1992
O amor veio como há muito
Eu não mais esperava
O amor se foi de sorrateiro
Como sempre se vai
Cabelos caindo
Barriga crescendo
Solteiro preocupado e desiludido
Doces meninas pequenas
E de corações ruíns
Loiras gostosas e decepcionantes
Pessoas más e perversas
E ainda era Janeiro
Salões vazios
Carnaval violento
Briga de bêbados
O corpo sendo viciado
Abusado até as últimas
A família morrendo
Goteiras na cozinha
Piscina de sangue no banheiro
Pratos esquentados no abajur
Nove de Abril chegando
Calafrios na espinha
O câncer entrando
Inverno de dias quentes
Sujeira e pouca `a lembrar
Maldita falta do que fazer
Festa junina em começo de Agosto
Ainda a loucura ao extremo
O amor a trancos e barrancos
Tédio e muito dinheiro
A raiva da selva
Depois pouco dinheiro
A primavera que nunca chega
Você que nunca volta
Maldito câncer que me adentra
Tempo de se organizar
É chegada a hora de amar
O aviso do perigo
O câncer que já se espalha
Por todo meu ferido corpo
O médico que me afirma
Que de nada realmente sofro
O medo de voltar
O erro de se internar
O peso de ter que ficar
Maldita terra de nenhum clima
O cansaço de pedra
A paciência de esperar
A hora do remédio
O preparo do banquete
A árvore iluminada
Os abraços falsos e frios
A morte que não me visita
Começar tudo de novo
Não mais nada o que fazer
Mil Novecentos e Noventa e Dois
Teria sido tudo igual a todos
Teria sido realmente?
O último ano de minha vida.
(1993)