HISTÓRIA DE UMA BELA MULHER
 
 

 
                              Uma belíssima mulher, mas indômita e incansável. Lutava com bravura por aquele que seria o seu amor.
                              No entanto, em retribuição, vez ou outra recebia daquele ser comum um simples convite para uma noitada amorosa e relacionamento sexual sem qualquer compromisso.
                              Nessas ocasiões ela se fazia ainda mais bela e se desdobrava no intuito de agradar o seu parceiro, na esperança de conquistá-lo e fazê-lo reconhecer o seu grande amor.
                              Impassível, sem esboçar emoção ele apenas respondia mecanicamente as perguntas sem afirmativas concretas. Sentia-se seguro e dono exclusivo daquele coração carente.
                              Os dias, os meses e os anos passavam. Para ela um martírio, já que até então não conseguira conquistar o coração daquele homem que tanto amava. Para ele uma situação cômoda e pouco se importava com o tempo. Era indiferente.
                              Arredia ela permanecia distante do mundo ao lado do seu homem preferido. Insistia e nele investia todas as suas fichas. Era o seu único tesouro.
                              Certo dia, já ao cair da tarde quando se arrumava para ir ao encontro, aliás, mas um encontro com o seu bem amado, recebeu dele um telefonema desmarcando o compromisso por motivos profissionais.
                              Tranquila ela concordou desculpando-o, porém continuou se arrumando. Resolveu aceitar o convite de uma amiga do escritório para fazer companhia e ir ao casamento de uma pessoa conhecida que morava em um bairro distante.
                              As núpcias realizaram-se normalmente, os noivos se beijaram, houve a tradicional troca de buquê e todos foram para o salão onde aconteceriam os comes e bebes.
                              Num sofá ao redor de uma mesa exclusiva cheio de bebidas e guloseimas estava aquele homem rigorosamente bem vestido, ao lado de uma linda jovem que a tratava de “meu amor” e duas meninas uma de uns oito anos e outra de seis, tratadas como filhas, pelo casal.
                              Como se nada tivesse acontecido aquele homem frio e calculista limitou-se a olhar para as duas moças com um sorriso amarelo estampado no rosto, sem falar nada.
                              A bela mulher amparou-se nos ombros da amiga para não cair e pôs-se a chorar baixinho, sem escândalo. Quase ninguém percebeu o estado daquela alma desiludida.
                              Imediatamente saiu do local sem pronunciar nenhuma palavra a não ser pedir perdão à sua companheira e dizer que iria tomar um taxi e voltar para casa, mas que ela poderia continuar na festa e cumprimentar os noivos como de praxe.
                              Todos os sonhos daquela jovem e bela mulher se esvaíram. Ao clarear o dia ela trazia no rosto e nos olhos as marcas do sofrimento atroz da traição e da desilusão. No entanto ela sabia que a vida continuaria e que alguma explicação haveria de ter para o ocorrido.
                              Desnecessário dizer que o cidadão jamais retornou para qualquer justificativa. Por seu turno, de coração despedaçado ela também nunca mais o procurou.
                              No seu trabalho ela conquistou muitos amigos ao longo dos anos. Todos a respeitavam. O seu chefe direto a tinha como uma das melhores advogada. Por isso nunca estava só. Sempre tinha alguém ao seu lado para um evento profissional ou recreativo. A sua beleza não era apenas física. Era muito evoluída espiritualmente.
                              Passados alguns anos aquela bela e solitária mulher encontrou em um dos novos advogados que ingressou na sua empresa um motivo a mais para novo relacionamento. Desta vez não fez planos e nem se atirou de corpo e alma. Procurou conhecer o seu novo parceiro cautelosamente.
                              Mas o jovem que tinha mais ou menos a sua idade era gentil e solícito, sempre presente por inteiro e sem restrições. A cobria de elogios e carinho e se esmerava no fino trato, próprio de quem tem um bom coração.
                              Em nenhum momento dessa nova convivência e pelos gestos nobres daquele cavalheiro podia se lembrar e muito menos se comparar ao seu antigo amor. Aliás, a certa altura ela não se lembrava de mais nada do passado.
                              No dia vinte e dois de setembro daquele ano, quando numa segunda feira ela chegou pontualmente às nove horas no seu escritório estavam todos os amigos e colegas de trabalho à sua espera, inclusive o seu namorado com um lindo buquê nas mãos, tendo uma mesa improvisada colocada no centro, nela contendo um bolo rodeado de flores com votos de feliz aniversário.
                              Tudo lindo e maravilhoso. Aquele dia foi mais do que especial. O seu novo namorado pediu licença aos amigos, tomou-lhe as mãos, entregou o buquê e uma caixinha contendo um par de alianças, ato contínuo falando:
“Minha querida, me perdoa a pretensão. Sei que no passado você sofreu muito por amar uma pessoa que nunca correspondeu ou retribuiu o seu amor, assim como não lhe era digno, uma vez que ao mesmo tempo mantinha relacionamento com outras mulheres, inclusive mantendo no anonimato um casamento com filhos. Eu não posso reparar e nem substituir o seu passado. Mas posso oferecer o meu amor verdadeiro eternamente. Assim, aproveitando o dia de hoje, nesta data festiva, junto dos nossos amigos comuns, venho humildemente rogar que aceite o meu pedido de casamento. Claro que terei paciência e aguardarei a resposta que não é necessário ser agora”. Dito isso a abraçou, beijou-lhe os lábios e convidou o pessoal para cantar o tradicional parabéns.
                              Chegou o dia do casório. O noivo estava radiante de felicidade. Ela vivia um lindo sonho. Sentia-se segura e extremamente feliz. Consumado o casamento em grandes pompas os nubentes viajaram para o exterior curtir as núpcias. Realmente tudo aconteceu na mais perfeita paz.
                              No dia do retorno ao escritório, o novo casal foi recebido com festa e alegria, até que uma das secretárias trouxe os jornais e comentou: Vejam, até que enfim foi desmascarado um dos maiores traficantes de armas e de drogas. O cara foi denunciado por uma das suas oito mulheres que estava inconformada com a miséria pela qual passava enquanto que ele gastava muita grana com as outras.
                              Ao lado e encostada nos ombros do seu marido a jovem e bela mulher ao ver a foto ocupando meia página da capa do jornal, limitou-se a comentar consigo mentalmente: “Nossa! Como Deus foi Generoso para comigo. Que sorte a minha”.
                              Assim ali mesmo pediu ao marido para sentar-se e fazer uma oração pela alma daquele pobre coitado, agora um preso e condenado pela justiça do homem e que certamente um dia deveria prestar contas ao Pai Criador.
                              Embora seja fictícia essa história tem um fundamento. Penso comigo que na vida real isso acontece diariamente em toda parte da Terra. Nós seres humanos renascemos no planeta Terra cheio de fraquezas e vícios; somos ignorantes e fingimos que acreditamos que Deus existe. Blasfemamos. Na maioria das vezes sonhamos com riqueza. Somos naturalmente orgulhosos e avarentos. Queremos o melhor para nós e nossos entes queridos e esquecemos os menos favorecidos.
                              Uma bela mulher como a da minha história existe, sempre existiu e sempre existirá. Basta que nós consigamos ver através dos olhos do coração.