodias,

O sofá velho onde dormia após o almoço,

Os discos que não funcionavam,

E sentindo o cansaço do vazio

Olhei para tudo isso e a fechei novamente,

E não pego nada,

Nem ao menos as cinzas daquilo que morreu em mim,

E me sinto e sinto como quem abraça a própria dor,

Como quem está preso na caixa de fósforo

E pensou que era um universo todo.

As cartas e as fotografias manchadas, que fizeram?

O tempo passou, e hoje estou à procura das pegadas invisíveis,

Eu não sei o que estou vivendo,

Talvez esteja vivendo as insignificâncias

Da vida perdida.

A cafeteria do fim da rua estava fechada

E deito na calçada em cima de um papelão sujo

À espera de um abraço de Satan

Para quem escrevi alguns versos inúteis,

Para quem celebrei a crueldade dos meus dias vazios,

As doenças, as burocracias,

Os sonhos que não tive, a porta que nunca abri,

A janela por onde olhava as escórias dos bem sucedidos da cidade,

Aqueles que pregavam sermões de manhã cedo,

E fechei a porta no nariz de Deus,

E tomei o vinho barato sentado no chão

Embaixo da árvore que me fazia sombra num domingo quente de verão.

Não tive nada, e hoje penso que desse nada, por fim era tudo.

Meu último vômito. Meus versos inúteis.

Tahutihator Frigus
Enviado por Tahutihator Frigus em 10/01/2018
Reeditado em 10/01/2018
Código do texto: T6221779
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