Ratos e ninhos de amor

E ele suava como um porco e fedia azedo. Carregava uma pasta e um lenço branco embabado naquele líquido fétido que escorria por todo seu rosto e ensopava aquela barba nojenta. As pessoas fingiam que não notavam. Mas não tinha como. A sala de reuniões ficava empesteada pela sua presença. “Não há muito o que dizer. Ele nos causou um prejuízo de cinco mil. Não temos espaço para incompetentes.” Ninguém contestava o que ele falava para poder estar longe dele o mais rápido possível. Faziam desenhos em folhas em branco para não precisar olhar sua cara. “Comuniquem ele até o fim do dia.” Tudo bem, todos farão o seu melhor para não precisar mais passar por isso. O único ato espontâneo de alguém em sua presença seria sair correndo. Enquanto ele dobra os papéis e coloca na pasta as pessoas já estão se levantando e olhando para a parede. “Eduardo!” Não! Eu não! Hoje não! Nunca não! Seu Alceu sinaliza para o executivo que tentava sair. O resto continua andando focado na parede com um misto de alivio e duvida. Afinal, era o chefe do RH e o ceifador implacável. “Hoje podemos tomar aquele drink que você esta me devendo. Por minha conta.” Não, por favor Deus, não! “Claro. Passo na sua sala no fim do dia.”

A submissão funciona como uma certa auto-censura que transforma o homem num rato condicionado. No resto do dia ele pensou em uma forma de se livrar daquilo. E Eduardo estava dentro do carro dirigindo pela 9 de Julho pensando em ser parado por um blitz e preso por qualquer crime para se livrar daquilo. E ele suava como um porco e fedia azedo. “Um homem merece ter seus prazeres depois de um dia de trabalho.” Você fede seu porco desgraçado! “Com certeza.” Como se fosse um remédio para dor de cabeça, o Seu Alceu tira do bolso uma cápsula com um pó branco e faz duas carreirinhas em cima do manual do carro que ele pegou no porta-luvas. Ele abaixa o nariz para cheirar e a outra carreirinha se dissolve no suor da sua testa. Ele passa a mão na testa, lambe, vira a capa do manual, seca com a manga da camisa em movimento giratórios e estica outra carreirinha. Eduardo cheira. “Vamos naquele hotel novo que abriu perto do aeroporto. O hotel das universitárias.” Puta que pariu! Velho babão de merda!

Os vidros fechados por causa do ar condicionado e o cheiro escatológico girando por todos os centímetros quadrados. O trânsito travado numa terça-feira interminável. O aeroporto parecia estar a anos luz dali. E ele suava como um porco e fedia azedo. “Vamos no velho casarão da Rua Augusta. Vamos demorar horas para chegar até o aeroporto.” “Não, não. Não quero mais ver a Xarlene.” Ela que não quer te ver. Ninguém quer te ver seu fudido de merda! E o impulso de fugir soca a mão na buzina e o pé no acelerador. Por favor! Alguém me mate! “Deixa o rádio na CBN pra eu saber como o mercado esta reagindo a troca de ministros. No fim não vai mudar nada.” Haaaaaaaaa! “Estou achando que o departamento comercial esta acomodado com as metas baixas. Acho que vou pressionar a Dona Marlene por mais contratos.” Foda-se! Foda-se! FO-DA-SE! “Melhor que dinheiro só mais dinheiro.” Chega logo lugar du caralho! “Aquela velha sabe como ganhar dinheiro. Ela até merecia uma boa foda. Quanto tempo será que faz que ela não dá uma trepada animal?” Cala a boca seu cretino bastardo! “Não sei se ela sabe o que é isso. Conheci o marido dela uma vez numa churrascaria. Tem cara de paspalho.” Eu vou te matar! Eu vou te matar! “Chegamos.”

Uma senhora cheia de penduricalhos e com cara colorida de pó de arroz recebe os dois na porta. “Boa noite senhores. Já sabem o que querem?” “Sim. Duas estudantes de engenharia de uma faculdade católica e uma garrafa de whiskey 12 anos.” A senhora faz um gesto e duas garotas, uma loira e outra morena, se aproximam. Seu Alceu junta a morena e senta de um lado da mesa alisando as pernas dela com as duas mãos, tentando agarrar tudo que pode. E ele suava como um porco e fedia azedo. Eduardo senta com a loira do outro lado. O garçom traz a garrafa e entrega uma comanda para cada um dos dois. “É o seguinte. Primeiro você vai comigo, depois com ele. A loira a mesma coisa.” Puta que pariu! Não vou tocar nela depois de você nem a pau! “Pega uma garrafa destas para você porque esta vou levar comigo.” Some da minha frente! Um vai para o quarto da direita e o outro para o quarto da esquerda.

Enquanto Seu Alceu fodia a morena de quatro Eduardo estava se explicando para a loira. “Não dá. Não consigo sabendo que aquele escroto esta fodendo no outro quarto.” Nhéc, nhéc, nhéc. Tum, tum, tum. “Meu Deus! Aquele animal deve estar esfregando aquele suor escroto nela. Como vocês se prestam a isso?” Cinco minutos depois que os barulhos pararam a morena entrou no quarto pelada e acabada carregando as roupas na mão. A loira fez cara de desespero e saiu. A morena entrou no banheiro e ligou o chuveiro. Os barulhos recomeçaram. Nhéc, nhéc, nhéc. Tum, tum, tum. Eduardo virou uma talagada da garrafa, passou sua comanda duas vezes no leitor digital e voltou para o bar. Seu Alceu apareceu carregando o paletó pelo dedo jogado nas costas e com a gravata enrolada no pescoço. E ele suava como um porco e fedia azedo. Os dois entraram no carro e foram embora. “Queria foder assim a Dona Marlene.” Quero muito te dar um soco na cara. Imbecil! Eduardo deixou Seu Alceu no estacionamento do prédio do escritório e foi para casa. Seu Alceu pegou seu carro e foi para a sua.